Mais de quatro milhões de
angolanos entre os 15 e os 35 anos continuam sem saber ler nem escrever, sendo
muitos os factores que justificam o elevado número, assumiu a ministra da
Educação de Angola, Maria Cândida Teixeira. Se a estes se juntarem os que da
leitura e da escrita apenas têm uma vaga ideia, ficamos com a perspectiva do
enormíssimo analfabetismo funcional, onde se incluem os que sabem ler e
escrever, mas não lêem nem escrevem.
Maria Cândida Teixeira falava, em
Luanda, após a assinatura de um protocolo de cooperação entre o Ministério da
Educação (MED) e a Igreja Metodista Unida Angola (IMUA), que visa a criação de
turmas de alfabetização nos seus templos da Conferência do Oeste de Angola, que
abarca 12 províncias do país.
A governante reconheceu que
muitos dos problemas vividos na sociedade angolana, como a violência doméstica,
gravidez precoce, criminalidade, prostituição, “entre outros males”, estão
ligados à falta ou à pouca instrução e educação das pessoas.
Por esse motivo, ressaltou, o
sector da Educação pretende implementar os programas contidos na Agenda 2030,
que visa transformar a vida da população através da educação como principal
impulsionadora para o desenvolvimento do país e bem-estar dos cidadãos.
Maria Cândida Teixeira referiu
estar comprometida em estender e melhorar a rede de ensino pelo país, para que
todos cidadãos possam ter acesso a formação académica.
Por seu turno, o assistente do
bispo da Igreja Metodista Unida, reverendo Manuel André, afirmou que o
protocolo tem o objectivo de “redimensionar o combate sem tréguas ao
analfabetismo”.
Salientou que a Igreja Metodista
Unida tem, doravante, o compromisso de transformar os templos em centros de
escolaridade, para ajudar os cidadãos que necessitam de aprender a ler e a
escrever.
Já o especialista de programas da
UNESCO em Angola, Nicolau Bubuzi, lembrou que, actualmente, existem mais de 360
milhões de crianças e adolescentes em todos o mundo que estão fora do sistema
de ensino.
Por outro lado, acrescentou, seis
em cada 10 crianças e adolescentes, o equivalente a 617 milhões de pessoas, não
adquirem as competências mínimas em literacia.
Acrescentou que 750 milhões de
jovens e adultos ainda não sabem ler nem escrever, dos quais dois terços são
mulheres, factores que estão na base da exclusão social, da desigualdade social
e do género.
O memorando, assinado pelo
director nacional do Ensino de Adulto, Evaristo Pedro, e o reverendo Manuel,
prevê que a IMUA disponibilize as turmas e os professores, enquanto o MED vai
responsabilizar-se pela formação dos alfabetizadores voluntários e garantir o
fornecimento do material didáctico e a certificação dos formandos.
“Vira” o ministro, toca o mesmo
Setembro de 2017. O então
ministro da Educação, Pinda Simão, disse, em Luanda, que 25% da população
angolana ainda é analfabeta, mas apesar da crise económica e financeira que o
país enfrenta, 500.000 pessoas estão a ser alfabetizadas em todo o país.
Apesar de pecar por defeito, esta
percentagem de analfabetos é só por si um atestado de incompetência a quem nos
desgoverna há 42 anos. Será que mudar de ministro vai alterar a música, embora
mantendo a letra?
Pinda Simão, que falava em Luanda
por ocasião do Dia Mundial do Analfabetismo, disse que Angola está
“comprometida com uma agenda de educação única e renovada, ousada e ambiciosa”.
Aqui é altura para rir. Falar de
“uma agenda de educação única e renovada, ousada e ambiciosa” é a expressão
exacta de mais uma piada candidata ao anedotário nacional.
O então governante angolano
referiu ainda que, porque 24,7% da população angolana não saber ler nem
escrever, este é um desafio para toda a sociedade, “de garantir que o
analfabetismo não constitui factor de exclusão” para esses cidadãos. O ministro
não sabia o que dizia e nem dizia o que sabia.
Segundo Pinda Simão, devido à
crise económica (antes a desculpa era a guerra agora é a crise) que Angola
enfrenta desde finais de 2014, com a baixa do preço do petróleo no mercado
internacional, não têm sido pagos os subsídios a alfabetizadores e
facilitadores, bem como para a aquisição dos materiais didácticos.
O titular da pasta da Educação
realçou que, apesar das “inúmeras dificuldades resultantes da crise económica,
há uma demonstração clara do espírito de sacrifício, que caracteriza os
alfabetizadores, facilitadores, formadores e todos os agentes envolvidos no
processo”, aos quais reiterou os seus agradecimentos.
Para o então ministro, o desafio
para o futuro “passa pela melhoria da qualidade do processo e a criação de
condições, para que um maior número de alfabetizados possa dar continuidade aos
seus estudos até à conclusão do ensino primário”.
Sobre o lema das celebrações da
data, “Analfabetismo num Mundo Digital”, Pinda Simão disse que deviam ser
objecto de reflexão questões como o tipo e níveis de alfabetização necessários,
num mundo cada vez mais digital, bem como a adaptação dos programas, em termos
de metodologias de ensino e aprendizagem.
O então ministro acrescentou que
as tecnologias podem ser decisivas para um melhor acesso à educação, informação
e conhecimento, tendo assegurado que o Governo adoptou iniciativas no sentido
de acelerar o desenvolvimento com o uso das novas tecnologias.
“A governação electrónica, a
expansão da rede digital no país e o aumento das condições para um maior acesso
à internet são já uma realidade em pelo menos todas as sedes municipais do
país. O projecto de construção de 25 mediatecas enquadra-se nos esforços para
conferir mais cidadania e mais inclusão”, referiu.
Recorde-se, sobretudo a Pinda
Simão, que Angola gastou menos de 2% do total das despesas públicas
orçamentadas para o sector global da Educação, nos últimos doze anos, segundo
um estudo divulgado no dia 29 de Junho de 2017, assinalando que nesse período o
peso da dotação orçamental foi de até 1,72%.
Os dados, apresentados em Luanda,
constavam do estudo governamental sobre os “Custos e o Financiamento do Ensino
Superior em Angola”, realizado por uma consultora portuguesa, que compila o
peso da dotação orçamental dos Ministérios da Educação e do Ensino Superior de
Angola.
Este facto, salienta o documento,
“pode dificultar a realização, pelos órgãos do governo, das acções necessárias
ao crescimento do sistema educativo, em quantidade e em qualidade”.
De acordo com o estudo, no
período em análise, 2004 a
2016, a
dotação orçamental do Ministério da Educação registou um acentuado decréscimo,
a partir de 2008, passando de 1,37% para 0,68% em 2016, enquanto para o
Ministério do Ensino Superior assistiu-se a um crescimento muito acentuado.
“Todavia, o esforço despendido
pelo país com os órgãos de Governo, que tutelam a educação superior e não
superior, revela uma situação que se nos afigura bastante deficitária, quando
se percebe que o total das despesas públicas orçamentadas para esses órgãos não
chega aos 2% do Orçamento do Estado, na quase totalidade dos anos em análise”,
observa.
O trabalho de investigação,
realizado entre Julho de 2016 e Maio de 2017, sublinha que em relação à taxa de
alfabetização, o ritmo de crescimento quase que parou nos anos posteriores à
década de 1990, contrariando os objectivos de desenvolvimento propostos pelas
autoridades angolanas.
O gráfico sobre a taxa de
alfabetização espelha que em 1998
a taxa de alfabetização em Angola cifrava-se em 42% e
que de 2001 a
2015 a
cifra rondou entre 67,4% e 71,2%.
Folha 8 com Lusa