Cristina
Azevedo – Jornal de Notícias, opinião
A
verdade é simples e límpida como são as coisas simples: José Sócrates teve
coragem em recusar a alteração de uma medida de coação que, sob todos os
ângulos do seu bem-estar humano e pessoal, era mais confortável.
Ainda
sem saber se será pronunciado e julgado, José Sócrates apenas eleva a fasquia
da sua defesa e se expõe mais à dureza dos efeitos de uma eventual derrota
nesta difícil averiguação legal por que passa.
E
nestas condições agir assim é ter coragem!
Se,
como se pode ler no Comunicado do Ministério Público "subsiste ainda de
forma significativa, o perigo de perturbação do inquérito - de perturbação da
recolha e da conservação da prova - mantendo-se também, ainda que de forma mais
diminuta, o perigo de fuga", perigos esses que poderiam apenas ser
controlados via controlo eletrónico remoto, então assumir a permanência numa
cela fisicamente vigiada, como prova de integridade, é ter coragem!
E
isto é assim, independentemente do desfecho que todo o caso venha a ter. O que,
em minha opinião, torna triste, pouco inspirador e quase cobarde o discurso
público que a propósito nos invadiu.
Nunca
a frase "à justiça o que é da justiça" e "à política o que é da
política" foi tão insipidamente usada. E até mal usada. Porque afinal, que
ato político maior pode haver do que o exercício pleno da liberdade individual
em nome de princípios e convicções que nos deviam pôr a todos a refletir e a
discutir.
Ou
todos os portugueses se sentem confortáveis com um sistema que pode prender até
um ano para investigar, que pode deixar alegadamente mais de seis meses o
arguido sem ter conhecimento do processo?
E,
no entanto, só se ouvem declarações de piedosa inocuidade, como se o tema fosse
incolor, inodoro e pianíssimo.
Eu,
por mim, acho que o tema dá pano para mangas e acho que o ato corajoso de José
Sócrates é uma boa deixa para a discussão.
E
acho também que poderíamos ganhar coletivamente se o discutíssemos com
propriedade.
Pena
é que à direita e à esquerda, um discurso medroso e politicamente correto nos
desmobilize de uma cidadania ativa e responsável, que tenha opinião e não tenha
medo das palavras ou dos atos. E muito menos medo tenha de os adjetivar!
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