sábado, 22 de agosto de 2015

Portugal. AS ELEIÇÕES COMO PEQUENA BARAFUNDA



Baptista Bastos – Jornal de Negócios, opinião

Claro que [Maria de Belém] é uma excelente senhora, culta e cuidadosamente serena, mas os seus apoios serão suficientes ante aqueles que se nomearam para estar ao lado de Sampaio da Nóvoa?

Marques Mendes, o comentador da SIC, disse, naquela estação, que Marcelo Rebelo de Sousa vai ser candidato à Presidência da República. Marques bebe do fino e sabe umas coisas que não costuma dizer. A circunstância de ter dito o que disse transformou a afirmação peremptória num evidente facto político. No dia seguinte, e em outra estação, no caso a TVI, o Marcelo não desmentiu, como costuma, nem manifestou grande surpresa. Temos de admitir, pois, que, nesta corrida insana, o Marcelo é mesmo candidato e um candidato respeitável pela popularidade de que desfruta, e pela singularidade das suas posições, embora não seja um afecto de Passos Coelho, que o detesta quase tanto quanto o dr. Cavaco.

Vejamos as coisas: Rui Rio, apesar da agitação que vai no Norte, não é muito conhecido, e muito menos admirado no Sul e no resto. Têm-no como demasiado agitado e truculento, um pouco fora dos eixos no que diz respeito a obediência partidária. E Passos também não morre de amores por ele. Aliás, Passos não é muito dado a morrer de amores, a não ser por Miguel Relvas, a quem deve parte da sua liderança, e a quem, recentemente, apadrinhou a reaparição no PSD. O Marcelo será, portanto, uma hipótese plausível. O homem, na Presidência, seria uma festa (tome-se a expressão como se queira), depois de termos, em Belém, essa alegria dos cemitérios que ainda por lá deambula, como um espectro malfadado.

As coisas parecem, pois, embrulhadas no PSD; mas no PS também não são muito claras. António Costa, depois de um silêncio demasiado cauteloso, lá foi dizendo, numa revista, que tinha grandes simpatias por Sampaio da Nóvoa, assim que surgiu a pública anunciação de Maria de Belém. Ninguém acredita que o Costa não soubesse, desde há, pelo menos, dois meses, que Maria de Belém se preparava para se candidatar. Ora, como o PS não dissera, até então, qual era o candidato oficial do partido, Maria de Belém surgiu, ao mesmo tempo, como a salvação do convento, e como fautor de imensa confusão. Claro que é uma excelente senhora, culta e cuidadosamente serena, mas os seus apoios serão suficientes ante aqueles que se nomearam para estar ao lado de Sampaio da Nóvoa? Não só três ex-Presidentes, como uma lista sumptuosa de grandes figuras da nossa democracia, da nossa cultura e da nossa honra colectiva, o que não é nada despiciendo.

Além do que o PCP anunciou que o nome do seu candidato só será divulgado depois das legislativas, o que é bem visto e calculado como norma naquele partido. Não vai deixar de aumentar a confusão a sentença de Maria de Belém. Mas também se entende: o PS não pode ficar sem candidato, e Sampaio da Nóvoa, represente ou não uma larga fatia da consciência cívica e política portuguesas, não é do PS. Maria de Belém surge, também, como que para sacudir António Costa da indecisão em prolongar o caso. E a candidata é conhecida pelo seu conservadorismo, o que agrada a sectores do PS e à Direita, um pouco alarmados com a firmeza das afirmações de Sampaio da Nóvoa, que não ludibriou o eleitorado dizendo ao que vinha.

E ainda falta contar com os dez outros candidatos que se perfilam para disputar as Presidenciais. Assim vamos e assim veremos. 

*Considerado um dos maiores prosadores portugueses contemporâneos, Baptista-Bastos (Armando Baptista-Bastos) nasceu em Lisboa, no Bairro da Ajuda (que tem centralizado em vários romances e numerosas crónicas), em 27 de Fevereiro de 1934. Frequentou a escola de Artes Decorativas ... VER MAIS

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