ANDREIA SANCHES e CATARINA GOMES - Público
Pacote
aprovado pelo Governo suscita dúvidas a portugueses que vivem no estrangeiro.
“Não vai levar ninguém a Portugal. É para inglês ver."
“Não
vai ter efeitos concretos.” É esta a reacção de Carlos Pereira, director do
semanário LusoJornal, sediado em Paris, e propriedade da Câmara de
Comércio e Indústria Francoportuguesa, ao anúncio de que o Governo português
vai passar a apoiar empresas que contratem emigrantes desempregados. De resto,
todo o pacote de incentivos ao regresso dos emigrantes aprovado nesta
quinta-feira, em Conselho de Ministros, não entusiasma os representantes das
comunidades portuguesas contactados pelo PÚBLICO.
“Estamos
a vê-los chegar. Chegam famílias inteiras, algumas pessoas estavam no
desemprego em Portugal, alguns tinham empresas em Portugal e vêm ganhar
dinheiro para pagar as dívidas que deixaram”, conta Carlos Pereira. “Se eu
fosse governante investia no país, a dar emprego a quem está no país, para
deixar de pagar subsídios de desemprego.”
Francisco
Silva, presidente da Câmara de Comércio e Indústria Luso-luxemburguesa, também
olha com descrença para os anunciados apoios, que constam do novo Plano
Estratégico para as Migrações. No Luxemburgo, país onde um quinto da população
é portuguesa (cerca de 115 mil pessoas), o desemprego afecta sobretudo pessoas
com pouca qualificação, caso da construção civil e das limpezas, uma população
que considera que não é contemplada em nenhuma das medidas do novo plano.
Mais:
o sistema de apoios sociais a desempregados e a pessoas com baixos rendimentos
no Luxemburgo, e em vários outros países da União Europeia, será sempre mais
favorável do que voltar a Portugal, defende. “Mais vale ficar aqui. São medidas
que terão muito pouco impacto por estas paragens.”
O
mesmo se aplica aos licenciados que cada vez mais chegam ao Luxemburgo. “São
pessoas que se viram constrangidas e emigrar. É um trauma. É um recomeçar de
vida. E agora, vão recomeçar de novo?”
Carlos
Pereira acrescenta, a propósito do VEM — um novo programa que nasce com este
plano estratégico para apoiar portugueses empreendedores que pretendam voltar a
Portugal para lançar projectos de pequena dimensão — “porque é que não
ajudaram estas pessoas a criar microempresas em Portugal” antes de partirem?
Se
alguém lhe pedisse conselho, António Cunha, membro do Conselho das Comunidades
Portuguesas no Reino Unido, dizia: “Não regressem.” Mas ele não vê a emigração,
pelo menos para Inglaterra, como uma maldição, e sim como uma oportunidade,
apesar de admitir que sair do país “não é fácil”.
António
Cunha vive em Inglaterra há 40 anos e vê chegar portugueses cada vez mais
qualificados, informáticos, enfermeiras que estavam desempregadas em Portugal
mas que, em pouco tempo, alcançam estabilidade. “Aqui cresce-se, sobe-se,
realiza-se sonhos, os que já cá estão conseguem atingir objectivos. Se já estão
devem ficar pelo menos três anos”, defende.
Não
lhe parece que alguém regresse com este tipo de medidas. “Não vai levar ninguém
a Portugal. É para inglês ver”.
O
Plano Estratégico para as Migrações (2015-2020) prevê, entre outros: apoios a
encargos salariais e não salariais a empresas que contratem emigrantes
desempregados; permite que emigrantes desempregados em países terceiros possam
ser abrangidos pelo programa Reactivar, que prevê estágios de seis meses para
desempregados de longa duração, com idades acima dos 30 anos, inscritos há pelo
menos 12 meses em centros de emprego; cria o Programa VEM (Valorização do
Empreendedorismo Emigrante). Sobre este último, explicou ao PÚBLICO o
secretário de Estado Adjunto do Ministro Adjunto e do Desenvolvimento Regional,
Pedro Lomba: “O Governo vai facultar às pessoas uma subvenção não
reembolsável.”
Estarão
em causa “verbas entre os 10 mil e os 20 mil euros, máximo, por projecto".
Numa primeira fase, serão apoiados, pelo menos, “40, 50 projectos”.
O
plano do Governo não passa de uma “aspirina eleitoral” inventada à última hora,
disse à agência Lusa Porfírio Silva, membro do Secretariado Nacional do PS,
demonstrando “uma enorme perplexidade” pelo facto de o Governo não explicitar
os meios para a concretização das medidas. “O Governo revela a sua falta de
respeito pelas pessoas que sofreram as consequências das suas políticas”,
acusou ainda.
Já
Pedro Lomba considerou, no final da reunião do Conselho de Ministros, que são
“um pouco exóticos” os comentários que criticam o Governo por não dar números
sobre o financiamento dos apoios que irá distribuir. “Inscrevemos estas medidas
no programa dos fundos europeus. Vamos apoiar emigrantes que desejem voltar a
Portugal, para trabalhar, que desejem empreender. Garantimos o financiamento
destas medidas. Cada Programa Operacional tem dotações globais e estas acções,
como muitas outras acções, serão apoiados por essas dotações globais”,
explicou, quando questionado pelos jornalistas.
Segundo
o Observatório da Emigração, mais de um milhão de portugueses estavam emigrados
nos países da União Europeia e da EFTA (Associação Europeia de Comércio Livre)
em 2011. França, Luxemburgo destacavam-se entre os antigos países de emigração.
Suíça, Reino Unido e Espanha eram os novos países da emigração na Europa.
Com
a descida do número de imigrantes que escolhem Portugal como destino, e o
aumento da emigração, o país está a perder população. Desde 2010 tem-se
verificado uma tendência de decréscimo populacional — menos cerca de 145 mil
pessoas em apenas três anos.
O
Plano Estratégico para as Migrações pretende ir contra este ciclo, com medidas
para atrair imigrantes qualificados, integrar os que já cá estão e recuperar
alguns dos portugueses que saíram. O Governo chama-lhe “reequilíbrio das
entradas e saídas”.
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