Lula reafirmou que
sua candidata é Dilma Rousseff e defendeu a necessidade de uma Constituinte
Exclusiva para fazer a Reforma Política no Brasil.
Marco Aurélio
Weissheimer – Carta Maior
São Paulo - O
ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva rechaçou nesta terça-feira (8) os
boatos e especulações sobre uma possível candidatura à presidência da
República. Em entrevista coletiva concedida a blogueiros e jornalistas de
publicações eletrônicas, Lula fez questão de iniciar a conversa afirmando:
“Hoje estou começando um novo momento. Não sou candidato, minha candidata é
Dilma Rousseff. Acho que a Dilma tem competência e todas as condições para
fazer o Brasil avançar. É um privilégio para o Brasil tê-la como candidata”.
Lula falou sobre
sua relação com a presidenta Dilma Rousseff, destacando que não é fácil o papel
de ser ex-presidente. “Tem que ter cuidado para não ficar dando palpite no
mandato de quem está governando. Às vezes, acho que tem político que não gosta
de eleger seu sucessor porque prefere ser oposição. É preciso, ao sair da
presidência, saber ser ex-presidente e não ficar dando palpite. Não faltou
gente na imprensa querendo fabricar uma briga minha com a Dilma. Acho que os
meios de comunicação no Brasil pioraram”.
Durante cerca de três horas, o ex-presidente foi questionado sobre um vasto
leque de temas, que envolveram o mensalão, a prisão de José Dirceu, o STF, as
denúncias contra a Petrobras, os protestos de junho de 2013, a Copa do Mundo, a
mídia brasileira, o PT, os desafios para o futuro e a campanha eleitoral deste
ano, entre outros. Lula não evitou nenhum tema e apontou a Reforma Política
como a mais importante das reformas e defendeu a convocação de uma Constituinte
Exclusiva para a sua realização. Além disso, anunciou que está com todo o
fôlego para a campanha eleitoral deste ano:
"O que
incomoda demais a eles é que estou vivo e com muita vontade de brigar. E vou
brigar pela Dilma. Estou motivado e disposto e não baixar a cabeça. Se você
baixa a cabeça, eles colocam uma canga em cima"
A seguir, um resumo das principais declarações do ex-presidente na entrevista:
A situação da economia, reforma agrária e educação
Quantas economias estão crescendo mais que o Brasil hoje no mundo? Tem a China,
talvez a Coreia do Sul. Mas no caso da China sempre devemos levar em conta a
ausência dos direitos trabalhistas que temos e a ausência de um Congresso com
uma oposição atuante também. Estamos há onze anos aumentando a massa salarial e
mantendo a inflação num patamar de 5,9%. Qual é o país que tem hoje uma dívida
pública de 57% de seu PIB? Há poucos países no mundo hoje que tem os
indicadores no Brasil. O mundo está em crise. As regiões que estão crescendo
são a América Latina e a África. Há pessoas que, num passado recente, achavam
bom o país crescer 2,0% e hoje acham ruim que hoje cresça a 2,9%. Olhando o que
a imprensa tem noticiado, às vezes me dá a impressão que o país vai acabar. A
economia brasileira está aquém do que gostaríamos, mas vamos ver quem está
melhor que nós. Chegamos ao fim de 2013 com um desemprego de apenas 4,3%. A
Espanha está com cerca de 20% de desemprego. Outros países da Europa estão com
8% ou 9%.
Falta fazer? Falta, porque estamos muito atrasados. Mas o que fizemos
democraticamente em 11 anos há revoluções que não fizeram em muito mais tempo.
Em 11 anos de políticas de Reforma Agrária, assentamos agricultores em 48
milhões de hectares de terra. Isso representa 55% de tudo o que foi
desapropriado em 500 anos de história do Brasil. Também em 11 anos, na
educação, saímos de cerca de 3,5 milhões de estudantes universitários para mais
de 7 milhões. Sabemos que ainda há muito a ser feito na educação e é por isso
que o dinheiro dos royalties do petróleo será destinado para esta área. O povo
quer mais, o povo tem mais demandas e nós temos que atender. A Dilma tem que
dizer isso na campanha: como é que vamos melhorar a economia brasileira.
Numa escala de 16 degraus, nós subimos 5 ou 6. O mais importante foi vencer o
complexo de vira-latas. Tínhamos uma elite complexada que só achava bonito o
que vinha de fora. O Brasil superou esse complexo e precisa ir para a ofensiva.
A situação da saúde: é preciso dinheiro grosso
Não existe forma barata de resolver o problema da saúde no Brasil. É preciso
investir dinheiro grosso nesta área. Há quem diga que há problemas de gestão.
Pode até haver, mas o principal problema é a falta de recursos. Quando se
universaliza um serviço, se inclui uma massa de gente nele e, para manter a
qualidade na prestação do serviço, é preciso de dinheiro. Por que é mesmo que
acabaram com a CPMF, um imposto sobre 0,38% da movimentação financeira? O
objetivo real foi evitar uma maior fiscalização do governo sobre a sonegação
fiscal. Mais de 250 bilhões de reais foram retirados da saúde em cinco anos do
meu mandato, cerca de 50 bi por ano. Sem dinheiro, o povo mão terá acesso a um
tratamento de qualidade.
O Mais Médicos está provando que o Brasil não tem excesso de médicos. Tem
excesso de médicos na Avenida Paulista. Mas esse programa não vai resolver o
problema central, pois vai gerar a demanda de mais especialistas para dar
continuidade aos tratamentos. O que precisamos fazer é credenciar a rede médica
de todo o país para atender pelo SUS e melhorar o pagamento do SUS para os
médicos. Precisamos também fazer com que todos os governadores cumpram a emenda
29 e dediquem 12% do orçamento para a saúde.
Mas, apesar de todos os problemas, o SUS é motivo de orgulho para o Brasil.
Basta comparar com o que existe em outros países, inclusive países desenvolvidos.
O problema é que só aparece gosto de 2008coisa ruim na saúde, há muita coisa
positiva acontecendo também, milhares de pessoas sendo atendidas todos os dias.
Ninguém diz que o governo criou o SAMU. Parece que caiu do céu. Que país
distribui a quantidade de medicamentos que nós distribuímos por meio das
farmácias populares? Mas nada disso aparece na televisão.
Reforma Política: só com Constituinte Exclusiva
No dia 27 de agosto de 2008 determinei aos então ministros José Múcio e Tarso
Genro para quem fossem à Câmara em meu nome e entregassem um projeto de Reforma
Política que previa, entre outras propostas, o financiamento público de
campanha, o voto em lista partidária fechada, o fim das coligações
proporcionais, a fidelidade partidária e a adoção de uma cláusula de barreira
para organizar a vida partidária. Infelizmente a proposta não avançou e deve
ter acabado em alguma gaveta.
Acho que a principal reforma que o Brasil precisa é a Reforma Política. E estou
convencido que esse Congresso não a fará. É muito difícil que as pessoas
aceitem mudar o seu próprio status quo. Então, sou favorável a uma Constituinte
Exclusiva para fazer a Reforma Política. Não tem outro jeito.
Os protestos de junho e a proposta de uma lei antiterrorismo
“A democracia que queremos construir não significa um pacto de silêncio. É bom
que a sociedade se manifeste. Precisamos aprender a lidar com isso. Não vi
nenhuma reivindicação absurda nos protestos de junho, com exceção daqueles que
pretendem negar a política. Acredito que estamos vivendo um momento rico da
democracia brasileira e acho impensável querer proibir alguém de usar máscaras
no país do Carnaval. O Brasil não precisa de uma lei antiterrorismo porque aqui
não tem terrorismo. A própria sociedade fará um processo de depuração
distinguindo quem quer defender uma causa determinada e quem quer só fazer
baderna”.
“Em política vale tudo, a única coisa que não podemos fazer é negar a política,
pois o que vem depois é pior. Temos aí o caso do Egito para ilustrar isso. Começou
como uma revolta popular para derrubar um ditador e acabou retornando a uma
ditadura. Somente através do exercício da democracia e da política é que
podemos avançar, e isso significa saber conviver com os contrários”.
Regulação da mídia e marco civil da internet
Nós vamos ter que enfrentar esse tema. Não sei se vai ser agora na campanha ou
depois. Há seis meses, ninguém acreditava que conseguiríamos aprovar o Marco
Civil da Internet. Conseguimos e agora temos que evitar recuos no Senado.
Depois de aprovar a neutralidade na rede devemos discutir agora outras formas
de neutralidade. Não queremos censurar ninguém. Quem deve fazer isso é o
leitor.
Petrobras
Qual o interesse em enfraquecer a Petrobras? Acho que o governo tem que partir
para a ofensiva neste tema. Mais uma vez, quando a oposição não tem programa
nem propostas para o país, levanta a ideia de fazer uma CPI. O caso da
refinaria de Pasadena já está sendo investigado pelo Tribunal de Contas, pelo
Ministério Público e por outros órgãos de controle. Estão fazendo o trabalho
que sempre fizeram. O PT também tem que ir para cima nesta questão. As pessoas
precisam levantar a cabeça e brigar de verdade. Cadê o blog da Petrobras? A
capitalização que a Petrobras realizou foi a maior da história do capitalismo
mundial.
Mensalão
Espero que o partido tenha aprendido a lição com a CPI do Mensalão. Devia ter
feito o debate político e não ficar esperando uma solução jurídica. A imprensa
ajudou a construir o resultado desse julgamento. Ainda quero entender como uma
CPI que começou com uma fraude de 3 mil reais nos Correios, envolvendo uma
pessoa ligada ao PTB, acabou estourando no PT, que pagou um alto preço por
isso. A elite nunca foi condescendente com a esquerda, e a esquerda costuma ser
condescendente com a direita. Acho que a história do mensalão vai ser
recontada. E se eu puder ajudar a recontá-la, farei isso. O tempo vai se
encarregar de repor a verdade.
Copa do Mundo: um encontro de civilizações
Eu sei do orgulho que foi a conquista da Copa do Mundo e das Olimpíadas para o
Brasil. Houve poucas coisas que emocionaram mais o povo brasileiro do que
quando foi anunciada a vitória do Rio de Janeiro para sediar as Olimpíadas.
Como transformar isso em uma derrota, em algo ruim para o país. O dinheiro
usado para a construção de estádios não é dinheiro do orçamento, não foi
desviado da saúde ou da educação para este fim. E temos muitas obras de
infraestrutura, como a ampliação e modernização de aeroportos, que ficarão como
legado para o país. A Copa do Mundo no Brasil é muito mais do que dinheiro. Ela
é um encontro de civilizações em torno do esporte. Querer anular tudo isso é
falta de auto-estima. Deus queira que a gente ganhe. Se tiver uma final entre
Brasil e Argentina será maravilhoso.
Sobre o PT
“Toda vez que um partido chega ao governo e esse governo dá certo, o partido
sofre, pois o governo carrega seus melhores quadros. O PT não pode abrir mão de
dizer o que pensa sobre o país e tem que conversar permanentemente com a
sociedade. O PT poderia ter se tornado a grande referência para toda a América
Latina, mas eu também tenho minha parcela de responsabilidade disso não ter
acontecido. Nós temos que pensar e dar mais atenção ao nosso principal
patrimônio que é a militância espalhada por todo esse país que trabalha
diariamente em defesa daquilo que acredita. É nela que devemos pensar para que
façamos as coisas certas e não cometamos erros que possam prejudicá-la”.
Sobre a indicação
de Joaquim Barbosa
"Não me
arrependo de ter indicado o Joaquim Barbosa. Eu queria um advogado negro na
Suprema Corte. De todos os currículos, o dele era o melhor. O comportamento
dele é de sua inteira responsabilidade. Precisamos lembrar que o STF também
aprovou algumas coisas importantes neste período como a questão das células
tronco, a reserva Raposa do Sol e a união civil de pessoas do mesmo sexo".
Sobre a candidatura
de Eduardo Campos
“Tenho uma belíssima relação com o Eduardo Campos e sou agradecido pelo que ele
contribuiu com o meu governo. Creio que ele também é agradecido pelo o que meu
governo fez pelo Estado de Pernambuco. Infelizmente, ele decidiu romper a
relação conosco e seguir outro caminho. É uma pena que dá sinais de estar indo
mais para a direita do que para a esquerda”.
Denúncias envolvendo André Vargas
“Como deputado e vice-presidente da Câmara, ele tem que explicar seus atos para
a sociedade. Espero que ele consiga provar que não há nada além de uma viagem
de avião. Porque sempre acaba estourando no PT”.
Créditos da foto:
Ricardo Stuckert/Instituto Lula
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