segunda-feira, 28 de março de 2016

Portugal. Governo quer penalizar empresas que promovam trabalho precário



Tema ainda vai ser discutido em concertação social, mas a ideia é aumentar os contratos sem termo e reduzir a despesa do Estado em políticas ativas de emprego

Combater a precariedade do mercado de trabalho é uma das palavras de ordem do governo. Penalizar as empresas que continuam a apostar neste tipo de contratação é uma das soluções apontadas ao i pelo secretário de Estado do Trabalho, Miguel Cabrita, que dá como exemplo a hipótese de diferenciar as contribuições dos contratos sem termo dos contratos com termo, tornando as contribuições destes últimos mais agravadas. “São matérias que terão de ser discutidas em concertação social: se é uma penalização, se são benefícios, ou se é uma articulação entre benefícios e penalizações. Este tipo de lógica é algo que ainda vai ser discutido com os parceiros sociais. O que é importante é aumentar os contratos sem termo”, salienta.

Esta é uma das respostas do executivo para fazer face aos últimos dados revelados pelo Instituto Nacional de Estatística: existem 687 300 trabalhadores por conta de outrem com contratos a termo. Já o ministro Vieira da Silva lembra que, nos últimos três meses, apenas cerca de 20% dos novos contratos de trabalho são permanentes. Ou seja, 80% desses contratos são a prazo.

De acordo com Miguel Cabrita, é impensável continuar a manter esta lógica no mercado de trabalho. “Não podemos continuar a correr este risco porque algumas empresas usam excessivamente estas formas atípicas de emprego, criam percursos precários às pessoas e todos nós, empresas e trabalhadores, temos de estar a pagar esse fardo. Com a agravante de que as políticas ativas de emprego que têm sido usadas nos últimos anos não são sustentáveis financeiramente.”

Orçamento despesista O governante lembra que, em 2014 e 2015, a despesa da política ativa de emprego rondou os 800 milhões de euros, que é um valor considerado “insustentável” neste Orçamento e a curto prazo. E dá como exemplo o que se verificou em 2012, altura em que aconteceram muitos despedimentos e dificuldades no mercado de emprego e em que a verba para este tipo de investimento se fixou nos 400 milhões de euros. “Em pouco mais de dois anos duplicou-se o valor e, ao mesmo tempo, bateu-se recordes tanto na taxa de desemprego como no valor despendido. Nunca se tinha gasto tanto dinheiro nesta área”, salienta.

Para este ano, o responsável admite que o orçamento das políticas ativas de emprego vai manter-se elevado por já existirem muitos compromissos assumidos, como estágios em curso. No entanto, a ideia é reduzir esses valores a partir de 2017. Ainda assim, o secretário de Estado reconhece que “ainda há muita gente e isso é prova de que o mercado de trabalho não está com a dinâmica que eventualmente se desejava. Se não tiver essa política ativa de emprego, se não tiver formação, ficarão um pouco abandonados à sua sorte porque, nos últimos anos, a criação de emprego foi muito sustentada com este tipo de programas”.

Criar emprego Um dos objetivos do governo é criar condições para fomentar a criação de emprego. Miguel Cabrita lembra que “nos últimos anos, assistiu-se a uma recuperação dos indicadores do mercado de emprego, mas que foram associados ao fenómeno da emigração, que retirou pessoas da população ativa e fez baixar os números do desemprego, das pessoas que foram desencorajadas de procurar trabalho porque achavam que não iam encontrar e, por outro lado, das questões da política ativa de emprego”, salienta ao i.

Daí a preocupação, no entender do responsável, de construir um melhor equilíbrio no mercado de trabalho a favor de relações mais estáveis e duradouras, nomeadamente favorecendo os contratos de trabalho permanentes por contraponto a outras formas de trabalho. “Há aqui uma opção política e ideológica de favorecer um mercado de trabalho com um peso maior nos contratos permanentes, em desfavor dos contratos a prazo, dos recibos verdes e de outras formas mais precárias. Mas também uma questão económica e financeira para o próprio Estado, porque os contratos sem termo são aqueles que tendem a sobreviver mais”, diz.

Isto significa, no entender do secretário de Estado, que ao incentivar-se a criação de trabalho de forma mais permanente, além de defender as pessoas, porque estão a ser criadas condições para que tenham horizontes mais sustentáveis, estão também a ser criadas condições para a própria sustentabilidade da Segurança Social. “Estamos a criar condições para que as pessoas não voltem mais tarde ou mais cedo a precisar de apoios do Estado, a precisar de subsídios de desemprego, a precisar de recorrer às políticas ativas de emprego, que custam muito dinheiro e não são sustentáveis da forma como estavam até agora a ser praticadas.”

Apesar desta prioridade, Miguel Cabrita admite que é importante manter as formas mais flexíveis de trabalho e que essa realidade é reconhecida na própria legislação. Mas deixa um recado: “O risco é que elas se transformem num beco sem saída, em que as pessoas estão envolvidas nesta situação de uma empresa para a outra, sem conseguirem ter uma oportunidade justa e mais sustentável.”

Sónia Peres Pinto – jornal i - Foto: Miguel Silva

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