Domingos de Andrade | Jornal de
Notícias | opinião
O que é que ainda não
perceberam? Morreram 65 pessoas na tragédia de Pedrógão. Quatro meses
depois, 48 pessoas perdiam a vida nos maiores incêndios do Mundo, que
devastaram as regiões Centro e Norte do país. Não são números. São mortes. De
pessoas. Não são adjetivos. São substantivos. Com dor. Demoraram as desculpas e
repartiram-se as culpas. Elaboraram-se relatórios e pediram-se contraditórios.
Do que o país precisa agora,
mergulhado no luto de quem sofre ao ralenti, não é de ilusões. É de soluções.
De perceber o que correu mal. Porque correu, ou há dúvidas?, porque o Estado
falhou, ou há dúvidas?, porque há nomes, responsabilidades políticas,
inoperâncias de uma enormidade doentia. Ou há dúvidas?
Do que o país precisa agora é que
se olhe para o relatório da Comissão Técnica Independente e se mude tudo nas
estruturas operacionais da Proteção Civil. O que o país precisa é de reforçar
meios, da prevenção ao combate, de olhar o território não em função dos
calendários sazonais, mas das necessidades reais. De pouco vale proibir
foguetes e fazer festas de artifício, como a que hoje leva os atores da
política ao terreno.
O que é que ainda não
perceberam? O país, nada. Não percebeu nada. E continua sem perceber.
Houve um assalto aos paióis de Tancos. Desapareceu material entretanto
recuperado, e até mais do que o roubado. Suspensões de comandos e recuo nas
suspensões de comandos. A secretária-geral de Segurança Interna a dizer que só
soube do assalto pelos jornais. Uma catadupa de informações contraditórias,
vindas das chefias militares e do Governo. Ora era material importante e que
serviria as redes de terrorismo internacionais, ora não tinha importância
nenhuma. E meses depois um relatório, pedido pelo menos nove vezes pelo
presidente da República.
Conclusões. Do que se sabe,
porque ainda há uma investigação em curso e o que não se sabe estará no segredo
dos papéis. Falha tudo há 20 anos. Não há rondas e ninguém sabe quem manda. Não
há videovigilância. Não há tropas porque acabou o serviço militar obrigatório.
Não há inspeções das Forças Armadas. Não há segurança dos edifícios. Que houve
uns sargentos que não cumpriram bem a missão e que até prestaram falsas
informações. Sabemos também que o Exército, um dos pilares do Estado, saiu
enxovalhado.
O que é que ainda não perceberam? Que
Marcelo Rebelo de Sousa, o presidente-rei, catavento, anestesista, o popular
que irrita os populistas à Esquerda e à Direita, e outros mimos que lhe
dedicam, também criticado nesta coluna sempre que perde o fio da realidade
quando está demasiado imerso em si próprio, é o único garante de alguma
estabilidade social no país.
Às vezes parece, mas ele não
brinca aos estados. Ele é o Estado.
*Diretor-executivo JN | Foto: Paulo Novais/Lusa
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