Afonso
Camões – Jornal de Notícias, opinião
Deixem-me
rebobinar dois anos na cronologia de Pedro Passos Coelho: "Este não foi o
Natal que merecíamos. Muitas famílias não tiveram na consoada os pratos a que
se habituaram. Muitos não conseguiram ter a família toda à mesma mesa. E muitos
não puderam dar aos filhos um simples presente".
Quem
assim escreveu, em dezembro de 2012, na sua página do Facebook, foi o mesmo
primeiro-ministro que, ainda agora, na sua mensagem natalícia de há dois dias,
nos veio dizer que "este será o primeiro Natal, desde há muitos anos, em
que os portugueses não terão nuvens negras no seu horizonte". Pelo
contrário, Passos Coelho acena com uma nova fase de "crescimento, de
aumento do emprego e de recuperação dos rendimentos das famílias", com
"o alívio fiscal" prometido pela reforma do IRS, e com "uma
recuperação assinalável do poder de compra de muitos portugueses".
Há
motivos para comemorarmos?
Mais
de um milhão de portugueses aptos a trabalhar continuam sem trabalho.
O
Eurostat veio dizer-nos que a taxa de desemprego está nos 13,1.
Aos
deserdados da fortuna natalícia acresce o número de "desencorajados",
aqueles 5,2% da população ativa que, conforme o Boletim Económico do Banco de
Portugal, desistiram de procurar emprego. Se lhes juntarmos o desemprego jovem
- um em cada três - e os mais de 350 mil portugueses que, nos últimos três
anos, procuraram a sorte na emigração, chegamos então a 2015 com uma taxa real
de desemprego que ultrapassa os 20%.
Ou
seja: um em cada cinco portugueses aptos a trabalhar não encontra emprego em
Portugal, país das maiores desigualdades entre os seus pares europeus. É este o
balanço de três anos de políticas de austeridade. Um triste saldo, agravado
pelo número de casais em que ambos os cônjuges estão desempregados (são já 11
mil, mais sete mil que em 2011), e pelo número de falências de empresas (são
mais de 40 por dia decretadas na primeira instância), que continua a crescer.
A
meses das próximas eleições, há entre os dois discursos de Passos Coelho um
interposto e persistente problema: a realidade portuguesa.
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