Pedro Tadeu | Diário de Notícias | opinião
O PSD e o CDS propunham no programa eleitoral conjunto para as eleições de 2015 a seguinte modificação
na Segurança Social: "Introdução, para as gerações mais novas, de um
limite superior para efeitos de contribuição, que em contrapartida também
determinará um valor máximo para a futura pensão. Dentro desse limite, a
contribuição deve obrigatoriamente destinar-se ao sistema público e, a partir
desse limite, garantir a liberdade de escolha entre o sistema público e
sistemas mutualistas ou privados."
Esta proposta foi muito criticada
por PCP e Bloco de Esquerda e, mais moderadamente, pelo PS, por significar uma
quebra do financiamento do sistema.
A ideia do PSD e do CDS agravaria
ainda mais as dificuldades financeiras da Segurança Social e abriria caminho
para um reforço de um negócio de milhares de milhões de euros às seguradoras
privadas.
Esta opção de dar aos privados
uma fatia crucial do sistema de segurança social era, aliás, explicita: o
programa do PAF também dizia que queria "a conclusão da convergência dos
sistemas de pensões público e privado, prosseguindo o esforço que tem sido
desenvolvido há mais de uma década", lembrando, na última frase, que o
processo de privatização do sistema envolvera os governos do PS.
Deve contar milhares o número de
artigos de opinião e de intervenções na rádio e na TV de comentadores,
jornalistas e supostos especialistas que ao longo dos últimos 15/20 anos andaram
a defender medidas idênticas.
Devem ser dezenas os estudos que
foram ao longo desse tempo apresentados, a tentar defender a inevitabilidade de
transferir para os privados uma parte das contribuições dos trabalhadores, como
alternativa a uma suposta falência da Segurança Social do Estado.
É incrível como todos esses
influenciadores foram sempre omissos sobre um facto claro e simples: os
privados nunca darão garantias de segurança equivalentes às de um Estado (mesmo
se em dificuldades financeiras) sobre o pagamento, ao fim de mais de 40 anos,
das pensões que os trabalhadores/clientes contrataram no início do processo.
É também incrível como se
inculcou na mentalidade dos mais jovens a falsa ideia da inutilidade dos
descontos para a Segurança Social por, supostamente, ser quase certo que, daqui
a uns anos, ninguém receberá reformas.
Mas alguma coisa mudou...
No primeiro debate com seis partidos promovido pelas rádios,
no âmbito das legislativas deste ano, ouvi, surpreendido, PSD e CDS a
abandonarem a ideia de haver limites para a contribuição para a Segurança
Social pública.
Mais moderados, ambos os partidos
de direita propõem, pelo contrário, aumentar o financiamento da Segurança
Social.
O PSD propõe uma taxa às empresas
sobre o Valor Acrescentado Líquido. Esta é uma sugestão quase igual
- na altura era sobre o Valor Acrescentado Bruto - à que o PCP apresentou na
Assembleia da República há cerca de 19 anos, através do deputado Lino de Carvalho,
e que consta também no seu programa
atual.
O CDS recusa cobrar dinheiro às empresas mas pede mais
esforço aos trabalhadores através de um Suplemento para a Reforma cujo
dinheiro, no entanto, poderá ir, por opção do beneficiário, cair no negócio das
seguradoras privadas.
O Bloco tem uma medida semelhante à do PCP e PSD no seu
programa eleitoral e o PS, mais vago, admite obter novas receitas fiscais, fora
das atuais contribuições sociais, para assegurar a viabilidade do sistema.
Tanto os partidos de direita como
o PS ainda propõem medidas para estimular poupanças para a reforma no setor
privado, mas ninguém avança com qualquer tipo de medida que implique diminuir
as receitas da Segurança Social.
E o único partido que pretende
cortar o valor das pensões pagas - mas apenas nos escalões mais altos - é o PAN.
Outra grande novidade é que, pela
primeira vez, há uma esmagadora maioria (excluem-se CDS e PAN) a defender que a
Segurança Social não deva ser financiada apenas com os pagamentos dos
trabalhadores e das empresas através da Taxa Social Única.
O discurso dominante, agora, é
que as fontes de receita da Segurança Social devem ser diversificadas - uma
solução tão óbvia para resolver o problema que, ou é confrangedor, ou é
suspeito ter sido a emergência da robotização e o medo da queda demográfica que
leva, finalmente, a haver tão larga maioria a aceitar esta velha proposta.
A nova abordagem ao problema da
Segurança Social que PSD e, na medida da recusa da degradação do sistema
público, CDS fazem nesta legislativas é uma vitória significativa -
provavelmente estrutural - da participação na solução governativa do PCP e do
Bloco de Esquerda - o PS teve sempre um setor relevante dentro das suas
direções que defendeu propostas semelhantes às da direita.
Os dois partidos de esquerda, no
essencial, acabam por ver incorporados nos programas dos adversários um tipo de
abordagem ao financiamento da Segurança Social que se aproxima muito mais das
suas ideias do que das soluções ditas "inevitáveis", massivamente
advogadas, durante décadas, por PSD e CDS, mais ou menos admitidas pelo PS,
inscritas no programa do PAF, e ainda dominantes no discurso mediático há apenas
seis ou sete meses atrás.
É uma grande vitória da
"geringonça", sim, mas as seguradoras, certamente, ainda não
desistiram.
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