João
Miguel Tavares*, opinião
Neste
momento já só resta uma solução para a Caixa Geral de Depósitos: contratar um
exorcista. Após o sulfuroso folhetim de António Domingues, eis que no mesmo mês
em que é suposto Paulo Macedo tomar finalmente conta da Caixa vem o antigo
presidente do INEM Paulo Campos acusar o antigo ministro da Saúde de lhe ter
dado ordens, em Maio de 2014, para integrar e promover a irmã de Paulo Lalanda
e Castro no instituto a que presidia. São acusações graves, feitas de viva voz
numa entrevista à TVI, que Paulo Macedo já desmentiu em comunicado. Paulo
Campos afirma ter anotações em formato digital, tomadas na reunião de 2014, que
comprovam o que diz, e que entregou à PJ para que perícias informáticas possam
confirmar a data do registo.
Há
mais. O Correio da Manhã de ontem diz ter uma segunda fonte, descrita
apenas como “conhecedora do processo”, que confirma o pedido de reintegração no
INEM de Helena Lalanda e Castro. Essa fonte afirma, contudo, que as intenções
de Macedo eram, nas palavras do jornal, “as melhores”. O objectivo do ministro
seria retirá-la da Administração de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo, onde estava
a trabalhar com Luís Cunha Ribeiro, actualmente em prisão preventiva por graves
suspeitas de corrupção no caso Máfia do Sangue. Existem ainda escutas
efectuadas no âmbito da Operação Marquês onde José Sócrates diz a Paulo Lalanda
e Castro que lhe havia sido “assegurada a colocação de uma pessoa de confiança
num lugar estratégico” do INEM, presidido por Paulo Campos. Quem “assegurou”
tal coisa? Paulo Campos não será: em Março de 2015, a imprensa noticiou a sua
recusa em almoçar com José Sócrates quando este trabalhava para a Octapharma.
Convém
esclarecer que Paulo Campos, presidente do INEM, nada tem a ver com Paulo Campos,
ex-secretário de Estado das Obras Públicas, a não ser nas tangentes a José
Sócrates e numa certa predisposição para confusões. Paulo Campos, o do INEM,
foi afastado do cargo por causa de um estranhíssimo caso de utilização de um
helicóptero para transportar uma doente alegadamente sua conhecida, acabando
acusado de “violação do princípio de interesse público”. Campos queixou-se, na
altura, de estar a ser alvo de um “processo conduzido politicamente”, ou seja,
de que o caso do helicóptero era uma mera desculpa para o afastar do INEM.
Agora, nas declarações à TVI, ele foi mais longe, relacionando directamente a
sua saída com a recusa em promover a irmã de Lalanda e Castro a um cargo de
direcção no instituto, supõe-se que do estratégico departamento logístico. O
processo disciplinar contra Campos foi aberto quando Paulo Macedo estava à
frente do ministério da Saúde, mas ele foi demitido já na vigência do actual
governo, em Fevereiro de 2016.
Se
por esta altura o caro leitor ainda não tiver um nó nas sinapses, dou-lhe os
meus sinceros parabéns. Não é fácil acompanhar este caso, o percurso de Lalanda
e Castro e todas as suas ramificações, numa linha ínvia que já vai de José
Sócrates a Paulo Macedo, cruzando esquerda e direita, porque quem faz negócios
com o Estado não costuma ser esquisito na selecção ideológica dos seus
parceiros. Debaixo de toda esta complexidade, contudo, estão acusações de
grande gravidade, que todos os envolvidos deveriam fazer um genuíno esforço por
esclarecer antes de Macedo entrar na Caixa Geral de Depósitos. A Caixa já tem
preocupações que chegue, e dispensa com certeza vir a ser atingida pelos
salpicos da Máfia do Sangue.
*Jornalista,
Público
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apontado na Máfia do Sangue – Portugal - Correio
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