quinta-feira, 7 de novembro de 2013

O TÃO ESPERADO APOCALIPSE DA VENEZUELA É POUCO PROVÁVEL

 


País conta com reserva suficiente e divisas em moeda estrangeira para fazer o que quiser, inclusive baixar o dólar negro
 
Mark Weisbrot, Nova York Opera Mundi
 
Há mais de uma década, aqueles que se opõem ao governo da Venezuela – o que inclui a maioria dos grandes meios ocidentais – têm insistido que a economia venezuelana implodiria. Como os comunistas dos anos 30 que apostavam na crise final do capitalismo, imaginou-se, em geral, que o colapso econômico da Venezuela estava apenas virando a esquina. Quão frustrante terá sido para eles presenciar somente duas recessões: uma causada diretamente pela greve do petróleo protagonizada pela oposição (dezembro de 2002 – maio de 2003) e a outra, produto da crise mundial (2009 — primeira metade de 2010). Apesar dessas recessões, o rendimento econômico da década inteira, levando em conta que o governo somente conseguiu controlar a companhia nacional de petróleo em 2003, acabou sendo bastante satisfatório, com um aumento da renda real per capita de 2,7%, a pobreza reduzida a menos da metade e avanços significativos para a maioria, em relação a emprego, acesso a serviços de saúde, aposentadorias e educação.

Agora, a Venezuela enfrenta problemas econômicos que alentam estes corações que a odeiam. Vemos a má notícia a cada dia: os preços dos bens de consumo subiram 49% em relação ao ano passado; há um mercado negro onde o dólar é cotizado sete vezes acima da taxa oficial; escassez de produtos básicos, desde o leite até o papel higiênico; desaceleração econômica, queda das reservas do Banco Central. Será que aqueles que gritavam “Lobo!”, verão, afinal, seus sonhos se concretizarem?

É pouco provável. Nas análises da oposição e dos meios internacionais, a Venezuela está presa numa espiral de inflação e desvalorização. A hiperinflação, uma dívida externa aumentando e uma crise na balança de pagamentos marcariam o final desse experimento econômico.

Mas, em 2012, a Venezuela chegou aos US$ 93, 6 bilhões em rendimentos petroleiros, frente às importações totais na economia – a níveis historicamente altos – de US$ 59, 3 bilhões. A conta corrente da balança de pagamentos registrava um superávit de US$ 11 bilhões. Os pagamentos de juros sobre a dívida externa pública somavam apenas US$ 3, 7 bilhões. Os dólares deste governo não vão se esgotar.

Atualmente, o Banco Central conta com US$ 23 bilhões em reservas, e os próprios economistas da oposição estimam que existam outros US$ 15 bilhões nas mãos de outras instâncias do governo, somando, assim, um total de US$ 36,4 bilhões.

Normalmente, reservas que podem cobrir três meses de importações são consideradas suficientes; a Venezuela conta com reservas necessárias para cobrir pelo menos oito meses, possivelmente mais. Também tem a capacidade de solicitar créditos internacionalmente.

Um problema é que a maior parte das reservas do Banco Central se encontram em ouro. Mas o ouro pode ser vendido, ainda que se trate de um ativo muito menos líquido que outras poupanças, como são os títulos do tesouro dos Estados Unidos. Parece pouco razoável imaginar que o governo corra o risco de passar por uma crise na balança de pagamentos em vez de vender seu ouro.

A hiperinflação é também uma possibilidade muito remota. Durante os primeiros dois anos da recuperação econômica, que começou em junho de 2012, a inflação vinha caindo mesmo quando o crescimento econômico se acelerou para 5,7 % em 2012. No primeiro trimestre de 2012, chegou ao ponto baixo de apenas 2,9%, equivalente a uma taxa anual de 12,1%. Tudo isso demonstra que a Venezuela, apesar de seus problemas, é muito capaz de gerar um crescimento saudável, inclusive enquanto baixa as taxas de inflação.
 
O que verdadeiramente fez com que a inflação disparasse, já há um ano, foi um corte no fornecimento de dólares no mercado de câmbio, os quais caíram pela metade em outubro de 2012 e praticamente foram eliminados em fevereiro. Isso fez com que mais importadores tivessem de comprar dólares cada vez mais caros no mercado negro. A desvalorização de fevereiro também contribuiu um pouco para a inflação, ainda que provavelmente não tanto.

Mas, desde então, o governo aumento seus leilões de dólares, anunciando também um plano para aumentar as importações de alimentos e outros bens, o que seguramente exercerá certa pressão para baixar os preços.

Certamente, a Venezuela enfrenta alguns problemas econômicos sérios. Mas não são do tipo que sofrem, por exemplo, a Grécia (já em seu sexto ano de recessão), ou a Espanha, que se veem presas em pacotes segundo os quais a política macroeconômica é fixada por fatores cujos objetivos entram em conflito com a sua recuperação econômica. Por sua vez, a Venezuela conta com reservas suficientes e divisas em moeda estrangeira para fazer o que quiser,c e eliminar boa parte do desabastecimento.

Esses são problemas que podem ser resolvidos de forma relativamente rápida mediante mudanças nas políticas. A Venezuela – assim como a maior parte das economias do mundo – também tem problemas estruturais de longo prazo, como uma superdependência do petróleo, uma infraestrutura deficiente e uma capacidade administrativa limitada. Mas não são essas as causas das suas dificuldades atuais.

Enquanto isso, a taxa de pobreza caiu 20% na Venezuela no ano passado. Representa, sem dúvida, a redução mais significativa da pobreza em todo o continente americano para o ano de 2012, e uma das mais importantes – talvez a mais importante – no mundo. As cifras estão disponíveis no site do Banco Mundial, mas praticamente nenhum jornalista empreendeu a viagem muito complicada pelo ciberespaço para encontrá-las e difundi-las. Vale perguntar: por que será que o dado passou batido por eles?

* Mark Wiesbrot é codiretor do Centro para Pesquinda de Economia e Polícia Pública (CEPR, por sua sigla em inglês), em Washington D.C. É doutor em economia pela Universidade de Michigan. É também presidente da organização Just Foreign Policy (Política Externa Justa, em tradução livre).

Originalmente publicado no site
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Na foto: Nicolás Maduro, presidente venezuelano, visita bairro de Caracas. Governo lançou medidas para combater "turismo cambial" (EFE)
 

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