Verdade (mz) - Editorial
Sangra o país por
todos os lados. Não há medicamentos e também segurança. Na Beira uma criança de
13 anos foi raptada, torturada e abandonada sem vida. Como um animal. O retrato
do país é macabro. Porém, facílimo de desenhar. É melhor começarmos por aquilo
que ninguém vê, mas que resulta nefasto ao futuro dos 22 milhões de cidadãos
que preenchem este rochedo à beira-mar. É um facto que no país não há
medicamentos. O que é grave, mas mais grave ainda, é compreender que os
medicamentos, para chegarem aos hospitais, centros e postos de saúde, precisam
de circular pelas estradas nacionais.
A retórica oficial
que dá conta da distribuição de medicamentos não procede. @Verdade entrou em
contacto com 113 distritos e atestou, através dos médicos e enfermeiros, que não
existem medicamentos e que, dizem, devido ao exaltar das armas na zona centro é
melhor esquecer os hospitais, postos e centros de saúde. Portanto, quando se
fala de vítimas civis destes ataques no centro é preciso engordar os dados e
analisar profundamente o problema. O condicionamento do tráfego obriga a uma
engenharia de distribuição de medicamentos que o país, por força da rotina, se
desabituou de trilhar. É preciso contar estes mortos.
A falta de
medicamentos não é assunto dos dias que correm. É tão antigo como o teatro de
enganos que teve lugar no Centro de Conferências Joaquim Chissano. Portanto, é
um facto que o país não só não tem medicamentos como também não goza de
estrutura logística para os distribuir. Mas a ausência de fármacos causa apenas
mortes invisíveis, aquelas que nem a Renamo, nem a Frelimo e muito menos a
sociedade civil contam.
Esses continuam
anónimos num país e numa sociedade que trilham por outros caminhos e escolheram
prioridades igualmente outras. Esses permanecem na vala comum do nosso
esquecimento. Contamos um, dois, três e 58 mortos e julgamos que o sangue
derramado é muito pouco. Ignoramos os desterrados quando urdimos, aqui e ali,
de que lado mora a razão. O povo moçambicano não pode continuar a fazer o papel
de África na reedição de uma conferência de Berlim neste teatro da arrogância
que montaram na zona centro do país.
Se um eventual
conflito político-militar só tem como vítimas os paupérrimos civis de um país
onde ser pobre é o mais normal é porque as coisas estão realmente pretas. É
isso que nos transmite a morte de um miúdo de 13 anos na cidade da Beira.
Vítima de raptores que habitam covis e movem-se nas sombras e morto da forma
mais cobarde por esta cambada de biltres. Uma morte que, na verdade, representa
o cartaz da inoperância das instituições de justiça e da falência de um país,
38 anos depois do seu nascimento.
Descansa em paz,
Moçambique.
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