Afonso
Camões* - Jornal de Notícias, opinião
Um
certo dia, passando revista às nossas tropas, milicianas e pouco disciplinadas,
o general comentou: "Não sei se meterão medo ao inimigo, mas a mim
fazem-me estremecer". O desabafo é atribuído ao duque de Wellington, um
dos estrategos britânicos que comandaram a resistência portuguesa às invasões
napoleónicas. Diante de uma ameaça, é dos clássicos que até por medo somos
capazes de matar só para não morrer. E hoje, é caso para estremecermos? Estamos
mesmo à beira de um novo conflito global?
A
inquietação é tão mais premente quanto se sabe que desde o final da Guerra Fria
que não se vendiam tantas armas no Mundo. A revelação consta de um relatório do
Instituto Internacional de Investigação para a Paz, com sede na Suécia, um país
tradicionalmente neutral, mas que, sete anos depois de ter acabado com o
serviço militar obrigatório, volta agora a convocar os seus jovens para a
tropa. Primeira incorporação já a partir de junho. E aos suecos juntam-se os
noruegueses e finlandeses no desejo de aderirem à NATO, o que, a acontecer,
alteraria profundamente a geopolítica dos últimos 70 anos. O pretexto destes
três países, entre os mais progressistas da Europa, é a vizinhança russa e a
sua histórica ambição imperial, no acesso e controlo do Báltico e agora também
sobre os recursos do Ártico.
Inquieta-se
meio Mundo quando Donald Trump anuncia o reforço do orçamento militar americano
em 9%. Nada de diferente, afinal, do que estão a fazer os maiores falcões da
outra metade, da Alemanha à China e ao Japão, onde o orçamento de defesa cresce
há cinco anos consecutivos. Coisas da guerra: do Iraque ao Afeganistão, se há
coisas que os americanos descobriram nos atoleiros em que se meteram nos
últimos anos é que é mais fácil e muito mais barato conquistar militarmente um
país do que, a seguir, tentar pacificá-lo, reconstruí-lo e governá-lo. Se
alguma coisa aprendemos destas guerras e das suas 250 mil vítimas é a
necessidade de evitá-las, algo que só a diplomacia (que não parece ser o forte
de Trump) pode evitar. E como lhe recordaram há dias os seus generais, a ajuda
ao desenvolvimento, cujo orçamento ele também quer cortar, é fundamental para
garantir a segurança. É ignorância confundir valor e preço. E mais ainda
confundir segurança e defesa. Historicamente, os aumentos massivos dos
orçamentos militares foram sempre o prelúdio de um conflito. E das guerras do
presente apenas podemos saber como começam. O Papa Francisco disse há dias, em
entrevista, que a nova já começou: "Estamos na Terceira Guerra Mundial,
aos bocadinhos". Deus nos livre!
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