Apesar de ter
elementos democráticos, o regime elimina centros de poder que poderiam desafiar
os governantes
Thomas F. Remington
(*), Atlanta – Opera Mundi
A Rússia é uma
democracia? NÃO
Cientistas
políticos devotaram bastante atenção à natureza de “regimes híbridos”, regimes
que combinam ditaduras com elementos de democracia. Os elementos ditatoriais
geralmente incluem limites severos à possibilidade dos opositores ao regime
competirem em eleições ou divulgarem suas mensagens para a sociedade por meio
da mídia.
As eleições são
manipuladas, por exemplo, a partir do registro dos candidatos da oposição ou
abusando das regras de financiamento de campanha. Urnas podem ser preenchidas e
a contagem de votos pode ser falsificada. Ainda assim, eleições são feitas, e
pode ser permitido às forças da oposição ganhar algumas cadeiras nas assembleias
locais e nacionais. Mas os tribunais e legislaturas são minuciosamente
controlados pelos governantes. A estratégia do regime mistura repressão e
cooptação.
O sistema político
da Rússia, desde que Vladimir Putin chegou ao poder, em 2000, é mais livre do
que era na era Leonid Brezhnev, que governou a União Soviética de 1964 a 1982.
Há mais espaço para a organização de grupos civis, seja para questões de
bem-estar ou melhoras cíveis. O regime criou um número de canais para consultar
a sociedade civil, incluindo a Câmara Pública federal e seus equivalentes
regionais.
A imprensa
nacional, especialmente os jornais orientados para os negócios, como o RBK
Daily, o Kommersant e o Vedomosti, são relativamente livres na sua cobertura
jornalística. A internet é relativamente livre também. O regime tenta
policiá-la ameaçando sites com penas severas caso seu conteúdo viole leis vagas
contra “extremismo político” ou “propaganda homossexual”, mas a maior parte das
pessoas pode usar as fontes da internet. Os sites de mídias sociais são muito
usados, especialmente por profissionais jovens e urbanos, e foram um meio
importante para mobilizar protestos políticos depois das falsificações em larga
escala nas eleições parlamentares, em dezembro de 2001, e nas presidenciais, em
março de 2012.
Portanto, a Rússia
tem elementos de um regime democrático. Ainda assim, pelos critérios básicos
que o cientista político Robert Dalh definiu em seu clássico trabalho Poliarquia
— que avaliam quão livre é a participação política e quão extensiva é a contestação
política — a Rússia fica muito aquém dos padrões mínimos de uma democracia.
Por meio da
coerção, geralmente exercida pela manipulação do sistema judiciário, e por meio
da cooptação, o regime eliminou todos os centros de poder que poderiam desafiar
os governantes. A independência dos governadores regionais foi gravemente
truncada. O Parlamento, que com sucesso desafiou o ex-presidente Boris Yeltsin
algumas vezes nos anos 1990, foi colocado sob o firme controle do Kremlin. Há
uma regra informal segundo a qual nenhum grande projeto político, como a
organização de um novo partido ou sindicato, pode prosseguir sem a aprovação do
Kremlin.
O cientista
político Adam Przeworski propõe um critério simples para avaliar a democracia:
existe a possibilidade de os governantes serem derrotados por voto? Por esse
padrão, a Rússia não passa no teste. A Rússia ilustra o modelo de um regime de
um partido autoritário dominante.
Putin emprestou sua
autoridade ao partido Rússia Unida, que manteve a maioria da Duma Federal desde
2003 e domina praticamente todas as assembleias regionais. Como o “partido do
poder”, ele reúne a grande maioria das autoridades do país. Eles têm sua parte
no poder contínuo do partido. Embora o partido não seja especialmente popular,
a maioria das pessoas não vê alternativa a ele, assim como a maioria das
pessoas não vê alternativa a Putin como presidente. O princípio norteador do
regime da Rússia sob Putin é: a
elite dominante não deve nunca ser obrigada a abandonar o poder através de uma
eleição.
(*) Thomas F.
Remington é um professor de Ciência Política na Universidade Emory, autor de
livros e artigos sobre a política russa
*Os artigos publicados em Duelos de Opinião não representam o posicionamento de Opera Mundi e são de responsabilidade de seus autores.
*Os artigos publicados em Duelos de Opinião não representam o posicionamento de Opera Mundi e são de responsabilidade de seus autores.
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