Líder
da RENAMO acha que a crise financeira que Moçambique atravessa pode ser
ultrapassada desde que o Governo da FRELIMO mostre boa vontade. Mas acabar com
a guerra é a solução principal, defende Afonso Dhlakama.
Está
desde esta quinta-feira (01.12.) em Maputo uma missão do Fundo Monetário
Internacional (FMI). O objetivo é iniciar conversações sobre um novo programa.
De lembrar que em abril passado esta instituição de Bretton Woods suspendeu a
ajuda a Moçambique na sequência da descoberta de dívidas ocultas contraídas por
empresas, mas garantidas pelo Estado moçambicano, avaliadas em cerca de 1,2 mil
milhões de euros. Na última missão do FMI ao país, em junho, a sua equipa de
trabalho constatou progressos por parte do Governo na gestão do caso. Numa
conversa recente com Afonso Dhlakama, líder do maior partido da oposição
(RENAMO), a DW África ouviu também a sua opinião sobre o assunto.
DW
África: A economia moçambicana está em crise e as consequência disso já são
visíveis com aumentos dos preços e a desvalorização da moeda. Há muito
descontamento no seio da população, inclusive da classe média. Qual é a sua
expetativa em relação ao desfecho deste caso que está a opor o Governo
moçambicano e o FMI?
Afonso
Dhlakama (AD): É uma pergunta muito difícil, mas eu vou responder porque
sou moçambicano, nasci, estudei e cresci aqui, conheço a situação. Tudo tem
solução se de facto existir boa vontade do lado da FRELIMO. Por exemplo,
estamos a falar da dívida, não é a dívida responsabilidade do Estado
moçambicano, é a dívida das pessoas conhecidas que foram buscar dinheiro nos
bancos lá na Suíça, na Europa, comprando coisas. E as assinaturas [dessas
pessoas] estão lá nos bancos. Portanto, aqui há uma mistura de coisas, mas o
Fundo Monetário Internacional quer fazer uma auditoria para identificar as
pessoas [responsáveis] e ver as medidas e os governantes já aceitaram
isso. Mas há várias vozes contra, mas é esta a forma de incentivar o
FMI a voltar a acreditar neste país, que se chama Moçambique. Sobre este
assunto, podem até a Europa e os amigos da cooperação internacional
sentirem e começarem a entrar em massa, não digo para perdoarem a dívida,
[porque] os responsáveis pelas dívidas serão punidos e responsabilizados, mas
digo que as empresas europeias e americanas iriam confiar de novo em
Moçambique. Tudo isso passa pela paz, só assim se pode incetivar o
investimento. Por exemplo, a moeda está desvalorizada porque não há produção.
Moçambique sobrevive de mão estendida, não há exportações e por isso a moeda
não é forte quando o país é alimentado de fora. É preciso produzir, haver
empresas a produzirem, que o turismo, a agricultura, a indústria, pesca etc
sejam dinamizados para que, de facto a moeda volte
a ganhar o seu valor. Agora, não quero puxar a sardinha para a minha
brasa, penso que a solução, em primeiro lugar, é acabar com o conflito
armado, haver uma reconciliação nacional. A FRELIMO aceitar que haja
instituições do Estado fortes, e não instrumentos do partido FRELIMO, que haja
um Estado de Direito e uma alternância governativa. É isso que o mundo quer
ver, porque garante os investimentos. Mas se a FRELIMO quiser continuar a andar
devagar com a guerra porque tem medo que com a estabilidade no país esses
outros podem ser levados para a prisão... porque estão com medo,
enquanto existir a guerra eles continuam camuflados, mas estamos a fazer
pressão.
DW
África: Sob o ponto de vista social que reações espera a médio prazo,
principalmente no meio urbano? Acha que as pessoas vão sair a rua ou que se vão
acomodar? Porque a dificuldade de acesso a comida e outras coisas é muito
grande e crescente...
AD: Não
é tão fácil como na Alemanha, França, Portugal ou EUA. É que as instituições em
si não incentivam que a sociedade civil possa fazer manifestações, de facto,
que pressione o regime. Podem fazer uma marcha silenciosa, mas a manifestação
em que se proferem duras palavras não acontecem porque as pessoas sabem que
levam tiros, sabem que morrem e ninguém quer morrer. Por isso não acredito que
a manifestação seja a solução para o caso de Moçambique. A solução é o fim
da guerra para as pessoas começarem a andar e a comercializar produtos nas
zonas reconditas e rurais para que estes possam chegar aos centros urbanos e
aos poucos a situação irá mudar. Continuo a dizer que Moçambique sem guerra,
com boas políticas económicas e com investimentos este país pode ser um dos
mais ricos da região da África Austral, porque tem recursos que ainda não foram
explorados.
DW
África: Há uns tempos falou-se que os comboios da Vale eram usados para
transportar armas das Forças de Defesa e Segurança de Moçambique e que a RENAMO
terá intercetado esses comboios e se apoderado das armas. Confirma?
AD: Não
chegamos a apoderar, só assustamos um pouco e eles com medo pararam, já não
circulam, isso confirmo.
DW
África: Mas eles transportavam armas?
AD: Não
é fácil ver uma arma ser transportada. Qualquer regime poderia fazer isso, mas
seria prejudicial. Os comboios dos brasileiros que carregam carvão de Moatize
quer para o porto de Nacala quer para a Beira, [podem] fazer isso. Porque isso
dá mais força ao regime para continuar com a guerra porque pensa que tem
aliados que carregam material nos comboios. Aí a RENAMO não perdoou e
assustou um pouco e os comboios pararam, já nem estão se quer a carregar
os camiões, só um ou outro.
Nádia
Issufo – Deutsche Welle
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