NÃO
PÕE AS MÃOS NO LUME POR ZEINAL BAVA, NA PT/OI. NEM SABE SE É CORRUPTO
Murteira
Nabo não pede a demissão do Governador mas aponta-lhe o dedo no caso do BES e
diz que ele devia ter atuado mais cedo.
Decisões
erradas e tardias. É assim que Francisco Murteira Nabo, o novo membro do
conselho consultivo do Banco de Portugal avalia a atuação do Banco de Portugal.
No caso BES, como em vários outros casos que abalaram o setor financeiro.
"Não foi uma inabilidade, foi uma opção", afirma Murteira Nabo quando
confrontado com a forma como Carlos Costa geriu o dossier Espírito Santo. O
atual presidente da Câmara de Comércio Luso-Brasileira, diz que, se estivesse
no lugar de Carlos Costa, teria agido de forma diferente e "não teria
deixado a situação apodrecer tanto".
Foram,
opções, lembra Murteira Nabo, que levaram, também, à criação do Fundo de
Resolução e, neste, como noutros casos, Murteira Nabo considera que Carlos
Costa andou mal porque "era uma opção arriscada, que nunca tinha sido
testada".
Entrevista
a Murteira Nabo na íntegra
Como
presidente da Câmara de Comércio Luso-brasileira, o que é que antecipa nas relações económicas entre os dois países?
Precisamos
aumentar esta relação, que nunca foi muito grande. Teve um período áureo na
década de 90, quando a PT, EDP, Jerónimo Martins e Sonae foram para o Brasil.
Muitos destes projetos não correram bem e houve um retrocesso. Neste momento,
perante a crise brasileira, não há grandes investidores portugueses no Brasil,
há é muitas PME, são cerca de 600, mas que representam no seu conjunto apenas
1% a 2% das exportações para o Brasil.
O
caso "carne fraca" vai prejudicar a confiança entre os países?
Vai,
com certeza. O Brasil é um dos maiores exportadores do mundo de carne bovina.
Vai dificultar muito a imagem do Brasil, pois percebe-se que há ali um sistema
de corrupção ou próximo da não certificação.
Falando
agora de banca. Após os casos BPN, BPP, BES, CGD, que reflexão deve o sector
fazer?
Cometemos
um erro: quando detetámos que a banca estava cheia de imparidades, que o país e
as empresas estavam endividados, não fizemos o que fez a Irlanda e Espanha, que
foi criar um banco mau.
Diz
"cometemos um erro", a quem se refere: Governo, Comissão, Banco de
Portugal?
Foi
o Banco de Portugal e o Governo. Ao não fazer isso, empurrámos o assunto com a
barriga, convencidos que se resolveria. Mas não resolveu, e o que aconteceu foi
termos bancos a cair ao longo dos tempos. A minha experiência como gestor é que
problemas complicados resolvem-se logo, não se adiam, porque sai sempre mais
caro e é pior. A banca tem de resolver o problema das imparidades e libertar os
bancos de coisas que não podem resolver. É um pouco como a nossa dívida: temos
de resolver este problema, não a conseguimos pagar.
A
dívida deve ser negociada?
Sim,
temos de negociar, não é uma questão financeira, é uma questão política. Toda a
gente sabe que não temos capacidade para pagar a dívida. E não somos só nós,
mas os países mais débeis sofreram porque não houve o princípio da
solidariedade entre os países.
Há
falta de coragem política do PS em assumir o que refere?
Acho
que não é falta de coragem, acho que o PS está à espera do momento em que haja
condições políticas para o fazer.
Esse
momento pode demorar?
Pode
demorar uns tempos, sim, depende da Europa que vamos ter. Se a Europa se
esfrangalhar, então vai demorar mais tempo.
Disse
numa entrevista, a propósito do BPN e BES, que a supervisão não tinha
funcionado. E hoje, continua a não funcionar?
Não
funcionou ao nível da supervisão bancária e não funcionou ao nível da
supervisão das empresas. As auditorias não funcionaram, passaram a fazer-se
auditorias contabilísticas e não de risco. Portanto nada funcionou em termos de
supervisão... Acho que hoje a supervisão já aprendeu, e que, necessariamente,
teve de corrigir.
Aprendeu
pré ou pós Banif?
Acho
que aprendeu antes do Banif, mas só agora se estão a tomar medidas de correção.
Há um erro que fazemos na supervisão, que aprendi na China: ou se é um
centralizador e se controla tudo, ou descentralizamos, e ao fazê-lo não podemos
descentralizar a responsabilidade. As competências delegam-se, a
responsabilidade nunca. Ao não delegar a responsabilidade tem de controlar, tem
de supervisionar, se não fica dependente do operador. Portanto, em Portugal
delegaram-se competências e não se supervisionou as responsabilidades e foram
apanhados por isso.
A
que nomes atribui o erro?
Não
são nomes, são instituições. Foi o Governo, foram os próprios bancos e foi o
Banco Central. Foram os europeus, foram os decisores, foi o Banco Central
Europeu.
Desiludiu-se
com António Costa?
Não
estou desiludido com António Costa, acho que estamos a empurrar com barriga
alguns problemas estruturais, que não se podem resolver ou não se querem
resolver. Não vale a pena pensar que há milagres na economia, pois não há.
Costa está à procura do momento para o fazer, ele ou o Governo, seja ele quem
for. Se alterações não forem feitas o problema subsiste.
Foi
nomeado para o cargo de vogal do conselho consultivo do Banco de Portugal pelo
ministro das Finanças. Confia no ministro e no Governador para estabilizar o
sistema financeiro?
Não
falo em pessoas. Confio no Governador e a minha função no Banco de Portugal é
muito pequena, é de aconselhar em certas funções e em certos atos. Estou muito
interessado em ir porque tenho ideias muito claras sobre isso que podem até não
coincidir com as do Governador ou com os outros, mas isso não me incomoda
rigorosamente nada. Acho que foi um erro não termos resolvido os problemas na
época, se calhar era até mais doloroso, mas já estavam resolvidos.
Foi
inabilidade do Governador?
Foi
uma opção, não uma inabilidade.
Isso
pode tornar a resposta mais grave, se foi uma opção...?
Sim,
foi uma opção, como foi uma opção o Fundo de Resolução. E todos sabiam que era
um risco, pois não tinha sido ainda aplicado. E na minha opinião não foi uma
grande solução, porque no fundo não resolveu o problema.
Se
opção não deu resultado, deveria o Governador demitir-se?
Isso
não comento. Agora acho que deve analisar o que tem de concreto para ter
sucesso. Acho que ninguém se sente bem se incomodado ou se não tem as condições
para ter sucesso.
Tendo
em conta GES e BES, o Governador agiu bem ou mal?
A
sensação que temos hoje é que deveria ter decidido mais cedo. Talvez possa
dizer que se eu lá estivesse faria diferente...
Teria
retirado, e cedo, a idoneidade a Ricardo Salgado?
Não
sei se teria tirado ou não, mas não deixava apodrecer tanto.
Conhece
Ricardo Salgado. Desiludiu-o?
Sim,
conheço, fomos colegas de Faculdade. Houve uma mistura explosiva entre um grupo
e o seu acionista e isto deveria ter sido tido em conta pelos decisores e pelos
acionistas do Grupo BES mais cedo. Provavelmente já sabiam que estava assim.
Acredita
na inocência dele?
Não
tenho opinião sobre isso. Somos amigos pessoais, gostava que saísse bem destas
coisas, mas se é responsável ou não, é um assunto que não abordamos.
Está
de acordo com esta nova entidade de supervisão criada pelo Governo, faz
sentido?
Faz,
porque há falta de coordenação. A ideia não é retirar funções ao operador, é
coordenar as entidades que têm que ver com a regulação.
A
imagem que passa é que fragiliza um pouco o Banco de Portugal. Concorda?
É
um órgão como tantos outros, é um advisor, não um decisor, nem um gestor. Acho
que é útil porque a experiência tem demonstrado que não há muita coordenação
entre as várias entidades. Talvez não seja mau que se juntem numa comissão.
Passando
para as telecomunicações, foi muito elogioso no passado quanto a Zeinal Bava.
Como olha para o mesmo gestor hoje, acusado num processo como a Operação
Marquês, e sobre o rumo que a PT levou?
Tenho
uma análise sobre a situação, não com Bava, mas com a estratégia que a empresa
seguiu e foi defendida pelos acionistas.
Acha
que foi responsabilidade da empresa?
Foi
responsabilidade dos acionistas. A partir de 2002, a empresa decide, ao nível
do acionistas, aumentar a política de dividendos, e reduzir a dívida. Ao fazer
isso deixou de investir no Brasil, onde tinha uma empresa, a Vivo, que estava a
crescer 5 milhões de clientes ao ano e onde era preciso investir em rede
digital. A PT que tinha uma relação de 50/50 com a Telefónica, passou a não ser
capaz de satisfazer as necessidades de investimento. Começou então a entrar em
dívida. Há uma altura em que a pressão da Telefónica para comprar a Vivo era
grande, para além da ameaça da OPA à PT. Com a pressão da Telefónica, a
Portugal Telecom, que já estava numa relação de 1 para 10, em vez de 1 para 4
como era o acordo inicial, e se dá mais tarde a OPA da Sonae, não aguentou.
Isto tem a ver com uma estratégia da empresa, uma decisão dos acionistas. Obviamente o gestor também é responsável, mas a decisão é dos acionistas.
Respondendo à sua pergunta a questão não é o Bava; o grupo empresarial PT
definiu estratégicas que a levaram à venda da Vivo. Ora uma empresa que vende
uma subsidiária que representa 60% do volume de vendas e 40% dos lucros, que
tem 55 milhões de clientes, e que fica sem o dinheiro e sem a indústria, o que
é que quer que aconteça?
A
estratégia foi a errada?
Claro,
a estratégia foi errada e o Bava foi apanhado por isso. Se sabia, ou se não
sabia, não sei dizer.
Conhece
bem Zeinal Bava? Metia as mãos no fogo por ele?
Fui
eu que o admiti para a PT, era um excelente profissional. A culpa que ele terá
é de ter aceite a estratégia que foi definida pelos acionistas.
Mas
acredita que seja corrupto?
Isso
não sei, não tenho a mínima noção disso. Agora como gestor, o erro que terá
cometido é ter aceite uma estratégia ruinosa para a empresa. Aí fez a opção de
ficar. Eu fiz o contrário: saí em 2002 quando comecei a sentir isto. A culpa
não é dele, é dos acionistas que decidiram uma política de dividendos altos e
redução dos investimentos. Por isso, a venda da Vivo era inevitável. O
engenheiro Belmiro percebeu isso muito bem: quando fez a OPA à PT queria fundir
a TMN com a Optimus e depois vender a Vivo e fazer o financiamento do seu
grupo, claro. Só que os outros acionistas da PT não são burros e disseram que
em vez de ser ele a fazer a mais-valia, faziam eles. Esta é questão de fundo da
PT, não o Bava, que é apenas uma peça pouco importante neste conjunto.
E
a PT na Altice, parece-lhe estar em boas mãos?
Depende
do conceito de boas mãos. A empresa mudou muito e, portanto, a empresa de
telecomunicações do meu tempo já não existe, é um outro projeto que conheço mal
e não faço ideia onde vai acabar.
Anselmo
Crespo, na TSF - Entrevista
a “passar” na TSF, hoje (sábado) depois das notícias das13:00 horas
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