Inês
Cardoso* | Jornal de Notícias | opinião
Assim
que as projeções deram como certa a passagem de Marine Le Pen à segunda volta
das presidenciais francesas, grupos de manifestantes saíram à rua em Paris,
Marselha e Estrasburgo. Os sinais de protesto são, contudo, em tudo diferentes
dos que há 15 anos mostraram uma França unida contra a surpreendente passagem
de Jean-Marie Le Pen à segunda votação.
Em
2002, o resultado do então líder da extrema-direita, escassas décimas acima de
Lionel Jospin, deixou os franceses (e a Europa) de boca aberta e os jornais
titularam a onda de choque que varreu o país. No 1.º de Maio que se seguiu, 500
mil franceses desfilaram pelas ruas de Paris e poucos dias depois Jacques
Chirac foi eleito com 82% dos votos.
Quinze
anos depois, a expressão eleitoral de Marine Le Pen está longe de constituir
uma surpresa. A Frente Nacional solidificou o seu espaço, com um discurso que
procura limpar os excessos iniciais. Sem que o extremismo, antieuropeísmo e
xenofobia deixem de estar, inteiros, no programa apresentado aos eleitores.
Pela
primeira vez desde o início da V República, a segunda volta não conta com
candidatos oriundos dos partidos tradicionais. E os socialistas são
particularmente punidos, sendo difícil perceber quanto da derrota de Benoît
Hamon nasceu em François Hollande. Se Emmanuel Macron vencer, como indicam
todas as sondagens, será o mais jovem presidente de sempre e o primeiro a
chegar ao Eliseu sem antes ser eleito para outros cargos.
Os
franceses deram um sinal vermelho aos partidos com tradição de poder mas,
estranhamente, é difícil ver nessa mudança uma verdadeira frescura. Como falar
de renovação se candidatos envolvidos em escândalos judiciais conseguem manter resultados
tão fortes como os registados por Le Pen e Fillon?
Nas
sondagens realizadas fora dos Estados Unidos, a popularidade de Donald Trump
foi sempre interpretada com estranheza, com a Europa em peso a chumbar o seu
estilo e as suas propostas. Mas não deixa de ser preocupante que, enquanto
noutros países o exemplo vindo do outro lado do Atlântico travou movimentos
populistas, em França Marine Le Pen tenha beneficiado dessa alavanca.
Por
muito que se proteste nas ruas, é nas urnas que tudo se decide. E o voto em Le
Pen não pode ser menosprezado, como não pode ignorar-se que Trump foi
democraticamente eleito. À exceção de Mélenchon, os candidatos derrotados já se
uniram à volta de Macron, contra a ameaça da extrema-direita. Mas a luta contra
os extremismos e contra o medo é mais profunda e vai para além do dia 7 de
maio. É nela que toda a Europa tem de se concentrar.
*Subdiretora
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