Caos
atual no Iraque mostra que os EUA têm de lutar novamente contra um monstro
(ISIS) que eles próprios criaram e armaram
Alex
Kane, Alternet. Tradução: Vinicius Gomes, Fórum – Pragmatismo Político
Os
ataques aéreos dos EUA no Iraque estão atingindo os combatentes do Estado
Islâmico do Iraque e da Síria (Isis, sigla em inglês), que estão usando de
armamento feito nos EUA. Esse simples fato mostra uma dura realidade na
história da política externa dos EUA em um país destruído por bombas
norte-americanas e, então, uma guerra civil.
Durante
a última semana, o Pentágono lançou declarações triunfantes sobre o esforço
militar dos EUA contra o Isis. Mas o que não é mencionado por eles é que
aqueles iraquianos andando em veículos armados portando armas e artilharias
provavelmente foram abastecidos por contribuintes norte-americanos. As armas
que o Isis possui são outra amostra do fracasso que foi a invasão dos EUA em
2003. Isso é similar ao que aconteceu na intervenção norte-americana na Líbia,
em 2011, que derrubou o ditador Muammar Qadafi, mas também desestabilizou o
país – resultando então em um fornecimento de armas para os militantes do Mali,
mais ao sul, que por sua vez levou a uma intervenção da França e dos EUA no
país africano em 2013.
Ao
passo que o Isis, junto de sunitas insatisfeitos e cansados da discriminação e
marginalização que sofrem há anos, avançaram pelo Iraque e capturaram armas
fabricadas nos EUA. Iniciada em junho, o Isis capturou grandes porções de
território no norte do Iraque. O exército iraquiano, treinado pelos EUA, entrou
em colapso frente aos avanços do Isis. Em uma combinação de fraco treinamento,
equipamentos quebrados e moral baixa, eles deixaram para trás armas, munições e
equipamento que foram produzidos e pagos pelos EUA, que usou de 25 bilhões de
dólares para treinar e armar o exército do Iraque desde 2003.
Então,
agora o Isis possui centenas de veículos armados, caminhonetes, tanques,
humvees, assim como munições e armas, que eles utilizam enquanto continuam a
marchar pelo país para ajudar a sua luta em outro país: a Síria, onde o Isis
está lutando contra o governo de Bashar al-Assad – ironicamente, também inimigo
dos EUA.
Histórico
A
história de como as armas dos EUA acabaram nas mãos daqueles que muitos
descrevem como o mais temido movimento islâmico no mundo data de 2003. Esse foi
o ano em que a administração Bush, baseada em informações maquiadas, mentiu
para o seu povo a fim de justificar um ataque militar contra o Iraque e sua
subseqüente ocupação. Os EUA debandaram grande parte dos militares iraquianos,
compostos em sua grande maioria por muçulmanos sunitas. Isso fez com que
aumentasse a insurgência anti-ocupação no país, mas então buscou reagrupar tal
exército sem a influência daqueles que trabalharam com Saddam Hussein.
Em
2006, o homem comandando o show de reformar as forças armadas do Iraque era
Nouri al-Maliki, o atual primeiro-ministro e muçulmano xiita. Escolhido a dedo
pelos EUA, a ascensão de Maliki ao poder foi um símbolo de como a estrutura de
poder do Iraque foi revirada do avesso. Sob o comando de Saddam Hussein, a
minoria sunita tinha muito mais poder, apesar de o partido de Hussein, o Baath,
incluir xiitas. Mas a invasão norte-americana entregou todo o poder aos xiitas,
resultando em um grave sectarismo entre as duas alas islâmicas. Além disso,
Maliki não fez esforço algum para criar uma estrutura governamental mais
inclusiva.
O
governo de Maliki alienou os muçulmanos sunitas, que organizaram maciços
protestos contra ele, que foram recebidos sob intensa violência, matando
centenas de civis. Ele ordenou, inclusive, a prisão de seu vice-presidente
sunita, em 2011. As forças de segurança prenderam milhares de homens sunitas
sem qualquer acusação, classificando-os como terroristas. Muitos foram
torturados. Maliki também realizou um expurgo de sunitas dentro da máquina
burocrática. E os EUA ajudaram Maliki em sua busca para marginalizá-los,
financiando seu governo e fornecendo armas a suas forças de segurança.
Em
15 de agosto, sob intensa pressão dos EUA e do Irã – país que passou a ter
grande influência no país, Maliki saiu de cena. O novo primeiro-ministro,
Haidar al-Abadi, vem do Partido Dawa, o mesmo de Maliki. A esperança é que
al-Abadi governará de modo mais inclusivo, apesar de tal decisão já receber
críticas.
Os
EUA estão agora aumentando seus bombardeios aéreos e armando as milícias
curdas, no norte do país, em uma tentativa de derrotar um monstro que eles
mesmos criaram e que, paradoxalmente, está sendo financiado por aliados
norte-americanos, como a Arábia Saudita e o Kuwait.
Mas
se a história da política dos EUA para com o Iraque mostra alguma coisa, é que
bombardeios não serão suficientes para resolver a crise no país.
Na
foto: Financiado pelos EUA, Estado Islâmico cresceu e se tornou problema para
os próprios norte-americanos (Imagem:Pragmatismo
Político)
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