Jorge
Heitor* - África Monitor
Na
primeira quinzena deste mês de Julho de 2015, o primeiroministro português,
Pedro Passos Coelho, efectuou uma breve deslocação à Guiné-Bissau, entre o
Trópico de Câncer e o Equador, na África Ocidental, a fim de aí prometer 40
milhões de euros, ao abrigo de um Programa Estratégico de Cooperação delineado
para o período quinquenal que vai até 2020.
Explicou
então o chefe do Governo português que estas verbas se destinam à defesa, à
justiça, à educação, às empresas, à saúde (actualmente tão dependente de
médicos marroquinos), à administração, ao ambiente, à energia e ao
desenvolvimento rural.
Os
40 milhões de dólares idos de Lisboa irão sendo aplicados à medida que os
diversos sectores da vida guineense sejam capazes de os utilizar, se não se
perder muito tempo em questiúnculas entre os diferentes órgãos de soberania,
como tantas vezes tem acontecido.
Pedro
Passos Coelho fez-se acompanhar, além da mulher, Laura Ferreira, de origem
africana, pelo ministro dos Negócios Estrangeiros, Rui Machete, cujo homólogo,
Mário Lopes Rosa, se encontra proibido pelo Ministério Público, de se ausentar
da Guiné-Bissau, por alegado envolvimento em venda ilícita de licenças de
pescas, durante o Governo de Transição que se seguiu ao golpe de estado de
2012.
A
situação de Mário Lopes Rosa, antigo ministro das Pescas, e os projectos de uma
remodelação governamental dizem bem dos constantes problemas que se deparam ao
país, entretanto também visitado pelo primeiro-ministro de Cavo Verde, José
Maria Neves.
A
disponibilidade portuguesa, o empréstimo de 24 milhões anunciado pelo FMI, para
a implementação de reformas, e o financiamento de 16,7 milhões de dólares do
Banco Africano de Desenvolvimento (BAD) para a rede eléctrica de uma capital
tantas vezes mergulhada na escuridão são pequenos indícios de que alguém quer
acreditar na solidificação da estabilidade política, na retoma das reformas
estagnadas e na sempre adiada reforma do sector da segurança, entre outros.
Os
problemas de infraestruturas e a pobreza generalizada fazem com que não se
possa lançar precipitadamente foguetes a assinalar o desejável renascimento e
viabilização de um território de 36.125 quilómetros quadrados onde vivem um
pouco mais de 1,6 milhões de pessoas.
Acontece
que, se bem que calma ao longo deste último ano, a Guiné-Bissau continua a ser,
não o esqueçamos, apenas um resquício do velho Reino do Gabu, que por seu turno
pertencia ao império do Mali, dominado pelos mandingas.
Dêem-se
as voltas que se derem, a verdade é que não se trata de um Estado devidamente
enraizado, com 300 ou 400 anos de tradição e com toda a gente a falar a mesma
língua, a ter a mesma cultura.
Se
bem que pelo menos uns 45 por cento dos guineenses se consigam entender num
crioulo próprio, a verdade é que nem sequer um terço da população fala a língua
oficial do país, o português, e que determinadas franjas quase que só se
expressam em balanta, fula, mandinga, manjaco, papel, beafada, mancanha,
bijagó, felupe ou outros idiomas de âmbito regional.
Enquanto
o crioulo não for a língua veicular de bem mais de 90 por cento da população, e
enquanto no mínimo 30 por cento dos cidadãos não conseguirem falar e escrever
correctamente português, não se pode falar de unidade nacional nem de
consolidação do Estado unilateralmente proclamado em 1973.
A
diversidade linguística, cultural e religiosa que se nota na Guiné-Bissau, um
dos Produtos Internos Brutos mais baixos do mundo e, também, um dos piores
Índices de Desenvolvimento Humano fazem com que, ainda durante muito tempo,
tenhamos de ouvir falar dela como uma entidade estatal bastante frágil, ainda
nos seus primórdios.
Faz
hoje 41 anos que o país pediu formalmente a sua adesão à Organização das Nações
Unidas, mas a verdade é que ainda o não podemos considerar adulto nem resgatar
do lote dos mais infelizes ao cimo da Terra. Bissau, Bafatá, Gabu, Bissorã,
Bolama, Cacheu, Bubaque, Catió, Mansoa e Buba são as cidades (em muitos dos
casos mais diríamos vilas) de uma República incipiente, a meio caminho entre o
Trópico de Câncer e a linha do Equador.
*Jorge
Heitor, que na adolescência tirou um Curso de Estudos Ultramarinos, trabalhou
durante 25 anos em agência noticiosa e depois 21 no jornal PÚBLICO, tendo
passado alguns períodos da sua vida em Moçambique, na Guiné-Bissau e em Angola. Também fez
reportagens em Cabo Verde ,
em São Tomée
Príncipe , na África do Sul, na Zâmbia, na Nigéria e em Marrocos. Actualmente
é colaborador da revista comboniana Além-Mare da revista moçambicana Prestígio
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