sábado, 2 de novembro de 2013

PARA HAVER PARCERIAS ESTRATÉGICAS É OBRIGATÓRIO NÃO FALAR DO REGIME

 


CONDIÇÃO IMPOSTA PELO NÚCLEO-DURO DO MPLA
 
Folha 8 – 26 outubro 2013
 
O órgão oficial do regime, sem­pre cumprindo ordens, diz em título “Adeus lusofonia” e acusa Portugal de “uma verdadeira agressão a Angola”. Não explica, con­tudo, como é que sendo o regime de José Eduardo dos Santos um dos mais corrup­tos do mundo pode acusar o seu congénere luso que, aliás, é apenas o terceiro país mais corrupto da Europa.
 
“A cúpula em Portugal, Presi­dência da República, Assem­bleia da República, Gover­no, Tribunais, tem pesadas responsabilidades no actual clima de agressão a Angola, que recrudesceu nas últimas semanas e atingiu níveis ina­ceitáveis”, escreve o JR (Jornal do Regime, também conhe­cido por Jornal de Angola), acrescentando que “a postura actual do Estado português representa uma verdadeira agressão a Angola”.
 
Mas, ao que tudo indica, o re­gime vai alargar o leque dos países agressores, incluindo todos aqueles que, como o Brasil, publicaram a versão brasileira da Forbes onde, en­tre outras coisas, se diz que Isabel dos Santos fez fortuna pelo nepotismo.
 
Ninguém vai escapar e não haverá parcerias estratégicas para ninguém. Todos quantos digam, ou permitam que se diga, que Isabel dos Santos é a primeira bilionária africana e lhe chamem a “Menina do Papá”, entram para a lista ne­gra (ou será lista branca?) do regime.
 
E tem razão. Alguém tem al­guma coisa a ver com o fac­to de a fortuna de Isabel dos Santos ser superior a 3.000 milhões de dólares? Ou de a mesma se dever ao nepotis­mo do seu pai, o presidente José Eduardo dos Santos? Ou de a maioria dos angolanos viver com menos de dois dó­lares por dia? Ou de uma fatia de qualquer empresa que aqui se queira estabelecer ser para a “Menina do Papá” que, aliás, tem de assinar a autorização?
 
Um dos exemplo que a For­bes dá, e que é um crime con­tra a segurança do Estado, é o de Isabel dos Santos aparecer de um momento para o outro com 24,5% por cento da com­panhia de diamantes Ascorp através de uma companhia baseada em Gibraltar, a Tran­safrica Investiment Services, TAI. A Ascorp foi formada para fazer parceria com a EN­DIAMA na venda de diaman­tes. Mais tarde a TAI foi trans­ferida para controlo da mãe de Isabel dos Santos. O Conselho de Ministros, presidido pelo presidente Eduardo dos San­tos, aprovou a parceria.
 
Isabel dos Santos controla também 25% da UNITEL, a primeira operadora de teleco­municações privada em An­gola. Isso, diz a Forbes, partiu de um decreto presidencial garantindo licenças sem con­curso público. E então? Quem parte e reparte e não fica com a maior parte, ou é burro ou não tem arte, diz um provér­bio que os portugueses ensi­naram ao MPLA. Portanto…
 
A entrada de interesses priva­dos estrangeiros em Angola terá sido feita também de for­ma “escura” com 25% contro­lado por um “veiculo de inves­timento controlado por Isabel dos Santos”.
 
Refira-se, para que não restem dúvidas quanto à impoluta honorabilidade de um regime que lidera a lista dos mais cor­ruptos, que um representante de Isabel dos Santos disse que todos os seus investimentos são transparentes e têm sido conduzidos com “reputadas firmas de advogados e ban­cos”.
 
Respeitando o que aprende­ram, como muito bem re­corda o Procurador-Geral da República, com os mestres portugueses, os dirigentes an­golanos limitam-se também a seguir os exemplos africanos onde os responsáveis políticos e financeiros transferem enor­mes fortunas para os filhos.
 
Perspectiva-se que, a todo o momento, seja criado em Áfri­ca o “Clube Isabel dos Santos”, entidade que visará integrar os filhos dos dirigentes que fize­ram fortunas enormes, sendo condição sine qua non para admissão que as respectivas populações sobrevivam na miséria.
 
Um dos membros funda­dores será o filho do célebre dono da Guiné-Equatorial, Teodoro Nguema Obiang, que comprou um avião a jac­to, uma mansão em Malibu e um relógio que custou quase quatro milhões de dólares.
 
Todos os dados são relevan­tes para entrar do “Clube Isa­bel dos Santos”. O presidente Denis Sassou-Nguesso referiu na candidatura que, em 2006, ele e a sua comitiva gastaram mais de 150 mil dólares em serviço de hotel durante as cinco noites de visita à Assem­bleia Geral da ONU.
 
Embora a patrona do clube tenha angariado a sua fortuna exclusivamente graças ao tra­balho árduo e a decisões co­merciais audazes, serão admi­tidos sócios que não tenham um tão ilustre curriculum. É que se assim não fosse, Isabel dos Santos não teria quem a acompanhasse.
 
Arvinda Ganesan, da Human Rights Watch, tem passado muito tempo a estudar algo que não existe na Guiné-Equa­torial nem em Angola, a cor­rupção. Daí a sua dificuldade.
 
“O que é admirável nestas duas dinastias é que a riqueza vem à luz, através de proces­sos legais como no caso dos Obiang ou através de trabalho de investigação, ou do anún­cio de que Isabel dos Santos é agora a mulher mais rica de África, tem de se olhar para a história. O que a história de­monstra é que em virtude do relacionamento com o gover­no, eles são capazes de obter investimentos lucrativos ou acesso a receitas lucrativas para poderem construir as suas riquezas”, diz Arvinda Ganesan.
 
Por outro lado, investigadores franceses desde há muito que analisam a família Sassou­-Nguesso, da República do Congo, preocupados em es­clarecer como é que ela anga­riou muitas residências luxuo­sas em França.
 
Também o Departamento da Justiça dos EUA tentou apreender o avião a jacto de Obiang, argumentando que fora adquirido por meios ilíci­tos. Falharam. Não havia pro­vas.
 
Dizem os idealistas que a Europa e os EUA deveriam impedir a entrada de dinheiro sujo, congelando os bens das autoridades corruptas. Aven­tam até a hipótese de os ban­cos prestarem mais atenção à proveniência do dinheiro dos investidores.
 
É claro que todas estas ideias estão a leste da realidade. Se, tal como a droga e a venda de armamento, as lavandarias são um dos negócios mais lucrati­vos do mundo, não faz senti­do que – a troco de uma falsa moralidade – se queira agora acabar com elas.
 
Por alguma razão os principais utilizadores das lavandarias são os donos de países onde, desde logo, as riquezas natu­rais (petróleo, diamantes, etc.) estão ao dobrar de qualquer esquina. E quando assim é, o mundo sabe que os cães la­dram mas a caravana passa. Impávida e serena.
 

Sem comentários:

Mais lidas da semana