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Em uma década,
principal programa dos governos do PT conseguiu, usando 0,5% do PIB, reduzir
miséria em 28%. Mas falta de ações paralelas, como ajuda à inserção de
beneficiados no mercado de trabalho, é alvo de críticas.
Quando, em 2003,
foi lançado pelo então presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o Bolsa Família
dividiu a opinião dos brasileiros. Para os críticos, o programa era uma medida
assistencialista que não colaboraria, de fato, para a inserção social. Para
seus defensores, era um projeto de transferência de renda capaz de levar a uma
revolução social no Brasil.
Uma década depois,
os números são positivos. De acordo com um estudo do Instituto de Pesquisa
Econômica Aplicada (Ipea), o Bolsa Família foi responsável por reduzir em 28% a
extrema pobreza ao longo de dez anos. Atualmente, o programa atende a cerca de
13,8 milhões de famílias – o equivalente a 50 milhões de indivíduos ou um
quarto da população brasileira.
"O Bolsa
Família atende às necessidades de alimentação das famílias mais pobres e move,
principalmente, a economia local de pequenas cidades, trazendo impactos sobre a
qualidade de vida", afirma Marcel Guedes Leite, economista da PUC-SP.
"É um programa relativamente barato, que abrange uma população bem ampla e
não utiliza nem 0,5% do Produto Interno Bruto (PIB) por ano."
O investimento do
governo no Bolsa Família previsto em 2013 é de cerca de 24 bilhões de reais. O
valor médio do auxílio passou de 73,70 reais em outubro de 2003 para 152,35
reais em setembro deste ano.
Guedes Leite diz
ainda que, dos cerca 5.600 municípios do Brasil, aproximadamente 2.300 têm
menos de 5 mil habitantes e não têm, geralmente, estrutura econômica para gerar
ocupação para a sua população. E se a dificuldade de as famílias encontrarem
meios de sobrevivência nos municípios pequenos já é grande, ela é maior ainda
nos municípios mais pobres. E é nesses locais que o Bolsa Família teve uma
grande importância nesta última década.
"Há
estatísticas que mostram que alguns municípios recebem mais recursos do Bolsa
Família do que do Fundo de Participação dos Municípios (FPM). Isso mostra o
quanto esses municípios eram miseráveis e dependem da transferência do governo
federal. Senão, eles não subsistem", diz Guedes Leite.
Demanda reprimida
Segundo o livro Programa
Bolsa Família – uma década de inclusão e cidadania, lançado nesta quarta-feira
(30/10) pelo Ipea, 72% das famílias inscritas no programa são extremamente
pobres, e 64% dos responsáveis pelas famílias não chegaram a completar o ensino
fundamental. A maioria dos benefícios é recebida por habitantes do Nordeste do
país (50%), especialmente dos estados do Maranhão e do Piauí. Apenas 38% têm,
ao mesmo tempo, acesso a água tratada e coleta de esgoto.
"Qualquer
adição de renda que essas famílias recebem acabam se transformando num aumento
de consumo. E isso vai repercutir sobre a economia local", afirma Claudia
Satie Hamasaki, professora de economia da Universidade Presbiteriana Mackenzie.
"Essa orientação de consumo local acaba tendo um efeito multiplicador
dessa renda adicional sobre a economia local, principalmente nas regiões mais
afastadas."
Para a
especialista, o impacto é maior nos municípios menores, já que cidades têm
custos de vida diferentes e uma família considerada pobre em São Paulo pode não
necessariamente receber o mesmo status no sertão nordestino. "Setenta
reais a mais na renda em São Paulo não significa o mesmo que no Piauí. Pobre em
São Paulo não é pobre na região do Nordeste, e pobre lá pode ser considerado
miserável aqui", explica.
Os especialistas,
porém, dizem que a inclusão social promovida pelo Bolsa Família não pode ser
avaliada no curto prazo e afirmam ser necessário esperar um ciclo maior. Eles
estimam que daqui a cerca de cinco anos poderá ser avaliado se as famílias
beneficiárias do programa obtiveram melhores condições de vida.
Parte dos
questionamentos ao Bolsa Família se deve ao fato de o governo federal não
disponibilizar para as famílias programas de inclusão no mercado de trabalho,
como a qualificação de mão de obra. Outra crítica é que, apesar de exigir
frequência escolar dos beneficiados, não há medidas paralelas para melhorar a
qualidade do ensino.
"Sinto falta
de algumas políticas de inclusão. Assim como houve políticas para a
distribuição do benefício, deveria haver programas de inserção no mercado de
trabalho", opina Guedes Leite. "E isso a gente não viu ainda, não foi
criado até o momento."
IDH alavancado
Especialistas dizem
que os requisitos para que as famílias recebam o benefício é um dos pontos
positivos do programa. Para isso, as crianças devem estar matriculadas na
escola e terem frequência de, no mínimo, 85%. Além disso, as mulheres grávidas
devem estar em dia com o pré-natal e as crianças, com a carteira de vacinação.
E, como resultado,
o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) – que considera a renda, educação e
saúde – teve um salto no período de dez anos. De acordo com o Ipea, em 2000,
41% dos municípios brasileiros apresentaram IDH muito baixo. Em 2010, esse
patamar foi reduzido para 0,6%.
"Com as
condicionalidades [requisitos] você dá uma perspectiva futura para as crianças
e as torna indivíduos mais aptos para buscar emprego e a entrar numa
instituição de ensino superior. Dessa forma, separa-se a família do que seria a
armadilha da pobreza, que é pobreza intergeracional", afirma Hamasaki.
"Esse é um dos grandes feitos do programa, ele rompeu com esse ciclo."
Autoria: Fernando
Caulyt – Edição: Rafael Plaisant
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