Rui
Sá – Jornal de Notícias, opinião
Há
20 anos o país assistiu ao início de uma das mais prolongadas lutas laborais de
que há memória, principalmente na sua Região Norte. Os trabalhadores do setor
têxtil (como de outros setores industriais) tinham um horário laboral de 44
horas semanais - 8 horas diárias de segunda a sexta-feira mais 4 horas de
trabalho ao sábado. Em julho de 1996 é aprovada uma legislação que consagra o
horário de 40 horas semanais, o que implicava, em termos práticos, que os
trabalhadores deixavam de trabalhar aos sábados. Naturalmente que as entidades
patronais não ficaram satisfeitas com esta consagração da
"calaceirice" dos trabalhadores. Vai daí, introduziram uma vigarice
na aplicação da lei: as pausas de meia hora que os trabalhadores gozavam ao fim
de 5 horas consecutivas de trabalho (pausas gozadas no interior da fábrica,
muitas vezes no próprio posto de trabalho e que correspondiam a um direito que
vinha de antes do 25 de Abril - e que mais não visam do que permitir o
retempero de forças para aumentar a produtividade para a jornada seguinte) não
contavam para efeito de horário de trabalho! O que significava que, apesar da
consagração legal das 40 horas de trabalho semanais, os trabalhadores teriam
que trabalhar 42,5 horas, sendo as duas horas e meia adicionais trabalhadas ao
sábado. Iniciou-se aí uma luta, com greves, marchas, vigílias e concentrações
que contou com a solidariedade ativa de muita gente que não era afetada
diretamente pela situação e que durou 65 semanas!
Período
após o qual se chegou a um acordo com a consagração de que essas pausas de meia
hora correspondiam a horário de trabalho efetivo, pelo que foram aplicadas as
40 horas e o fim do trabalho ao sábado.
Se
recordo esta luta é porque a mesma assume um particular relevo quando estão em
causa as 35 horas/semana na Administração Pública. E a primeira questão é que
falamos da reposição das 35 horas e não de um novo direito. Direito que o
Governo PSD/CDS tinha retirado, fazendo com que os trabalhadores da
Administração Pública (e também da Administração Local) vissem reduzido os seus
vencimentos, para além dos outros cortes, em 14%!
Os
que procuram escamotear esta situação dizem, agora, que a situação do país não
permite estes "luxos" de jornadas de 35 horas... Mas são os mesmos
que defendem que o país se pode dar ao luxo de pagar muitos milhares de milhões
de euros com dinheiros públicos para "salvar" bancos que, depois,
entregámos por tuta e meia a grupos estrangeiros e nacionais (não é, Sr. Miguel
Relvas?).
Outros
dizem que não é "justo" que os funcionários públicos tenham um
horário de 35 horas enquanto os trabalhadores do setor privado têm um horário
de 40 horas. Aqui estou de acordo, mas o meu ponto de vista é inverso: tal como
há 20 anos foi consagrado o direito de os trabalhadores do privado passarem de
44 para 40 horas, talvez esteja na altura de fazer uma nova redução,
equiparando-os aos horários da Administração Pública.
Naturalmente,
tal como aconteceu na altura, as entidades patronais dirão que não aguentam. Eu
direi como o outro: Ai aguentam, aguentam! Porque a competitividade tem que se
basear na produtividade e não na mão de obra barata - objetivo maior do
prolongamento da jornada de trabalho.
*Engenheiro
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