Martinho Júnior | Luanda
1- Cada vez há mais sinais que a
hegemonia unipolar está a esvanecer-se a contragosto, por que o império não
perdeu o seu carácter arrogante e decrépito, muito menos a aristocracia
financeira mundial que nutre e se nutre dos seus conteúdos de domínio.
A gestão dos desequilíbrios,
imposta através de instrumentos que têm no dólar estado-unidense a sua
principal esteira (em função dos padrões seguidos de há décadas, praticamente
desde a IIª Guerra Mundial), já não pode ser feita nos moldes que foram seguidos“tradicionalmente”: perdida
a equivalência ao ouro, a arrogância tornou-se em si e por si, um convite à
abstinência, à divergência, ou mesmo à completa desobediência dos outros…
A gestão militar, com 800 bases
espalhadas pelo mundo e um cacete disponível em cada esquina, seja por via
de “revoluções coloridas”, seja por via de malparadas “primaveras”,
ao abrirem as portas ao caos, ao terrorismo e à desagregação, estimularam as
resistências em todas e quaisquer transversalidades sociais e “frentes”,
incluindo (parafraseando George W. Bush), nos “mais obscuros rincões do
globo”…
A gestão da própria hegemonia do
império, ao inebriar-se com o “esplendor” da década de ouro do
capitalismo neoliberal, a década de 90 do século passado, esqueceu-se do
potencial que as novas tecnologias permitiam a outros, com respostas de toda a
ordem, capazes até de neutralizar o empertigamento de inteligência e militar,
onde quer que isso se manifeste!...
2- É evidente que esses e muitos
outros sinais, estão a conduzir à perda de capacidade geoestratégica no enorme
continente euro-asiático!...
À impotência para fazer parar a
projecção da rota da seda entre as costas do Pacífico e as do Atlântico,
junta-se agora a impotência para aceitar um comércio justo em relação a um vassalo
que está em vias de o deixar de ser e tudo isso com as grilhetas do sionismo de
Israel, do wahabismo da Arábia Saudita, do tráfico de droga do Afeganistão, do
neofascismo da Ucrânia e outros “derivados” do leste europeu, nos pés
de apoio em equilíbrio instável!
O vigor proteccionista que a
administração republicana de Donald Trump está a procurar vincular em todos os
relacionamentos internacionais (“the americans first”), é por si outro sinal do
esvair da hegemonia, que mesmo assim se arroga à resistência, face às
emergências multipolares e à quebra das algemas da própria União Europeia!
Todos os sinais conjugados vão
contribuindo para que a arrogância não seja levada nos termos de suas
pretensões (lembram-se quando alguém referia que “os Estados Unidos são um
tigre de papel”?) e nem a nível interno há aquele respeito de que se procura
nutrir o poder das poderosas elites barricadas nas casas bancárias que tomaram
de assalto a Reserva Federal (constate-se com o Wikileaks, ou a filtragem
pública de muitos “segredos” do NSA).
O poder do império da hegemonia
unipolar, que foi montado com os artifícios da revolução industrial e da
revolução de novas tecnologias pelo capitalismo ao dispor da aristocracia
financeira mundial, perde qualidade por que, esvaindo-se cada vez mais do real,
está a entrar no campo do virtual sem poder mais sair dele!
O desprezo para com o respeito
devido ao planeta, ao abandonar teatralmente o Acordo de Paris, está a conduzir
a administração de turno para um campo virtual feito de conhecimentos ética e
moralmente degradantes e obsoletos, ou cada vez mais incoerentes, que não
conduzem ao conhecimento capaz de articulações saudáveis de que a Mãe Terra e a
humanidade tanto carecem!
3- Sem recursos suficientes face
às emergências multipolares articuladas, para fazer valer a sua vontade nos
outros continentes e em todos os oceanos da Terra os Estados Unidos estão a
regredir aos tempos da Doutrina Monroe, para se barricarem no vasto continente
americano, de norte a sul, como se estivessem motivados a fazer um percurso
histórico de retorno ao holocausto índio durante a “conquista do oeste”!
Por isso os Estados Unidos estão
a fazer o que melhor sabem desde a projecção do choque neoliberal a 11 de
Setembro de 1973 no Chile: disseminar a subversão por via do caos, do
terrorismo e da desagregação, recorrendo a correntes filosóficas e ideológicas mercenárias
e contrarrevolucionárias servis ao modelo neoliberal, sobretudo contra o campo
das resistências progressistas na América, de certo modo “tirando o pé” ali
onde já está em desequilíbrio.
Esta reversão, no âmbito duma neo
Doutrina Monroe, começou com o golpe de estado nas Honduras, a 29 de Junho de
2009 e, tornando-se crónica, está a procurar destruir, inviabilizar, ou
vulnerabilizar as instituições internacionais progressistas da América Latina e
cada um dos seus principais mentores: Cuba, Venezuela Bolivariana, Nicarágua
Sandinista, Equador, Bolívia…
O domínio hegemónico na América
Latina arrasta por um lado um cortejo de oligarquias vassalas, obstruindo as
instituições democráticas e mantendo-as reféns, por outro promovem caos,
terrorismo e desagregação, conforme os exemplos últimos na Venezuela e na
Nicarágua!
A ameaça duma coligação de forças
se atiçar contra os estados progressistas está a aumentar de intensidade desde
a criação do“grupo de Lima” e entre os sucessos conta com a possível aderência
duma Colômbia devassada pelos clãs da droga à NATO (reforçando o Comando Sul do
Pentágono), ou um Brasil filtrado até à medula do poder de estado, Agência
Brasileira de Inteligência incluída!
Os esforços da Venezuela e da
Nicarágua para garantirem a paz, não se podem resumir assim ao enfrentamento
que resolutamente travam face às oligarquias vassalas dos Estados Unidos, mas
também face às tentativas múltiplas de “golpes de estado brandos” e
ao risco dum embate militar, passando pela contínua desestabilização económica
e financeira de que se tornaram dilectas vítimasnpor vontade do império da
hegemonia unipolar.
A resistências dos progressistas
latino-americanos é a única via de luta e o seu reforço deve ser uma prioridade
para todos os emergentes que se articulam no multipolarismo, pois os Estados
Unidos não podendo impor no mesmo pé a hegemonia unipolar como na década de 90
do século XX, está já forçado, ainda que não o reconheça, à oportunidade de
integrar as múltiplas plataformas multipolares que se vão arquitectando em nome
da paz por todos os continentes!
A fronteira entre a civilização e
a barbárie, está bem nítida nos relacionamentos internacionais!
Martinho Júnior - Luanda, 3 de
Junho de 2018
Fotografias:
Três primeiras fotos: os grandes
lutadores progressistas da América Latina;
As duas últimas fotos foram por
mim tiradas a 7 de Março de 2018, na sala do teatro Teresa Carreño em Caracas,
no fecho do Foro Todos Somos Venezuela.
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