Rui Peralta, Luanda
O
Terceiro Mundo nasce com o grito “Liberté ou la mort”, numa insólita ilha do
Caribe, quando os escravos negros de Saint-Domingue, liderados por Toussaint
Louverture e Dessalines, iniciaram uma revolução que com a abolição da escravatura
nas colonias francesas, em 1804. Foi, assim, proclamada a Republica do Haiti
iniciando uma tendência que se espalharia por todo o Caribe e América Latina e
que teria um profundo impacto na concepção de liberdade e de democracia.
No
século XIX e na primeira metade do século XX muitas nações libertaram-se do
domínio colonial, mas foi apenas após a II Guerra Mundial que a “periferia do
mundo” se afirma num novo contexto das dinâmicas externas, conseguindo o
reconhecimento nas Nações Unidas através de uma Resolução da Assembleia Geral
que declarava: “todos os povos têm direito á livre determinação, a determinar
livremente a sua condição política e a prosseguirem livremente ao seu
desenvolvimento económico, social e cultural”. Após esse momento o Terceiro
Mundo passou a ser um projecto. Asia, África e América Latina travariam uma
luta comum pelo reconhecimento dos Direitos Humanos para todos os Povos do
Mundo, contra a desigualdade e a opressão entre países ricos e pobres e pelo
reconhecimento da dignidade e da satisfação das necessidades básicas.
Nos
finais dos anos 70 do seculo XX, surge um projecto político cujo objectivo é
restabelecer as condições de acumulação de capital e de restaurar o poder das
oligarquias, beliscado pelas lutas de libertação nacional e pelos movimentos
sociais que se afirmaram nas sociedades centrais do Ocidente. O padrão ouro foi
abandonado pela Reserva Federal e o projecto Keynesiano, dominante desde o fim
da II Guerra Mundial, tornou-se insustentável. A economia-mundo transformou-se.
A política de pleno emprego foi abandonada e os mercados liberalizados.
As
economias periféricas encontraram-se endividadas e falidas, sendo sujeitas a
implacáveis políticas de Ajustamento Estrutural. O Sul do Mundo perdeu a
capacidade e dissolveu-se. Neste ocaso do projecto do Terceiro Mundo um último
eco de rebeldia fez-se ouvir, a partir de África: o de Thomas Sankara, do
Burkina Faso. Em 1987, na 25ª Conferencia da OUA, em Adis Abeba, Sankara
pronunciou um discurso contundente contra a divida externa de África. A divida
foi denunciada como mecanismo do neocolonialismo, representando o seu pagamento
a morte dos povos africanos. Sankara concluíra que a divida não se poderia
pagar e propõe a criação de uma Frente contra o “Consenso de Washington”.
A
sua voz fez-se ouvir, isolada e Sankara saiu só da Cimeira. Seria assassinado
dois meses depois, num golpe de Estado comandado por Camporé, apoiado pelo
Ocidente.
Pouco
antes da sua morte, na 39ª Assembleia Geral da ONU, Sankara teria tempo, ainda,
de proclamar, “em nome de todos os abandonados”, que ele, “herdeiro de todas as
revoluções do mundo” tinha consciência que para os povos oprimidos “só a luta
liberta” e que estes têm muito a aprender com a “Revolução Americana e Francesa
e com todas as lutas de libertação nacional”.
Foi
o último grito das nações periféricas. Depois disso África mergulhou no
desespero angustiante criado pelo domínio neocolonial e transformou-se na
Quarta Parte do Mundo…
Leituras
aconselhadas
Prashad,
V. Las naciones oscuras. Una historia del Tercer Mundo Ed. Península.
2012 Barcelona.
Galbraith
J.K. Historia de la economía. Editorial Ariel, 1989, Barcelona.
Harvey
D. Breve historia del neoliberalismo Ed. Akal, 2000, Madrid.
Sankara
T. Burkina Faso Revolution: 1983-1987 Pathfinder Press, NY, 2012
Sem comentários:
Enviar um comentário