Carvalho da Silva –
Jornal de Notícias, opinião
Que verdade existe
na fortíssima campanha em curso para convencer os portugueses do êxito das
políticas de brutal austeridade? Por que participam nesta campanha o Governo, o
PSD e o CDS, altos responsáveis da União Europeia (UE) e até um secretário de
Estado norte-americano? Como estão a reagir os portugueses, grande parte dos
quais precisa, como de pão para a boca, de deitar mão a qualquer sinal de esperança
para não enlouquecer?
Se pararmos para
pensar, constatamos, de imediato, alguns factos inquestionáveis: os indicadores
com que nos apresentam o êxito não coincidem com a realidade que as pessoas e a
esmagadora maioria das empresas vivem, pois os seus problemas estão a
agravar-se e não a diminuir; mas, as eleições europeias estão à porta e os
mandantes da UE precisam de lavar a face para que o avanço da extrema-direita
(que têm promovido) não seja "excessivo" e para lançar um pouco de
poeira aos olhos dos cidadãos europeus que querem mesmo uma mudança de rumo; os
EUA exportaram e exportarão parte significativa da sua crise para a Europa, por
isso têm de ser solidários com os "amigos europeus"; as eleições
europeias vão realizar-se dez dias depois da "saída da troika", logo
o Governo e os seus apoiantes internos e externos, fazendo uma boa encenação,
podem ajudar o PSD e o CDS a ter mais uns votos, e a ganhar fôlego para
prosseguirem nas suas políticas.
A chamada melhoria
dos indicadores económicos não se reflete em mais recursos para as pessoas e
para a maioria das empresas, mas os acionistas da banca e dos grandes grupos
económicos veem as suas ações valorizar-se e as grandes fortunas crescem. Muito
do emprego que está a ser criado são ocupações pontuais e/ou trabalhos com
horários reduzidos e muito mal pagos, enquanto cresce a destruição de emprego
com horários normais e retribuições dignas.
O polaco László
Andor, Comissário Europeu para o Emprego, Assuntos Sociais e Inclusão, em
artigo recente ("Vox", 16/12/2013), encenando o papel de consciência
boa da Comissão Europeia, fez um conjunto de afirmações que não nos deixam
dúvidas. Diz ele agora que a UE deve superar a "ortodoxia de
Maastricht" e preocupar-se com o emprego; que o desemprego tem origem nas
opções que conduzem à recessão económica e não na "rigidez" do
mercado de trabalho; que é um erro colocar todos os estados em competição para
serem exportadores líquidos; que não existem mecanismos reais de solidariedade
na EU capazes de travar a polarização em curso; e termina afirmando que a Zona
Euro "pode ser temporariamente vantajosa para os detentores de capital e
para os credores, em geral", prejudicando "os trabalhadores, os
empresários da economia real, os devedores de todos os tipos, os utilizadores
de serviços públicos". Diremos nós, a maioria dos portugueses.
Só que a
temporalidade de que fala quanto à repartição de custos e benefícios já dura há
demasiado tempo, está inscrita nas regras do jogo de uma moeda única com um
desenho feito para favorecer certos interesses, em certos países. E a Comissão
Europeia, de que Andor faz parte, sempre promoveu esse modelo.
Passos Coelho e C.ª
dizem-nos todos os dias que as políticas seguidas "estão a dar
resultados" e que "a situação do país está a inverter-se". Só
que os resultados de que o país precisava, com um verdadeiro programa de ajuda,
seriam: a diminuição da dívida; o aumento da nossa capacidade de produzir
riqueza; o equilíbrio das contas públicas à custa de esforços de quem tem mais
riqueza e da restituição de roubos feitos ao povo; diminuição da corrupção e do
compadrio; mais justiça na distribuição da riqueza; uma Administração Pública
mais eficaz. Ora, não é nada disso que fica da presença da troika e das
políticas impostas.
Entretanto, "a
situação inverteu-se", de facto. Temos agora menos emprego e emprego de
pior qualidade. Salários, pensões e prestações sociais mais baixos. Pior saúde
e ensino. Milhares de empresas destruídas. Maior concentração da riqueza. Mais
desigualdades, injustiças e pobreza. Um Estado social fragilizado e o Orçamento
do Estado ao dispor dos negócios dos grandes capitalistas.
É este
"êxito" que pretendem institucionalizar por muitos anos.
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