José
Sócrates viajou no final de Setembro para Nova Iorque, nos EUA, para se
encontrar – eventualmente tomar um café – com o vice-Presidente de Angola,
Manuel Vicente. Tudo normal entre velhos amigos. Ou não?
Orlando
Castro
As
escutas telefónicas realizadas no âmbito da Operação Marquês, que levaram à
prisão do ex-primeiro-ministro português, mostram José Sócrates e Carlos Santos
Silva a fazerem, à pressa, as marcações da viagem.
Depois
de admitir na entrevista à SIC que telefonou a Manuel Vicente para interceder
pelos negócios do Grupo Lena, num mais do que óbvio acto de despretensiosa
amizade, sabe-se agora que o ex-primeiro-ministro de Portugal, igualmente amigo
íntimo do impoluto regime de Eduardo dos Santos, se encontrou com o
vice-Presidente angolano no consulado de Angola em Nova Iorque , no final
de Setembro.
O
semanário português SOL escreve que a viagem foi marcada à pressa entre José
Sócrates e Santos Silva e surgiu depois de Manuel Vicente lhe ter dito que
estaria na cidade norte-americana. O jornal não esclarece o que é isso de “à
pressa”, o que apenas pode significar um raro sentido de oportunidade, o que –
aliás – é uma característica de Sócrates.
De
acordo com o semanário, as escutas revelam a conversa de José Sócrates em que
terá dito a Manuel Vicente que o Grupo Lena (“pessoas a quem devo atenções”)
estava interessado num concurso público em Angola, na área da construção,
pedindo-lhe então para receber os patrões do grupo e tentando marcar o encontro
em Luanda.
E
onde está o mal? Uma mão lava a outra, as duas lavam a cara. Além disso, em
matéria de lavagem sabe-se que Portugal tem altos profissionais espalhados
pelos principais areópagos da economia e da política mundiais.
No
entanto, Manuel Vicente tinha uma viagem agendada para Nova Iorque, onde iria
representar o Presidente Eduardo dos Santos na Assembleia-Geral das Nações
Unidas, a 30 de Setembro. Fazendo uso do tal sentido de oportunidade, José
Sócrates reparou que – por mera coincidência – também ele e os amigos tinham
compromissos na mesma cidade e na mesma altura. Assim sendo, combinaram o
encontro através do embaixador angolano na ONU.
Dada
a transparência do encontro, terá sido o representante português da ONU, o
embaixador Álvaro Mendonça e Moura, a agendar o encontro no consulado de Angola
em Nova Iorque.
Esta
reunião tinha sido negada por José Sócrates quando foi questionado pelo juiz
Carlos Alexandre após a detenção, mas posteriormente assumida como tendo
acontecido para tratar de assuntos “triviais”. A negação inicial deveu-se
apenas a um mero lapso de memória, isto porque – ao contrário do seu amigo José
Eduardo dos Santos – o ex-primeiro-ministro português não tem poderes divinos.
Na
entrevista dada à SIC, José Sócrates afirmou que intercedeu pelo Grupo Lena
“por mera simpatia e fiz esse contacto com gosto, sem nenhum interesse que não
fosse ajudar uma empresa portuguesa, como, aliás, fiz com outras”.
Tratou-se
pois de um louvável acto de diplomacia económica, a bem dos dois países…
Na
entrevista à RTP, o advogado de José Sócrates, João Araújo, afirmou que a
questão de Angola não tinha “importância nenhuma”. Está bom de ver que os
inimigos do ex-primeiro-ministro estão a empolar a questão por manifesta
ignorância e maldade. Todos sabem que em matéria de transparência negocial, de
luta contra a corrupção e outros crimes similares, tanto Angola como Portugal
são paradigmas.
A
relação de José Sócrates com Angola, segundo aqueles que ainda não perceberam
que o regime angolano é também um paradigma de democraticidade só igualado pela
Coreia do Norte, levanta dúvidas na medida em que pode configurar crime de
tráfico de influências, reforçando ainda os indícios de corrupção e
favorecimento do Grupo Lena.
Estão
errados. Completamente errados. Nunca o regime de Eduardo dos Santos permitiria
tráfico de influência, corrupção e favorecimento. Aliás, essas e outras
maleitas não existem em
Angola. Por alguma razão o país tem um presidente no poder
desde 1979 sem nunca ter sido nominalmente eleito.
Folha
8 Diário (ao)
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