domingo, 26 de janeiro de 2014

Angola: SANGUE DO POVO FAZ BRILHAR OS DIAMANTES

 

Orlando Castro
 
A justiça é, cada vez mais, aquilo que os go­vernantes, eleitos ou não, querem que ela seja. Os que man­dam no nosso país resol­veram ordenar que a jus­tiça, a portuguesa no caso, arquivasse os processos que tinha em curso sobre eventuais crimes cometi­dos por altos dignitários do regime. Assim aconteceu. Por cá, país onde a demo­cracia tem características muito peculiares, sabe-se que até prova em contrário todos são culpados.
 
E é neste contexto que Rafael Marques vai ser jul­gado, no Tribunal Provin­cial de Luanda, em nove queixas-crime intentadas contra si por generais an­golanos e uma empresa. Nada de novo. Essa coisa de se achar que existe por cá um Estado de Di­reito e que ninguém está acima da lei é, reconheça-se, um delírio que oscila entre uma peregrina ingenuidade e uma atávica tentação pela cadeia alimen­tar dos jacarés.
 
Os generais em questão não gos­taram de ler (o que só por si é um bom princípio) o que Rafael Mar­ques escreveu no livro, publica­do em Portugal, “Diamantes de Sangue: Tortura e Corrupção em Angola”.
 
Rafael Marques esclareceu à Lusa (agên­cia que, não se sabe muito bem durante quanto mais tempo, ainda vai ouvindo algumas vozes que não são do regime) que a notifica­ção que recebeu é a res­posta ao pedido de arqui­vamento das queixas por calúnia e difamação, envia­do em Dezembro passado, por ter sido ultrapassado o prazo legal para ser constituído arguido.
 
“Os prazos prescre­veram e ao invés de responderem à peti­ção (de arquivamen­to), ignoraram-na e remeteram (os pro­cessos) para o tribu­nal, para julgamento”, conta Rafael Marques. De facto, também em matéria de justiça, o rei não só vai nu como garante que usa roupas de Hugo Boss e Erme­negildo Zegna.
 
No livro, o autor acusou de “crimes contra a hu­manidade” os generais Hélder Vieira Dias “Ko­pelipa”, ministro de Esta­do e chefe da Casa Militar do Presidente angolano; Carlos Hendrick Vaal da Silva, inspector-geral do Estado-Maior General das Forças Armadas Angola­nas (FAA); Armando da Cruz Neto, ex-Chefe do Estado-Maior General das FAA; Adriano Makenzi, chefe da Direcção Principal de Preparação de Tropas e Ensino das FAA.
 
João de Matos, ex-Chefe do Estado-Maior General das FAA; Luís Faceira, ex-chefe do Estado-Maior do Exér­cito das FAA e António Fa­ceira, ex-chefe da Divisão de Comandos, são outros nomes apontados por Ra­fael Marques.
 
Publicado em Portugal em Setembro de 2011, o livro resultou de uma in­vestigação iniciada em 2004 e documenta casos de homicídio e tortura contra os habitantes na região diamantífera das Lundas. A empresa que figura entre os queixo­sos é a sociedade minei­ra ITM Minning Limi­ted.
 
Folha 8, 17 janeiro 2014
 

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