Rui Peralta,
Luanda
De
10 a 18 de Julho, em Kigali, Ruanda, decorreu a 27ª Cimeira da União Africana.
O regresso de Marrocos á organização foi um dos temas quentes desta Cimeira,
caracterizada por não ter elegido a nova presidência para a Comissão Africana.
No
discurso de abertura, o presidente chadiano Idriss Déby Itno, presidente em
exercício da UA, pediu um minuto de silêncio em memória do secretário-geral da
Frente Polisário e Presidente da Republica Árabe Saariana Democrática (RASD),
falecido em finais de Maio. Este gesto de respeito para com a RASD foi notável
e constituiu uma mensagem importante para Marrocos, que pretende regressara á
família africana, depois de se ter retirado há 32 da OUA (antecessora da UA),
em protesto pelo reconhecimento, por parte da OUA, da RASD.
O
rei Mohammed VI, de Marrocos, enviou uma mensagem á Cimeira apelando a que se
corrija um “erro histórico” e que se adopte “uma neutralidade construtiva” sobre
a questão do Saara Ocidental, ao mesmo tempo em que considerava que tinha chegado
o momento de Marrocos reocupar o seu “lugar natural” no seio da “família
institucional” africana. Esta mensagem é simultânea com a moção subscrita por
28 Estados-membros (Chade e Senegal á cabeça), que propõe a suspensão da RASD
até que a ONU resolva o problema do Saara Ocidental, abrindo as portas á
reentrada de Marrocos e esquecendo que é Marrocos, e não o conjunto dos Estados
africanos, que tem de rever a sua posição em relação á RASD. Marrocos mantém
uma ocupação colonial sobre o Saara Ocidental desde 1975 e boicota, desde 1991,
a realização de um referendo sob a égide da ONU, que possibilitará ao povos do
Saara Ocidental pronunciar-se sobre a questão da independência. É curioso que
os actores visíveis desta manobra contra a RASD sejam os aliados periféricos,
económicos e militares - com o Chade e o Senegal, duas peças fundamentais da
política neocolonialista de Paris – dos interesses da NATO, que correm, assim
em socorro de um outro estratégico e periférico aliado da França, suportado
pelos USA, o reino de Marrocos.
A
Cimeira abordou, também, a questão dos direitos humanos em África (com um
particular foco nos direitos das mulheres e sua situação no continente). Mas
nesta abordagem não entrou os direitos dos homossexuais masculinos, lésbicas e
transsexuais, nem foi discutida a descriminação sexual em países como o Quénia,
Camarões, Uganda, Egipto, Tunísia e Zâmbia, que praticam exames ao ânus como
prova de acusação em tribunal, de relações homossexuais. Também não foi
referido nenhum comentário ou acusação ao facto de alguns parlamentos africanos
(como no Quénia, Zimbabwe e Uganda) estarem a preparar legislação para que a
homossexualidade seja inserida no combate ao terrorismo e condenada como crime
contra o Estado. Estas violações permanentes á Convenção Africana para os
Direitos Humanos e dos Povos continuam, assim, perpetuadas com a anuência (por
ausência de discussão e de medidas) da UA.
Os
conflitos armados (Sudão do Sul, Somália, Líbia, RCA, Mali, Burundi, RDC), a
integração económica do continente, questões ligadas com o financiamento e
sustentabilidade da UA e orçamento para 2017, foram outros assuntos discutidos.
Não foi eleita a nova presidência da Comissão da UA, pois nenhum dos três
candidatos conseguiu os dois terços necessário dos votos para a sua eleição,
tendo o mandato da actual presidente, a sul-africana Nkosazana Diamini-Zuma,
sido prolongado por mais 6 meses.
Um
passo importante e significativo foi dado com a entrega, aos mandatários á
Cimeira, dos primeiros passaportes electrónicos emitidos pela UA. O projecto do
passaporte africano representa a firme convicção de que é possível criar uma
África Unida, próspera e forte, integrada e impulsionada pelos seus cidadãos. O
passaporte da UA permitirá que os cidadãos possam viajar pelo continente sem
necessitarem de vistos, pretende ser uma realidade em 2020.
No
final da 27ª Cimeira da UA ficou patente a encruzilhada que o continente
atravessa. A luta por uma África Livre, Próspera, Democrática e Independente,
assente numa de cultura de Paz, torna-se cada vez mais premente, perante as
ofensivas do campo imperialista e dos sectores internos agenciados pelo
neocolonialismo. Por cumprir estão os anseios profundos das lutas de libertação
e os objectivos que conduziram às independências. As derivas políticas e
económicas a que o continente é permanentemente sujeito, as políticas
oligárquicas neocoloniais e as suas derivações macroeconómicas neoliberais
entram cada vez mais em rota de colisão com as visões progressistas da
África-Futuro.
Prossigamos,
então, firmes e consequentes na construção da Unidade Africana.
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