Fernanda Câncio –
Diário de Notícias, opinião
Não, não concordo
com o provedor do DN: a tentativa por parte de um governo (ou clube de futebol,
empresa, etc.) de condicionar a cobertura jornalística transmitindo a sua
mensagem e tentando até evitar perguntas incómodas não é fascista. É a coisa
mais normal do mundo em democracia. Aliás, só em democracia é que esta questão
se coloca nestes termos, porque nas ditaduras o condicionamento, pelos
governos, do que é publicado e da própria atividade dos jornalistas - quando
sequer existem -, efetua-se quer através da censura oficial, como ocorreu em
Portugal no período a que chamamos, precisamente, fascismo, como da
perseguição, prisão e até assassínio que sucederam e sucedem noutras paragens.
Claro que podemos,
por exemplo, questionar se é fascismo o que fez Relvas quando ligou para o
Público a ameaçar revelar a vida privada de uma repórter que lhe fazia
perguntas de que ele não gostava. É abjeto, é intolerável (mesmo se, parece, o
próprio jornal o tolerou), é de mafioso, pode até ser ilegal, demonstra uma
total incapacidade de lidar com a liberdade de informação constitucionalmente
consagrada e deveria ter determinado logo ali a demissão do ministro por clamor
generalizado (que não houve). Mas será fascista? E, mesmo que possa ser como
tal classificado, isso adianta alguma coisa para a compreensão e para a
denúncia do facto e da personagem, para a consciencialização pública da
necessidade de repudiar este tipo de atitude? Não me parece.
Ora se para o caso
limite de Relvas devemos ter dúvidas em usar o termo fascismo, que dizer dos
seus sucessores na pasta da comunicação social, que criaram a figura do
briefing diário, agora bi-semanal, em que divertem, em direto, o País com as
caras, gaguejos e saídas impagáveis do mestre de cerimónias Lomba (talento até
agora insuspeito na sitdown comedy) e dos membros do Governo para ali
arrastados? Sim, Oscar (Mascarenhas) tens toda a razão em te indignares com as
tolices ignaras esportuladas por Lomba e Maduro, na senda, aliás, das de Sofia
Galvão na célebre conferência do Palácio Foz, sobre on e off. Todos os motivos
para te passares com o facto de estas coisas passarem sem nota nos media e na
generalidade dos comentadores e para, citando o exemplo da Hungria e da Grécia,
nos avisares para o facto de antes da serpente devermos ser capazes de divisar
o ovo. E toda a autoridade, dever até, para admoestar os jornalistas e
respetivas direções por comerem e calarem na saloiice do "lá fora também é
assim".
Mas, Oscar,
fascismo, o espetáculo de um secretário de Estado alegadamente da propaganda a
dizer para as câmaras que o Governo vai averiguar o que é ou não verdade na
versão de um colega seu, sem sequer perceber que o está a demitir (e a si
próprio, se há por ali resquício de vida inteligente)? Por amor de deus, com
tanto motivo de mágoa e tão poucas séries de jeito na TV, não nos queiras
privar disto.
Sem comentários:
Enviar um comentário