Süddeutsche
Zeitung, Munique –
Presseurop – imagem Dave Brown
Numa altura em que
a turbulência abala o Egito, a União Europeia acaba novamente de exibir a sua
impotência. No entanto – por mais utópico que possa parecer hoje –, só a Europa
tem capacidade para orientar o Egito na senda de uma política moderna.
Não há nenhum vídeo
nem fotografia conhecida da visita de Lady Ashton a Mohamed
Mursi [30 de julho], prisioneiro dos generais egípcios. No entanto, a Alta
Representante da União Europeia para os Negócios Estrangeiros, com a sua
tentativa desesperada de mediação,
causou forte impressão. Para conseguir ver Mursi e influenciar a sua posição, a
representante de 570 milhões de europeus meteu-se num helicóptero, há três
semanas, para destino desconhecido, e aceitou as condições do novo regime.
Agora, depois de a tragédia
do Cairo não ter sido evitada, esta imagem ganha pleno efeito. Mostra uma
mediadora bem-intencionada, mas fraca. Os ministros dos Negócios Estrangeiros
da União Europeia, reunidos a 21 de agosto, em Bruxelas, para uma reunião
extraordinária, têm, portanto, não apenas de encontrar uma solução para a
violência no Egito, mas também para essa imagem da sua própria impotência.
Os europeus repetem
hoje no Egito a descoberta que fizeram há anos na
Síria: não têm qualquer peso decisivo sobre o curso dos acontecimentos.
Isto aplica-se à União como um todo e aos Estados-membros individualmente.
Isoladamente ou em coletivo, os europeus têm-se mostrado incapazes de exercer
pressão suficiente para persuadir, ainda que temporariamente, os chefes militares
a recuarem no seu plano de erradicar a Irmandade Muçulmana do espectro
político.
Mesmo que os
ministros dos Negócios Estrangeiros não possam fazer nada por isso, para já, a
reunião continua a ser importante. Primeiro, porque nada seria mais lamentável
do que resignar-se à impotência, perante a carnificina em curso. Depois, porque
a Europa – por mais utópico que pareça hoje – é a melhor oportunidade para o
Egito, senão mesmo a única. Se pode ser substituída no papel de credora (pela
Arábia Saudita, por exemplo), não tem substituto em termos de acompanhamento
para um regime político moderno.
Força não resulta
nas crises do mundo árabe
Abalados pela crise
do euro e chocados com a visão de um Médio Oriente a ferro e fogo, os europeus
habituaram-se a perspetivar os acontecimentos de uma distância que só enfatiza
as suas fraquezas. Por exemplo: uma representante dos Negócios Estrangeiros que
se faz convidada furtivamente e sem ideias claras. Um novo Serviço
Europeu para a Ação Externa dececionante para as expectativas. Governos
nacionais que defendem os seus próprios interesses – umas vezes sem rebuço,
como os britânicos e franceses, outras com excesso de zelo e precipitação, como
a Alemanha, na pessoa do seu ministro dos Negócios Estrangeiros. Ao que deve
acrescentar-se um peso militar inexistente.
Tudo isto é facto,
mas pode ser colocado numa perspetiva mais abrangente. O exemplo
norte-americano prova que, hoje, a força não resulta nada bem nas grandes
crises do mundo árabe. Nem sendo colegial a política externa fica imunizada
contra a desorientação – como evidenciou o secretário dos Negócios Estrangeiros
dos Estados Unidos, John Kerry, quando caiu na tolice de justificar o golpe militar egípcio como
emanando da vontade do povo. Atualmente, os únicos que mostram determinação são
aqueles que não têm nenhum problema em relação à violência, desde que vá no
sentido das relações de poder que lhes convêm na região (mais uma vez, os
sauditas).
É a credibilidade
que pode tornar a União Europeia eficaz – se se dotar realmente de meios para
tal. E ela advém do facto de a Europa não perseguir interesses “nacionais”. O
interesse europeu é muito mais negociável. No caso do Egito, a indignação
legítima contra a tomada do poder pelo exército e a repressão sangrenta dos
movimentos de protesto deve ser equilibrada com o desejo – também legítimo – de
não deixar a situação tornar-se ainda mais caótica. Um desejo expresso
sobretudo pelos países europeus banhados pelo Mediterrâneo. No pior dos casos,
as divergências de pontos de vista conduzem a um bloqueio; na melhor das
hipóteses, forçam a adotar uma posição justa e credível.
Não tomar partido
Por enquanto, o
mais razoável parece ser não tomar partido. Dados os erros cometidos por quase
todos os protagonistas do Cairo, seria difícil escolher um dos lados. No entanto,
isso não significa que devamos aceitar o regime despótico que se instalou no
Egito, com o consentimento de pelo menos uma parte da população. A chanceler
Angela Merkel e o ministro dos Negócios Estrangeiros alemão, Guido Westerwelle,
assumiram a liderança nesta matéria, e com razão. Seria absurdo dar ao novo
regime fundos que eram destinados, à partida, para instaurar uma democracia.
Quando se constata que não servem senão para a importação de armas.
Perante a chocante
visão de um desastre que não conseguimos evitar, a União Europeia não pode
refugiar-se agora no puro pragmatismo. A credibilidade, em política externa, é
uma qualidade rara, porque extremamente lenta a renovar-se. Sem ela, a União
Europeia não vai conseguir nada no Egito.
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