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É uma das críticas
mais frequentes do maior partido da oposição, a RENAMO: o Estado moçambicano
está a ser partidarizado pela FRELIMO, o partido no poder. Mas até que ponto
tem razão?
Há já bastante
tempo que a palavra “frelimização” faz parte do vocabulário político
moçambicano. O termo é empregado, geralmente, para designar a alegada
partidarização dos órgãos do Estado pelo partido no poder, a Frente de
Libertação de Moçambique (FRELIMO).
Um assunto que está
na ordem do dia em Moçambique, segundo o jornalista moçambicano Fernando
Veloso. "A apropriação do Estado é tema de conversa em todos os lares, em
todas as esquinas”, observa o jornalista, acrescentando que não há no país
“quem não sinta que o país está ‘frelimizado’”.
As críticas mais
sonoras vêm da Resistência Nacional Moçambicana (RENAMO). Há anos que o maior
partido da oposição acusa a FRELIMO de partidarizar o Estado. Uma acusação
negada várias vezes pelo partido no poder. Recentemente, ao fazer um balanço
sobre os 21 anos de paz em Moçambique, o porta-voz da RENAMO, Fernando Mazanga,
fazia um pedido:
"Que os moçambicanos sejam considerados pelo facto de serem moçambicanos e
não por pertencerem a determinados partidos."
Críticas com
fundamento
As críticas da
RENAMO têm fundamento, afirma um artigo
publicado em maio deste ano pela Open Society Initiative for Southern Africa
(OSISA), uma organização que trabalha na consolidação da democracia, com sede
na África do Sul. Todos os órgãos e instituições do Estado são dominados por
membros da FRELIMO, lê-se. De tal forma que seria "impossível distinguir a
linha de divisão entre a o partido e as instituições estatais."
Já em 2008, os bispos católicos moçambicanos mostravam-se preocupados com o que chamavam de “coacção de cidadãos” para pertencer ao partido. Hoje em dia, a prática seria "mais sofisticada".
Já em 2008, os bispos católicos moçambicanos mostravam-se preocupados com o que chamavam de “coacção de cidadãos” para pertencer ao partido. Hoje em dia, a prática seria "mais sofisticada".
Numa entrevista
à DW África em maio último, o analista político Fernando Lima, explicava que
"a prática é: uma pessoa é nomeada para uma determinada função no aparelho
de Estado, numa empresa pública, e no dia seguinte tem uma ficha em cima da sua
secretária, quando não é antes, para aderir ao partido FRELIMO”.
“Frelimização” das
Forças Armadas
Depois da tomada da
base da RENAMO em Santunjira, onde o líder da RENAMO, Afonso Dhlakama, se
encontrava há um ano, a chefe da bancada parlamentar do maior partido da
oposição disse que o ataque era a "prova irrefutável" da
"frelimização" das Forças Armadas. Citada pela agência de notícias
portuguesa Lusa, a deputada Angelina Enoque dizia que o Presidente da
República, Armando Guebuza, estava a usar o líder da RENAMO como
"troféu". E queixava-se também que os militantes do seu partido
tinham sido retirados forçadamente do exército.
Porém, o analista
político moçambicano, Tomás Vieira Mário, tem outra interpretação. “A RENAMO terá
feito as contas e, pelo número das pessoas que vinham do seu lado e que
passaram à reforma, a RENAMO entendeu que, quem ficou no exército são apenas
militantes da FRELIMO”, explica.
No entanto, o
analista reconhece que “isso é algo que ninguém pode provar”, até porque “todos
os anos há incorporação no exército de jovens mancebos que vão para o exército
obrigatoriamente, por força da lei, e são eles que vão renovando o
exército."
O jornalista
moçambicano Fernando Veloso apurou no final do ano passado que, 20 anos depois
da formação do exército único moçambicano, em 31 oficiais superiores e generais
das Forças Armadas, 27 eram originários da FRELIMO, enquanto apenas quatro
estavam filiados à RENAMO.
“A que propósito,
por exemplo, é que se envolvem as Forças Armadas em assaltos à casa do
presidente da oposição? Quando ele vive em Nampula, vão lá e cercam-lhe a casa.
Mas, afinal, o presidente da oposição não tem direito de viver onde lhe
apetece? Tem que viver em Maputo?”, questiona Veloso.
“Cisões internas” e
“guebuzização”
Olhando para a
atual situação de crise político-militar no país, o jornalista sugere uma
mudança de termos. Em vez de se utilizar a palavra “frelimização”, devia-se usar
uma outra: “guebuzização”.
Veloso diz que a
FRELIMO está a entrar num processo de ruptura devido a “cisões internas”. “A
gula de uns é tão grande que já nem dá para que sobre alguma coisa para os
próprios camaradas.”
Segundo Fernando
Veloso, os próprios militantes da FRELIMO queixam-se que, a menos de um ano de
eleições gerais já convocadas, ainda não é conhecido o sucessor do atual
Presidente da República como candidato, sabendo que ele está no seu último
mandato.
“Toda a gente fala
à boca cheia em Moçambique que o senhor Guebuza quer mudar a Constituição, quer
arranjar um pretexto para que seja possível decretar o estado de sítio para ele
se manter no poder. Toda a gente na rua comenta o mesmo. Isto não é uma questão
da RENAMO, é uma questão nacional”, assegura.
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