Recente expulsão da
Bolívia de ONG dinamarquesa abriu novas perguntas sobre o papel delas na
América Latina e no Caribe
Juan Manuel Karg –
Adital, Buenos Aires – Opera Mundi
A recente expulsão
da Bolívia da ONG dinamarquesa Ibis abriu novas perguntas sobre o papel das
Organizações Não Governamentais nos países da América Latina e no Caribe,
especialmente em relação aos governos pós-neoliberais. O anúncio da saída da
Agência para o Desenvolvimento Internacional dos EUA (Usaid) do Equador, após o
cancelamento dos projetos que a mesma estava realizando nesse país, mostrou os
limites da "cooperação” que o imperialismo pretende oferecer em nossos países.
Quais são as
funções que podem ser oferecidas por uma ONG em nossos países? Até onde se
permite que estas possam intervir em assuntos internos, sem menosprezar a
soberania do povo e do governo em questão? São perguntas feitas esses dias na
Bolívia, por ocasião da decisão do governo de Evo Morales de expulsar Ibis do
país. Segundo declarou Juan Ramón Quintana, Ministro da Presidência, a ONG
dinamarquesa "abusou da hospitalidade de nosso Estado e já nos cansamos de
que interprete de maneira errada seu papel no país, que se limita ao desenvolvimento
das comunidades”.
Quintana afirmou
que essa não foi "uma decisão caprichosa”, ao dizer que o governo
boliviano conta com provas fidedignas das tentativas de Ibis de incidir na
conjuntura política do país. "Ibis não estava promovendo o desenvolvimento,
mas operava politicamente, dizendo que o governo do presidente Evo Morales está
extraviado, desorientando as organizações sociais”, foram suas palavras sobre
essa ONG questionada, que já havia sido ejetada de forma similar –ou seja,
pelos mesmos motivos- do Equador. As palavras de Quintana deixaram algo bem
claro: na decisão do governo boliviano primou uma tentativa –quase instintiva-
de salvaguardar a soberania de um país (e de um governo) que tem sido durante
esses anos dos mais assediados de nosso continente.
Ao mesmo tempo em
que isso acontecia, em Quito aconteciam também novidades relacionadas com a
presença da Usaid no Equador. Nesses dias, são concluídos diversos programas de
"ajuda econômica-técnica” entre ambos países, assinados em 2007, durante a
primeira presidência de Rafael Correa. De acordo com a informação oferecida
pela agência de notícias Reuters, a Usaid enviou a Quito uma carta para
comunicar o cancelamento de sua ajuda devido à impossibilidade de chegar a um
acordo bilateral sobre sua distribuição. Segundo a Reuters, a Usaid também
havia aludido à decisão das autoridades equatorianas de não aceitar novos
projetos, nem ampliar os já existentes como razão para cancelar sua ajuda.
O chanceler Ricardo
Patiño foi claro a respeito, ao questionar os programas assinados, chamando-os
"pouco transparentes”. Inclusive foi além, afirmando que "se a Usaid
decidiu ir-se, não rogaremos que regressem”. Assim e sem mencionar diretamente
o caso, colocou em consideração o acontecido na Bolívia, ao afirmar,
"conhecemos as más experiências que a Usaid teve em alguns países irmãos,
onde houve clara intervenção, participação de funcionários da entidade em
atuações de desestabilização”. No 1º de maio desse ano, em ato público
relacionado ao Dia Internacional dos Trabalhadores, Morales anunciou a expulsão
da Usaid da Bolívia por "conspirar” contra seu governo. Ao justificar sua
decisão ante os meios, o mandatário boliviano havia afirmado que "se trata
de uma questão de soberania, de segurança para o Estado”.
Como primeira conclusão,
uma certeza: não é casual que ambos governos adotem medidas similares frente a
essas tentativas de ingerência externa. Trata-se de dois dos processos de
mudança social mais radicais que acontecem em nosso continente. São, por isso
mesmo, experiências por demais assediadas por um imperialismo que tenta avançar
sobre o que não pode controlar. As respostas, portanto, mostram uma maturidade
crescente desses processos.
Ficam algumas
perguntas: Até que ponto se pode chegar acordos com esses atores, visto e
considerando os casos que mencionáramos nesse artigo, sem prejudicar a
soberania nacional? Qual poderia ser o interesse dos governos da América Latina
e do Caribe em estabelecer daqui em diante "cooperação” com agências que,
como vemos, apresentam uma difusa reputação democrática em nossa região? As
ONGs e Agências como a Usaid podem atuar "despojados” de uma finalidade
política, que parecera ser o fundamento de sua própria existência?
Os governos
pós-neoliberais de nosso continente deverão analisar seriamente esses tópicos.
Trata-se de salvaguardar a soberania desses países, tentando evitar erros
geopolíticos que possam dar pé a uma possível –e perigosa- restauração
conservadora na região, para a que já estão trabalhando firmemente os governos
da Aliança do Pacífico.
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