quinta-feira, 21 de agosto de 2014

Portugal: Aventuras e desventuras presentes e futuras de Marinho e Pinto



Francisco Louçã – Público, opinião, em Tudo Menos Economia

É sempre com estardalhaço que o populismo se dirige à plebe e Marinho e Pinto parece ter aprendido na escola da melhor sofisticação e elegância.

Ao Jornal de Notícias confidenciou que sairá do Parlamento Europeu para se candidatar a S. Bento dentro de um ano. Entretanto precisou que será candidato a primeiro-ministro; mas se só sair a terminação, deputado será, mas sempre disponível para ministro, talvez da Saúde, lembrou-se. E pode ser do PS ou do PSD, governos que considerará com benevolência. E, logo depois, pode ser candidato a Presidente, se a República o chamar, como decerto não deixará de acontecer.

Como o jornalista o terá inquirido sobre se não estaria a incumprir o contrato recentíssimo com os eleitores, Marinho e Pinto terá disparado a sua desilusão com o Parlamento Europeu e, sobretudo, a sua indignação com as prebendas dos eurodeputados. À pergunta sobre se não o ofendia receber, ele próprio, tão ignominiosas prebendas, terá explicado que não gosta de “caridadezinha” e que entretanto precisa do dinheiro, que lhe dá um jeitão.

O assunto suscitou uma vaga de comentários estivais, como não podia deixar de ser. Marinho e Pinto veio logo explicar ao Expresso a sua surpresa pela polémica, esclarecendo o assunto: de facto, sairá do Parlamento Europeu para manifestar a sua “renúncia das mordomias ignóbeis que são pagas aos eurodeputados, desprezando os povos que representam” (Expresso, 15 agosto), mas só manifestará tal coragem dentro de um ano. Até lá, as ignóbeis mordomias são bem vindas e os povos sofrerão silenciosamente a provação.

Como se apresta a oferecer os seus serviços ou ao PSD ou ao PS, quis o Expresso saber como é que Marinho e Pinto aprecia o que se passa nesses redis e, nomeadamente, se não estaria a fazer o mesmo que António Costa, que deverá abandonar o cargo de presidente da Câmara de Lisboa para outros voos. A resposta foi lapidar (e um tudo nada atrevida, porque dentro de um ano pode estar a negociar com Costa), mas Marinho e Pinto não é homem para deixar dúvidas no ar: “Costa não só despreza o que prometeu aos seus eleitores como faz tábua rasa da legitimidade do mandato dos outros.(…) Representa o tipo de políticos que eu combato” (Expresso, idem). Costa sai a meio do mandato a que se candidatou, desprezível atitude do “tipo de políticos” que Marinho e Pinto quer limpar da política nacional, anunciando fazer exactamente o mesmo. Mas com boas razões, claro está, e com outra elevação.

Surgindo na cena partidária em Janeiro, quando escolheu um partido pelo qual se candidatou com grande êxito ao Parlamento Europeu, Marinho e Pinto sofreu entretanto uma derrota: os Verdes fecharam-lhe a porta, pelas suas pitorescas declarações homofóbicas, e aninhou-se nos Liberais, ou seja, na direita europeia, tendo-se sentido logo à vontade para eleger Juncker contra os candidatos do centro e da esquerda. Aventuras com pouco destaque, em todo o caso, e voltou-se portanto para dentro. Em consequência, veio anunciar desprezar o cargo a que se candidatou – e que ainda mal começou a exercer – mas não deixando de aproveitar as putativas vantagens que abomina, por não mais do que um ano. Tudo é leve, uma vertigem, nas vésperas de se candidatar sucessivamente aos sucessivos lugares electivos que estarão à consideração do país.

Os espectadores desta encenação só podem concluir que não existe ninguém tão adequado para tomar o leme de todos os cargos nacionais como Marinho e Pinto. Que afortunados que somos.

Sem comentários:

Mais lidas da semana