Eugénio Costa Almeida* | opinião
O ano de 2018 reafirmou qual a
geopolítica chinesa, no global, ou africana, no geral, e de certo modo reafirmou
a angolana, em
particular. Ou seja, a China reafirmou-se como uma potência
global, não só a nível económico ou político. Também a nível militar e
aeroespacial se avigorou.
A nível económico, no geral, não
teve problemas em afrontar a potência mundial, os EUA, e a agressiva política
económica de Trump e do “American First”. Uma situação que não se prevê possa
diminuir de intensidade face aos compreensíveis interesses económicos de ambos.
A nível político, e aproveitando
a “ausência” dos EUA no sistema internacional, baseado no asseverar do reforço
económico e social das políticas internas da administração Trump e do
afastamento deste, aliado a algumas ameaças de sanções económicas, de alguns os
cenários mais importantes, principalmente para o Ocidente — leia-se, Europa —
como são as políticas ambientais e a livre concorrência de produtos europeus de
e para os EUA, assim como para outros países e que para o quais os EUA ameaçam
com sanções; bem como uma agressiva política externa pró-israelita e anti-
-establishment, em particular, anti- -iraniana e não-palestiniana, e numa
política de um “não interesse” nas questões africanas — excepto e, na maioria
dos casos, com razão, para criticar os líderes africanos — permitiram à China
ter uma maior penetração na Europa, na Ásia e na América Latina como
solidificar a sua influência em África.
E são estes factos que
sinteticamente procurarei abordar.
Para a Europa criou uma “rota da
seda” para a colocação dos seus produtos e de muito do seu excedente comercial
e financeiro, e, em particular em Portugal, solidificou a sua presença a nível
financeiro, estando presente nas principais empresas portuguesas, nomeadamente
na energia e nas finanças. A recente visita do líder chinês, Xi Jinping, a
Portugal, reforçou essa presença e esse influxo (a vontade de usar o porto de
Sines — o maior e mais ocidental porto da Europa — e a sua prevista ligação
ferroviária de alta velocidade de mercadorias ao heartland europeu são factores
que alimentam ainda mais a atracção dos chineses a Portugal). A investigadora
portuguesa Cátia Mirian Costa, especialista em temáticas chinesas, aborda estes
temas, quer sobre as relações com Portugal, como sobre as ainda debilidades com
que a China padece a nível ecológico, num recente artigo n’O Jornal Económico,
«China, essa desconhecida» (https://jornaleconomico.sapo.pt/noticias/china-
-essa-desconhecida-391715).
Na Ásia e na América Latina mais
do que emerge, reafirma- -se como um parceiro importante, seja a nível
económico — é um comprador firme do petróleo venezuelano — seja a nível
político, com a afirmação do BRICS. Mas na Ásia, e de certa forma, a nível
global, a importância do seu poder sobre Pyongyang levaram a uma aproximação do
líder norte- -coreano, Kim Jong-un, aos seus irmãos do Sul e a um melhor
relacionamento com os EUA, em geral, e com Trump em particular, levando os dois
líderes a se encontrarem em Singapura para um acordo de progressivo
“desarmamento nuclear” na Península Coreana.
Xi Jinping, discretamente, e como
é apanágio chinês — ver a minha “Teoria do Mahjong”, já aqui descrita no Novo
Jornal, na edição 390, de 24 de Julho de 2015, ou no meu livro Of the An
Instrumentality Power to the Mahjong Theory […], edição Lambert Academic
Publishing, de 2015 —, acabou por ser o principal beneficiário desta
aproximação. Como sempre tenho escrito, a Coreia do Norte não consegue
subsistir sem o apoio político, económico, financeiro e científico dos
chineses.
Mas é em África, em geral, e em
Angola, em particular, que a China mais reafirmou a sua presença. Reafirmou e,
mais que reafirmar, impôs-se.
Até há pouco anos, a China
assentava o seu poder militar nas forças terrestres, sobretudo, e aéreas.
Recentemente, e como todos os países oceânicos, percebeu que o poder naval era
importante para se afirmar quer na área e na salvaguarda das suas costas e
áreas marinhas e económicas, como um meio de projecção internacional.
No caso africano, em análise, a
defesa das suas frotas de e para a China estavam a ser postas em causa com os
actos de pirataria tanto na região malaia como, e principalmente, no Golfo da
Áden e no Corno de África, com a pirataria somali. Actos que produziam elevados
prejuízos aos chineses.
Por esse facto, a China começou a
desenvolver uma flotilha naval com a construção, não só de barcos patrulhas e
fragatas — que já tinham — como o fabrico de navios de guerra de grande porte
(destróieres) e de porta-aviões (prevê, no final, ter cinco porta-aviões,
incluindo dois de propulsão nuclear), sendo que o primeiro já está em fase
final de testes (ver em https://www.naval.com.br/blog/tag/marinha-
-chinesa/).
Mas a presença naval chinesa em
África deixou ser só no mar. A China obteve permissão do Djibuti para criar um
porto e estacionar parte da sua força naval no Golfo de Áden, neste país. Muito
perto das forças francesas e norte-americanas. A China deixou de ser só uma
potência economia e política em África, para ser uma potência global no
continente africano.
Se a presença chinesa em África
se tornou global, ainda é o poder económico e político que mais se faz sentir
no nosso continente, em geral, e em Angola, em particular.
Uma das primeiras vistas do
presidente João Lourenço ao exterior foi precisamente à China, onde a par do
reforço das relações entre os dois países lhe permitiu não só “se apresentar”
ao líder chinês como tentar — e conseguir, com algum custo — um novo empréstimo
financeiro junto de Beijing. Sabe-se — pouco, é certo — que Xi Jinping fez
depender este novo empréstimo de algumas condições prévias que, na realidade,
estão guardadas nos cofres da diplomacia dos dois países.
Mas não são só estas condições
que estão nos segredos dos deuses sino-angolano. Na realidade ninguém, de
boa-fé, pode afirmar qual é a nossa dívida real à China. Nem o FMI, nem — muito
menos — as empresas de rating o sabem. Cabe aos países relacionados informar
estas entidades das suas dívidas e serviços de dívida (juros). E só elas, e
quando o querem, informam os valores em causa. Ora , os nossos sucessivos Governos sempre
consideraram não ser nem necessário divulgar estes valores. Puro erro. A
comunidade nacional precisa de saber o que deve, a quem deve e quanto deve.
Talvez isso permitisse aos angolanos não serem tão expansivos em algumas das
suas despesas.
*Investigador do Centro de
Estudos Internacionais do ISCTE-IUL(CEI-IUL) e investigação para Pós-Doutorado
pela Faculdade de Ciências Sociais da Universidade Agostinho Neto
**Todos os textos por mim
escritos só me responsabilizam a mim e não às entidades a que estou agregado.
Novo Jornal
A primeira parte do ensaio acima e publicado no Novo Jornal, em
25 de Janeiro de 2019, edição, 569, página 35 (ou ver o artigo
completo aqui)
*Eugénio Costa Almeida – Pululu - Página de um lusofónico
angolano-português, licenciado e mestre em Relações Internacionais e
Doutorado em
Ciências Sociais - ramo Relações Internacionais - nele
poderão aceder a ensaios académicos e artigos de opinião, relacionados com a
actividade académica, social e associativa.
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