Eduardo Oliveira
Silva – jornal i, opinião
Está a desaparecer
uma fatia da população, enquanto uma pequena parcela acumula riqueza e pouco
contribui para o colectivo
Há muito que a
classe média é o motor da sociedade moderna. É na sua capacidade criativa e de
produção de riqueza que assenta o desenvolvimento e foi a sua implantação que
permitiu o crescimento do consumo e dos grandes negócios.
Além disso, a
existência da classe média foi geradora do desejo de mobilidade e ascensão
social por parte das classes mais baixas que a ela se guindavam, nomeadamente
por via da educação, essa superior forma de progresso.
Apesar destes
factos incontroversos, é hoje sobre a classe média (que concentra o dinheiro
mais limpo e colectável) que se abatem as sucessivas medidas de austeridade
decretadas pelos governos, deixando desprotegida uma população essencial que
empobrece todos os dias, trabalhadores quer do Estado quer do privado ou
sobretudo reformados.
Esta perseguição
faz com que haja pessoas que viram pensões da Segurança Social que há quatro
anos andavam nos 2400 euros ser objecto de um confisco de 500 euros mensais,
por via de cortes sucessivos iniciados no tempo de Sócrates completados pela
famigerada CES (outro imposto) e uma revisão em alta do IRS, isto para não
falar do aumento do custo de vida e de todas as taxas e impostos possíveis.
É na franja que vai
dos mil aos dois mil e quinhentos euros de rendimento líquido que se encontra
boa parte do número de trabalhadores activos, comerciantes e reformados que
efectivamente contribuíram durante uma vida inteira, fazendo os seus descontos,
a que se juntaram os das empresas.
É exactamente por
isso que hoje se chegou a um ponto em que não é possível sacrificar mais esta
faixa da população, porque já não há equidade.
Quem ganha muito
bem e trabalha para outrem já prefere reduzir salários e investir em PPR
privados, o que é um dos objectivos de qualquer governo liberal como o actual.
Mas isso vai agravar ainda mais as contas da Segurança Social, que agregam
milhares de pensionistas que pouco ou nada descontaram. Como é evidente, ao
Estado compete dar esse apoio assistencialista e humanitário, mas o propósito
não deve ser obtido à conta de quem teve uma vida contributiva estável e longa,
criando riqueza e assegurando apoio às gerações mais novas. Não colhem os exemplos
demagógicos que usam certos governantes para legitimar cortes, alegando que
deixam de fora 87% dos pensionistas, pois isso é dizer que há 13% que suportam
tudo, o que é praticamente um atentado a direitos humanos e reconhecer que os
restantes vivem abaixo do limiar da pobreza.
Evitar a destruição
da classe média que já não está activa, da que persiste em ficar por cá e da
que é obrigada a fugir para o exterior, é o maior desafio para Portugal e a
Europa nos próximos tempos.
Para conseguir, é
necessário entrar numa fase de crescimento económico, mas também ir buscar
contributos ao capital especulativo que faz dinheiro sobre dinheiro sem criar
postos de trabalho e riqueza ao nível do cidadão, enquanto milhares de milhões
se deslocam de um ponto para outro à velocidade da luz.
Se assim não for,
deixará de existir classe média, sobrando uma massa proletarizada que interessará
enquanto for consumindo algo para comer e comprar mais um conjunto de coisas
electrónicas normalmente inúteis, para gáudio das 85 personagens que, segundo
um relatório sobre a desigualdade publicado a propósito da reunião de Davos,
acumulam 1,7 mil milhões de dólares, tanto como metade da população do mundo,
ou seja, 3,5 mil milhões de pessoas.
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