O presidente equatoriano Rafael
Correa disse em diálogo com a Sputnik que o ciberativista australiano Julian
Assange, fundador do site WikiLeaks, não realizou atividades de inteligência
implicando hackers russos enquanto tinha asilo na embaixada do país sul-americano
em Londres.
"Nós não soubemos de
atividades de inteligência de Assange [...] e nós nunca teríamos permitido se
fosse o caso, se tivéssemos conhecimento do fato", declarou o
ex-mandatário.
Em 2012, Assange se refugiou na
embaixada do Equador, depois de perder todas as apelações contra a extradição
para a Suécia que o Reino Unido estava pronto para atender, a pedido de um
procurador sueco que queria que ele fosse julgado por supostos crimes sexuais.
O ciberativista rejeitou sua
extradição alegando que a Suécia iria entregá-lo para os EUA, onde ele poderia
enfrentar a pena de morte por publicar milhares de documentos secretos sobre
operações militares dos EUA no Iraque e no Afeganistão.
O Equador cancelou o asilo ao
ciberativista australiano em 11 de abril deste ano.
Em 15 de julho, a rede
norte-americana CNN informou que "Assange transformou a embaixada em uma
sede para interferir nas eleições de 2016 nos EUA", graças à ajuda de "hackers russos".
Correa disse à Sputnik que a reportagem era uma "montagem"
e "puro show", e que não partiu de uma própria investigação do
veículo, mas sim de outras fontes, como o relatório do investigador especial
americano Robert Muller, que analisou o suposto conluio entre a Rússia e a
campanha do presidente Donald Trump.
"Isto já é conhecido. É como
quando queriam invadir o Iraque e fizeram uma campanha dizendo que havia armas
de destruição em massa, começando com a CNN, para que as pessoas, incluindo as
de bom coração, aplaudissem a invasão de uma guerra que custou mais de 100.000
vidas. Estão fazendo o mesmo com Assange, começando com um linchamento para extraditá-lo para os EUA e lhe condenem à prisão
perpétua, lhe apliquem uma pena desproporcional e as pessoas aplaudam",
acrescentou.
Correa admitiu que Assange
divulgou a partir da embaixada equatoriana informações "prejudiciais"
para Hillary Clinton em sua campanha contra Trump, e essa foi a razão pela qual
o governo decidiu suspender o acesso dele à internet em 17 de fevereiro de
2016, mas disse que isso não significa que o jornalista tenha montado um
"centro de operações" de inteligência na sede do país, como a CNN
indicou.
"Suspendemos a Internet para
Assange não porque ele estava fazendo espionagem, mas porque foram
publicadas informações prejudiciais a um dos candidatos. Não sei como foram
obtidas, mas, dizer que foram obtidas com hackers russos, a partir da embaixada
em Londres que espionou o Partido Democrata, há uma distância enorme", avaliou.
Correa afirmou que a partir do
momento em que ele estava divulgando informações que só beneficiavam Trump, ele
entendeu que Assange estava interferindo nos assuntos internos de outro país.
"Isso não íamos permitir,
porque somos respeitosos à soberania de cada Estado. Foi dito várias vezes para
Assange, e uma vez que não cumpriu e continuou a publicar apenas informações
que danificavam um lado, pessoalmente, eu pedi para que fosse suspensa a sua
internet até que as eleições presidenciais dos EUA passassem", relembrou.
Em 18 de abril, o Departamento de
Justiça dos EUA publicou o relatório final da investigação de Mueller sobre as
alegações de suposto conluio entre Trump e a Rússia e a suposta interferência
de Moscou nas eleições.
Mueller não encontrou conluio entre
as autoridades russas e a campanha de Trump, mas disse que Moscou tentou
interferir na eleição.
'Os EUA se consideram os donos do
mundo'
O ex-mandatário equatoriano
assegurou que os EUA acusaram a Rússia de ter interferido e realizado
atividades de espionagem durante suas eleições de 2016 porque acreditam que são
os donos do mundo.
"Eles acham que são donos do
mundo, mas, obviamente, o envolvimento da Rússia neste caso é por um aspecto
geopolítico. Às vezes envolvem a China, pois ambos são os maiores rivais
mundiais dos EUA. Isso está perfeitamente claro", disse Correa.
"Se Assange tinha roubado
segredos da Rússia e da China e se refugiasse na embaixada britânica em Quito,
teriam lhe dado um salvo conduto para que pudesse ir para um país seguro e
teriam feito a ele um monumento como um herói da liberdade de expressão, mas
como foi contra os EUA, então devemos crucificá-lo", complementou.
O jogo do Reino Unido
O ex-presidente do Equador disse
à Sputnik que a Europa é uma aliada dos EUA no caso contra ativista cibernético
Julian Assange, dizendo que "os britânicos jogam com as palavras"
quando dizem que não enviarão o fundador do WikiLeaks para um país que ameaça a
sua vida.
"Há um linchamento midiático
contra ele e ameaças dos falcões americanos para julgá-lo com leis como a pena
de morte [...] os britânicos estão jogando com as palavras, porque embora a
pena de morte contra Assange esteja excluída, se você condená-lo a 30, 40 anos, é praticamente sentenciá-lo à prisão perpétua até o fim de seus
dias", avaliou.
O australiano foi preso pela
polícia britânica no dia 11 de abril, quando o Equador pôs fim ao seu asilo na
embaixada do país sul-americano em Londres, onde ele tinha se refugiado. O
fundador do WikiLeaks agora aguarda julgamento de extradição para os EUA,
previsto para fevereiro de 2020.
O ministro britânico para as
Américas e Europa, Alan Duncan, reafirmou na segunda-feira que Assange não será
extraditado para qualquer país com a pena capital.
Por sua parte, Correa declarou
que "esperamos serem verdadeiras as palavras" do ministro britânico.
"A Europa está jogando como
aliada dos EUA no caso de Assange. Antes havia um pouco mais de independência
por parte da União Europeia, mas agora a deriva que tomou o mundo sobre todo o
século 21 com a direita e o capitalismo liberal mudou isso", comentou.
O ex-presidente equatoriano disse
que seu governo deu asilo a Assange não porque concordava com ele em tudo o que
ele tinha feito, mas porque não havia garantias internacionais do devido
processo.
"Se Assange tivesse roubado
segredos da Rússia e da China, lhe teriam dado um passe para que pudesse ir
para um país seguro e teriam feito um monumento como um herói da liberdade de
expressão. Apesar de existirem padrões internacionais dúbios, e apesar da
justiça só ser uma conveniência, o interesse do mais forte [prevalecer], nos
falta um longo caminho a percorrer para ter uma sociedade humanista real",
refletiu Correa.
A Europa também
"retrocedeu", antes era o "continente de luzes" e
"agora, em muitos aspectos é pior do que os EUA", prosseguiu.
"Os EUA são um país que
respeito muito porque eles começaram 30 anos antes que as repúblicas
latino-americanas. Eles fizeram bem as coisas e nós não, por isso se
desenvolveram. Mas é claro que sua política externa, especialmente para a
América Latina e para os governos que não são do seu agrado, deixa muito a
desejar. Infelizmente, está cada vez mais coincidindo com a Europa, o que é uma
pena, porque eu também admiro a Europa", concluiu.
Sputnik | Foto: © Sputnik /
Mikhail Fomichev
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