Seis casos revelam:
efeitos graves de medicamentos são omitidos, para sustentar consumo e lucros.
Verdade aparece quando patentes estão expirando…
Martha Rosenberg –
Outras Palavras - Tradução: Gabriela Leite
Quando um
medicamento causa efeitos colaterais, esta informação muitas vezes não é
exposta durante anos, o que permite à indústria farmacêutica continuar ganhando
muito dinheiro.
O Food and Drug
Administration (FDA) [órgão governamental dos EUA para alimentos e
medicamentos] e a indústria farmacêutica argumentam que os efeitos colaterais
perigosos em uma droga só aparecem quando é usada por milhões de pessoas – e
não no grupo relativamente pequeno de pessoas que fazem testes clínicos. Mas
existe outra razão pela qual os consumidores acabam sendo cobaias. Os remédios
são levados apressadamente ao mercado, após um período muito curto (de apenas
seis meses) para que a indústria possa começar a ganhar dinheiro, enquanto a
segurança ainda está sendo determinada.
Tanto a droga para
os ossos Fosamax,
repleta de riscos, quanto a analgésica Vioxx, ambas da
indústria Merck, foram ao mercado após seis meses de revisão. No caso da Vioxx,
isso ocorreu porque “o medicamento potencialmente provia uma vantagem
terapêutica sinificativa sobre outras drogas já aprovadas”, disse a FDA.
Obrigado por isto.
E cinco drogas (Trovan,
Rezulin,
Posicor,
Duract e Meridia), que
entraram no mercado em 1997 por pressões da indústria e do Congresso sobre a
FDA, diz a PublicCitizen, foram em seguida retirados.
Abaixo, algumas
drogas cujos riscos não impediram que seus fabricantes fossem autorizados a
colocá-las a venda e exercer seu “valor de patente”.
1. Singulair
Você imaginaria que
a Merck aprendesse, após os problemas com Vioxx e a Fosamax, que marketing
agressivo pode esconder apenas por algum tempo os riscos emergentes das drogas.
Mas não. Para vender o Singulair,
sua droga contra asma e alergias para crianças, a indústria fez uma parceria
com Peter Vanderkaay, o nadador medalha de ouro nas Olimpíadas, com acadêmicos
e com a Academia Norte-americana de Pediatras – mesmo após a FDA advetir sobre
os “eventos neuropsiquiátricos” do medicamento, incluindo agitação, agressão,
pesadelos, depressão, insônia e pensamentos suicidas.
Enquanto a Merck
fazia a propaganda
do Singulair (que vem em fórmula mastigável e com gosto de cereja), com slogans
como “Singulair é feito pensando nas crianças”, a Fox TV e mais de 200 pais
relataram, no site askapatient
[“pergunte a um paciente”] que suas crianças, ao tomar o remédio, exibiam humor
alterado, depressão e déficit de atenção (ADHD), hiperquinesia e sintomas
suicidas. Cody Miller, um garoto de 15 anos de Queensbury, Nova York, tirou sua
própria vida dias após tomar o medicamento, em 2008. Ainda assim, o Singulair
arrecadou 5 bilhões de dólares para a empresa, em 2010. Após sua patente
expirar, em 2012, a Administração de Bens Terapêuticos da Austrália
(equivalente à FDA ou à Anvisa) reportou 58 casos de eventos psiquiátricos
adversos em crianças e adolescentes, primariamente pensamentos suicidas. Quem
sabia?
2. Zyprexa
Como vender uma
droga que provoca ganho de peso de cerca de 10kg, em 30% dos pacientes,
chegando até 45kg, em alguns? Enterrando seus riscos. O antipsicótico Zyprexa era a nova aposta da
Eli Lilly, depois de seu antidepressivo campeão de vendas Prozac – mesmo que o
laboratório soubesse, já em 1995, de acordo com o New York Times, que a droga
está ligada a um ganho de peso incontrolável e até diabetes. Os efeitos
colaterais do Zyprexa de “ganho de peso e possível hiperglicemia fazem um
grande mal ao sucesso de longo prazo desta molécula criticamente importante”,
havia escrito Alan Breier, da Lilly, segundo documentos obetidos pelo jornal.
Mais tarde Alan tornou-se médico-chefe da empresa.
Mesmo após a Lilly
ter pagado multas, após acusada de ocultar informações sobre a relação entre a
droga e altos níveis de açúcar no sangue ou diabetes (e de ter comercializado
ilegalmente a droga para pacientes com demência), o Zyprexa rendeu 5 bilhões de
dólares em 2010, acima até do Prozac. Quem disse que crime não compensa? O
Zyprexa foi especialmente comercializado para os pobres e virou um dos
medicamentos principais do Medicaid, o programa público de saúde
norte-americano, extraindo pelo menos 1,3 bilhões de dólares do orçamento do
país, só em 2005. Em 2008, a empresa estabeleceu um acordo para cobrir o custo
dos pacientes do Medicaid que desenvolveram diabetes após usar a Zyprexa. Como
raposa vigiando galinheiro, a Lilly ofereceu um “serviço gratuito” para
“ajudar” os estados a comprar drogas como a Zyprexa para doenças mentais — e
vinte deles aceitaram a oferta. A patente do remédio acabou em 2012.
3. Seroquel
O antipsicótico Seroquel,
produzido pelo laboratório AstraZeneca, do Reino Unido, tornou-se um dos
medicamentos mais vendidos nos EUA, arrecadando mais de 5 bilhões de dólares em
2010, apesar de seus riscos,
frequentemente relatados. O remédio foi comercializado tão vastamente para
crianças pobres que, em 2007, o Departamento de Justiça para a Juventude da
Florida comprou duas vezes mais Seroquel que Advil. Sua elevada aquisição no
serviço militar, para usos não aprovados — como para estumular o sono e para
distúrbio de estresse pós-traumático (PTSD) — também foi espantosa. Relatos de
mortes repentinas de veteranos que utilizavam a droga emergiram quando as
compras do Seroquel pelo Departamento de Defesa dos EUA cresceram 700%.
Poucos meses após a
aprovação da Seroquel, em 1997, um artigo
no Jornal de Medicina de Dakota do Sul já levantava questões sobre a interação
perigosa da droga com outros onze medicamentos. Passados três anos,
pesquisadores da Cleveland Clinic questionavam o efeito da Seroquel na
atividade elétrica do coração. Mas mesmo quando as famílias de veteranos
falecidos prestaram testemunhos em audiências no FDA, em 2009, e exigiram
respostas de dirigentes e legisladores, o órgão protegeu a empresa. Depois, em
2011, com pouco alarde, o FDA emitiu novos avisos que confirmavam as notícias
devastadoras: tanto o Seroquel quanto sua versão estendida, que fora lançada,
“deveriam ser evitados” na combinação com pelo menos outros 12 remédios. A
droga também deveria ser evitada pelos idosos e pessoas com doenças cardíacas,
por causa de seus claros riscos ao coração. Ops… A patente expirou no ano
seguinte.
4. Levaquin
Os antibióticos à
base de fluoroquinolona estão entre os mais vendidos. Muitas pessoas lembram-se
do Trovan (na época
dos ataques com antrax, logo após o 11 de setembro), mas a indústria
farmacêutica espera que não nos lembremos de que foi retirado de circulação por
causa de danos ao fígado, e do Raxar,
removido por causar eventos cardíacos e morte súbita. O Levaquin,
da Johnson & Johnson, igualmente baseado em fluoroquinolona, foi o
antibiótico mais ventido nos EUA em 2010, com receitas acima de US$1 bilhão por
ano — mas agora é tema de milhares de processos.
Em 2012, um ano
após a patente do Levaquin expirar, uma enxurrada de efeitos colaterais começou
a emergir, sobre este medicamento e toda a classe de fluoroquinolonas, lançando
dúvidas sobre sua segurança. A revista da Associação
Médica Norte-Americana relatou que, de 4.384 pacientes diagnosticados com
descolamento de rotina, 445 (10%) foram expostos a fluoroquinolone no ano
anterior ao diagnóstico. A Revista de Medicina da Nova Inglaterra relatou no
mesmo ano que o Levaquin estava ligado a um risco crescente de morte
cardiovascular, especialmente morte súbita por distúrbios no ritmo cardíaco.
Embora a FDA tenha
alertado sobre as rupturas de tendão — especialmente os tendões de Aquiles —
provocadas por fluoroquinolonas em 2008, e adicionado uma tarja preta de
advertência na embalagem, novos avisos graves foram feitos dois anos após o fim
da patente do Levaquin. Em 2013, a FDA advertiu sobre o “efeito colateral sério
de neuropatia periférica” — um tipo de dano nos nervos no qual as vias
sensoriais são prejudicadas — nas fluoroquinolonas. Neuropatias periféricas
causadas por esta classe de antibióticos podem “ocorrer logo após a
administração destas drogas, e podem ser permanentes”, alertou a ageência.
Fluoroquinolonas também estão ligadas ao Clostridiumdifficile, também
chamado de C. Diff, um micróbio intestinal sério e potencialmente mortífero.
5. Topamax
Antes de sua
patente expirar, em 2009, a droga Topamax
deu à Johnson & Johnson um bilhão de dólares por ano, e foram mais US$ 538
milhões depois disso. O remédio foi tão preferido, para condições de dor no
serviço militar, que recebeu o apelido de “Stupamax” – uma referência à maneira
com que diminuia os tempos de reação e prejudicava a coordenação motora, a
atenção e a memória, de acordo com o ArmyTimes. Não era muito bom para o combate…
Um ano antes de
cair a patente do Topamax, a FDA alertou que ela e outras drogas estão
correlacionadas com suicídios, e pediu a seus fabricantes para adicionar avisos
na caixa. Quatro pacientes usuários da droga mataram-se, contra nenhum sob
placebo, declarou a FDA após rever os testes clínicos. Já em 2011, o órgão
anunciou que o Topamax pode causar defeitos de nascimento nos lábios, nos bebês
de mães que ingerem a droga. “Antes de começar com o topiramato, grávidas e
mulheres em idade fértil devem discutir outras opções de tratamento com seu
profissional de saúde”, alertou o FDA, mas isso não impediu o órgão de aprovar
uma nova dieta de medicamentos contendo o genérico do Topamax, em 2012.
6. Oxycontin
O Oxycontin, do laboratório
Purdue Pharma, é a avó de drogas que geram muito dinheiro, apesar de seus
efeitos colaterais letais. Junto de outros opióides, ele causou o número
assutador de 17 mil mortes no ano passado — quatro vezes mais que em 2003. “O
aumento [no uso] foi alimentado em parte por médicos e organizações de defesa
de analgésicos, que recebiam dinheiro de empresas e faziam alegações enganosas
sobre a segurança e a efetividade de opióides — inclusive afirmando que o vício
é raro”, relatou o Journal Sentinel. A Sociedade de Geriatras Norte-Americanos
usou pesquisadores ligados à indústria farmacêutica para reescrever guias
clínicos em 2009, diz a publicação. Após reescritos, eles especificavam
opióides para todos os pacientes com dor moderada a severa
Devido a sua
fórmula, que lhe permite agir por um longo período, pensou-se que o Oxycontin
teria toxidade e potencial de provocar dependência reduzidos – ao menos até
seus efeitos tornarem-no mais popular que a cocaína nas ruas (todos os 80mg de
pílulas podíam ser tomados de uma vez). Em 2010, respondendo aos vícios,
overdoses e mortes associadas à droga, a Purdue Pharma desenvolvou um Oxycontin
inviolável, e, dois anos depois, passou a pressionar por leis que exigissem
inviolabilidade de todos os opiácios. A empresa garantiu que sua maior
preocupação era a saúde pública, mas muitos se perguntaram sobre o porquê desta
preocupação só se revelar às vésperas do fim da patente da droga, em 2013…
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