segunda-feira, 14 de janeiro de 2019

Novo referendo sobre Brexit seria solução democrática


À medida que se aproxima a data fatídica, desvantagens do divórcio entre o Reino Unido e a UE ficam mais evidenciadas. O melhor agora é a câmara baixa rejeitar o acordo para que haja nova consulta, opina Birgit Maass.

Birgit Maass | Deutsche Welle | opinião

Raro é o deputado do Parlamento britânico que não está sentindo na nuca o hálito da história, antes da votação decisiva na Câmara dos Comuns, nesta terça-feira (15/01). O resultado da consulta definirá o destino do país por diversas gerações afora. Em jogo estão o futuro econômico, a reputação internacional do Reino Unido, a convivência entre as gerações e o modo de lidar com os migrantes.

No momento, parece que a primeira-ministra Theresa May está prestes a sofrer uma amarga derrota, e é bom que assim seja. O acordo sobre a saída do país da União Europeia ainda está muito aquém do que os defensores do Brexit prometeram a seus adeptos.

De fato, dentro de alguns anos Londres poderá escolher quais imigrantes da UE deixará ingressar no país, e abandonará efetivamente as instituições europeias. Porém o Brexit também virá à custa do crescimento econômico, e isso em grande escala. Das poupanças bilionárias prometidas pelos "brexiteers", nem sinal. O Reino Unido soberano, terra do leite e do mel, permanece um delírio de fantasia.

May cometeu vários erros. Por muito tempo, ocultou de seus cidadãos as consequências econômicas do divórcio em relação à UE. Tampouco deixou claro que o Reino Unido teria que fazer concessões a Bruxelas, se no fim de março não quisesse pular fora da comunidade sem acordo e com grandes prejuízos.

Em vez de construir pontes e de recorrer a outros partidos, ela aprofundou os fossos do país. Ao tachar de "citizens of nowhere" (cidadãos de lugar nenhum) aqueles que se veem como cidadãos cosmopolitas – e está claro que se referia aos pró-europeus do país – ela antagonizou muita gente.

Seu senso de dever e vontade férrea conquistaram respeito até entre seus adversários. Mas parece que de tanta diligência a chefe de governo perdeu o compasso moral. Ela parece possuída por uma missão supostamente histórica, que seria implementar a vontade da maioria dos eleitores do referendo do Brexit.

Sustar a imigração desimpedida de cidadãos da UE virou para ela uma espécie de Santo Graal. Desde cedo, bloqueou a si e a sua equipe de negociadores com "linhas vermelhas", como a de se retirar incondicionalmente do mercado comum e da união aduaneira.

Em vão, ela tenta agora conquistar o apoio de uma Câmara dos Comuns dividida, para que só haja esse acordo e nenhum outro. As alternativas são: ou nada de acordo, ou nada de Brexit – um segundo referendo, ela rechaça terminantemente.

No entanto, o referendo de 23 de junho de 2016 foi um quadro momentâneo, e o apoio dos eleitores ao Brexit, nem tão grande assim. Na época, poucos sabiam o que realmente significava abandonar a UE. Neste ínterim ficou claro que diversas promessas dos apoiadores do Brexit não poderão ser cumpridas, e seria democrático consultar mais uma vez os eleitores.

Portanto os deputados deveriam rejeitar o acordo, de modo a liberar o caminho para uma segunda consulta popular. Claro que o Reino Unido pode sair da UE, porém com consideráveis perdas econômicas. O povo deve decidir se, sob tais circunstâncias, de fato quer o Brexit.

Eurodeputados pedem ao Reino Unido que volte atrás no Brexit


Mais de cem membros do Parlamento Europeu assinam carta urgindo aos britânicos que reavaliem decisão de deixar a União Europeia. Apelo ocorre às vésperas de votação crucial sobre o divórcio no Parlamento britânico.

Mais de cem deputados do Parlamento Europeu assinaram uma carta aberta pedindo ao Reino Unido que reconsidere a decisão de deixar a União Europeia (UE). O apelo ocorre pouco antes de uma votação crucial no Parlamento britânico para analisar o acordo negociado pela primeira-ministra Theresa May com os líderes europeus.

A saída definitiva está marcada para 29 de março, mas o país está extremamente dividido em relação ao divórcio. Na versão inicial da carta recebida por órgãos de imprensa da Alemanha nesta segunda-feira (14/01), os eurodeputados expressam uma crescente preocupação sobre o que chamam de "desastre do Brexit, que será prejudicial tanto para o Reino Unido quanto para a Europa".

"Estamos relutantes em intervir em sua política interna, mas não podemos deixar de notar que as pesquisas de opinião mostram um número cada vez maior de eleitores que desejam uma oportunidade para reconsiderar a decisão sobre o Brexit", diz o documento.

"Qualquer decisão de permanecer na UE será amplamente bem-vinda por nós", afirmam os eurodeputados, elogiando o "enorme impacto" que políticos e cidadãos britânicos tiveram na construção do projeto europeu.

Eles pedem ainda que os britânicos reavaliem sua decisão "no interesse das próximas gerações", e se comprometem a "trabalhar juntos para reformar e melhorar a União Europeia" caso o Brexit venha a ser evitado.

Até o momento, 111 dos 751 membros do Parlamento Europeu assinaram a carta. Outros eurodeputados poderão assinar o documento até o dia 21 de janeiro, antes de sua publicação na imprensa britânica.

Theresa May, por sua vez, renovou os pedidos aos parlamentares britânicos para que apoiem seu acordo para o Brexit na votação desta terça-feira. Ela disse que, após receber novas garantias do presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker, as desconfianças envolvendo a polêmica sobre a fronteira com a Irlanda devem ser colocadas de lado.

As críticas de muitos opositores de May sobre sua estratégia para o Brexit estão centradas na questão do chamado backstop – o mecanismo que permite instaurar uma união aduaneira provisória entre a República da Irlanda, país-membro da UE, e a Irlanda do Norte, que integra o Reino Unido, o que manteria o país dentro das normas alfandegárias do bloco europeu.

A medida deveria durar até as duas partes da ilha chegarem a um acordo permanente para evitar a imposição de uma fronteira com controles alfandegários. Vários deputados temem que o mecanismo acabe mantendo o Reino Unido preso à UE, já que Londres não poderia abandoná-lo unilateralmente, ficando dependente de uma autorização de Bruxelas.

Uma carta enviada por Juncker e pelo presidente do Conselho Europeu, Donald Tusk, "deixa ainda mais provável que o backstop jamais seja utilizado", afirmou May, afirmando que o documento de Bruxelas possuiria força legal.

"A Comissão pode assegurar que, assim como o Reino Unido, a União Europeia não deseja que o backstop entre em efeito", diz a carta, que confirma "a determinação da UE em substituir a solução do backstop na Irlanda do Norte por um acordo posterior que assegure de modo permanente a ausência de uma fronteira rígida na ilha da Irlanda".

O documento reafirma que o bloco europeu deverá trabalhar intensamente para evitar o acionamento do mecanismo, mas não menciona um período limite para que essa questão seja resolvida. As garantias oferecidas pelos europeus "possuem valor legal", em linha com a autoridade dos líderes do continente de "definir as direções e prioridades para a UE no mais alto nível", diz o texto.

Juncker e Tusk afirmam ainda que o acordo negociado com May "representa um compromisso justo" que eles não estariam em posição de modificar.

Na Alemanha, um dos presidentes do partido populista de direita Alternativa para a Alemanha (AfD), o eurodeputado Jörg Meuthen, afirmou que o Brexit é um "caos sem esperança e uma situação altamente desastrosa", e lançou dúvidas sobre o futuro após o divórcio. "Temos eleições europeias em maio. Me pergunto como isso vai funcionar. Não é possível cancelar agora o Brexit sem enfrentar grandes dificuldades", observou.

Neste fim de semana, a AfD decidiu apoiar o fim do Parlamento Europeu, por considerá-lo "supérfluo" e "antidemocrático", apesar de lançar candidatos às eleições europeias. A sigla afirma que, caso suas reivindicações não sejam atendidas, será cogitado dar início no futuro a um processo para a saída da Alemanha do bloco europeu, o chamado "Dexit". Meuthen, porém, diz que essa seria uma opção "indesejada".

RC/dpa/ap/afp | Deutsche Welle

Madrid afirma que verdadeiro prazo limite para Brexit são as europeias


As eleições europeias de maio são o "verdadeiro prazo limite" da negociação sobre o 'Brexit' se o acordo de saída for rejeitado pelo parlamento britânico, afirmou hoje o ministro dos Negócios Estrangeiros de Espanha, Josepc.

"Caso não haja acordo, há a possibilidade de continuar a procurar um, é possível prolongar os prazos, continuar a discutir", disse o ministro num encontro com jornalistas.

A data de saída do Reino Unido da União Europeia (UE) é 29 de março, mas "o verdadeiro 'deadline' [prazo limite] são as eleições europeias, porque foram planeadas sem representação britânica, partindo do princípio de que quando se realizassem o Reino Unido já não estaria", acrescentou.

Borrell considerou, contudo, que um 'Brexit' sem acordo seria "uma catástrofe para toda a gente" pelo que faz "votos para que tal não ocorra".

O parlamento britânico vota na terça-feira o acordo negociado entre o Governo britânico e a UE, que assegura uma saída ordenada e um período de transição até dezembro de 2020, mas as hipóteses de ser reprovado são consideráveis.

Um chumbo do documento pode obrigar o Governo britânico a pedir uma extensão do período de negociações estipulado pelo artigo 50.º do Tratado de Lisboa, que termina a 29 de março.

Embora o Governo britânico mantenha como posição oficial que não pretende fazê-lo, o diário The Guardian noticia hoje, citando fontes europeias, que os 27 estariam preparados para oferecer uma extensão "técnica" até julho, data da tomada de posse dos deputados eleitos em maio para o Parlamento Europeu, para o Reino Unido resolver o impasse.

Em Bruxelas, a Comissão Europeia recusou "especular" sobre um possível adiamento, com o porta-voz, Margaritis Schinas, a frisar que "há um acordo em cima da mesa" e que é necessário "trabalhar com o que há".

"E é isso que as partes estão a fazer agora", acrescentou Schinas.

Na Alemanha, a porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros, Maria Adebahr, recusou igualmente "declarações especulativas" sobre um prolongamento, frisando que, para Berlim, "continua em vigor o enorme interesse numa saída ordenada e numa saída segundo o acordo negociado".

"Creio que hoje, um dia antes de uma possível decisão, o correto é não fazer declarações de tipo especulativo sobre estes assuntos", disse a porta-voz, evocando declarações recentes do chefe da diplomacia alemã, Heiko Mass, advertindo que "quem apostar no fracasso da votação para vir a ter uma melhor base de negociação está a assumir um risco extremamente elevado".

França também recusou hoje comentar um possível adiamento, afirmando apenas que "deseja um voto favorável" na Câmara dos Comuns e que, se isso não acontecer, "caberá a Londres apresentar propostas" à UE.

"A posição francesa é clara: temos um acordo sobre a mesa que é o melhor acordo possível e que não é negociável", afirmou o ministério dos Negócios Estrangeiros francês em resposta a uma pergunta sobre um eventual prolongamento das negociações até julho.

Lusa | em Notícias ao Minuto | Foto: Reuters

RU | "Se parlamento bloquear o Brexit será uma subversão da nossa democracia" - May



Na véspera do parlamento britânico se pronunciar sobre o acordo para o Brexit, a primeira-ministra Theresa May falou no parlamento e pediu aos deputados para "olharem novamente para o acordo" estabelecido com Bruxelas e apoiarem-no.

A questão da fronteira entre a Irlanda e a Irlanda do Norte continua a ser um grande entrave para que o acordo seja aprovado pelo parlamento, algo que foi abordado por May nestas suas declarações. 

A primeira-ministra salientou perante os deputados que o "Reino Unido nunca vai permitir o regresso de uma fronteira entre as Irlandas" e referiu que a uma "fronteira física entre as Irlandas" a par da "independência da Escócia é a verdadeira ameaça à nossa União".

Recordando que se o acordo for aprovado esta terça-feira, o Reino Unido terá "dois anos de negociações" para preparar melhor a sua saída do bloco europeu, May esclareceu o que, na sua opinião, está em jogo. 

"Se em vez de sairmos sem acordo, se este parlamento bloquear o Brexit, isso seria uma subversão da nossa democracia, dizendo às pessoas que nos elegeram para servir que não temos vontade de fazer aquilo que escolheram".

Frisando que se o acordo não for aprovado, "vamos deixar o povo britânico ficar mal". 
"Devemos fazer o que o povo britânico escolheu e construir um futuro melhor para este país, apoiando o acordo do Brexit amanhã", realçou May.

Fábio Nunes | Notícias ao Minuto | Foto: Reuters

Guiné-Bissau | CEDEAO quer eleições credíveis e transparentes


De visita a Bissau para analisar preparativos eleitorais, o presidente da Comissão da Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental pediu que as legislativas se mantenham a 10 de março e sejam "eleições modelo".

A Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO) quer que a campanha eleitoral para as eleições legislativas de 10 de março na Guiné-Bissau seja um verdadeiro debate de ideias, que permita discussões aprofundadas dos programas eleitorais dos partidos concorrentes. À saída de uma audiência com o Presidente da Guiné-Bissau, José Mário Vaz, o presidente da CEDEAO, Jean-Claude Kassi Brou, disse que a organização sub-regional quer que as eleições e sejam um modelo de credibilidade e transparência e se realizem na data prevista.

"Desejamos que tenha lugar uma campanha eleitoral com um debate de ideias sérias e de programas eleitorais, para que sejam umas eleições modelo", declarou. "Terminou o recenseamento eleitoral, com a maioria dos eleitores recenseados. Foi uma etapa importante deste processo, daí que queiramos saber o que é que os atores políticos estão a fazer para manter as eleições a 10 de março", disse ainda o presidente da CEDEAO.

A deslocação a Bissau de Jean-Claude Kassi Brou ocorre na sequência da cimeira da CEDEAO, realizada em dezembro, em Abuja, na Nigéria. A organização tem estado a mediar a crise política na Guiné-Bissau e, na sua última reunião, os chefes de Estado e de Governo dos países membros admitiram a possibilidade de voltar a impor sanções a quem criar obstáculos ao processo eleitoral no país.

Novo adiamento das eleições?

Quanto a um eventual novo adiamento das eleições, Kassi Brou deixou claro que recebeu garantias do Presidente da República da Guiné-Bissau, José Mário Vaz, de que os atores políticos estão a trabalhar no sentido de ser respeitada a data de 10 de março para a realização da votação.

"Vamos continuar a acompanhar e a apoiar as autoridades na preparação das eleições, que são importantes, porque vão renovar o Parlamento e permitir à Guiné-Bissau consolidar o processo democrático e o desenvolvimento económico e social", sublinhou o presidente da CEDEAO.

Dos 49 partidos legalizados na Guiné-Bissau, o Supremo Tribunal de Justiça do país recebeu na quinta-feira (10.01) 24 candidaturas de formações políticas que querem participar nas eleições legislativas.

O órgão judicial, que na Guiné-Bissau tem as competências de Tribunal Constitucional e eleitoral, tem até 25 de janeiro para publicar as listas definitivas admitidas para concorrer às eleições.

Missão do FMI

Entretanto, uma missão do Fundo Monetário Internacional (FMI) iniciou também os trabalhos com autoridades guineenses para avaliar o Programa de Crédito Alargado, a evolução das finanças públicas e o Orçamento de Estado para 2019. A missão do FMI, que é liderada por Tobias Rasmussen, vai permanecer no país até a próxima sexta-feira (18.01).

Tobias Rasmussen terá encontros com o primeiro-ministro e ministro das Finanças, Aristides Gomes, e com a diretora nacional do Banco Central dos Estados da África Ocidental, Helena Mosolini Embalo, para "análise da evolução monetária e financeira do país, do setor bancários e das perspetivas para 2019".

O conselho de administração do FMI aprovou no início de junho no âmbito do Programa de Crédito Alargado à Guiné-Bissau o desembolso de mais 4,3 milhões de dólares (cerca de 3,6 milhões de euros). O FMI aceitou também um pedido das autoridades guineenses para a intervenção ser alargado até julho de 2019. Com o prolongamento da sua intervenção no país, o programa de crédito alargado aumentou para 32,2 milhões de dólares (cerca de 27,6 milhões de euros).

Braima Darame (Bissau) | Deutsche Welle

Foi Dia da Liberdade em Cabo Verde: PR pede maior participação da sociedade civil


"A democracia nasce da sociedade e na sociedade", lembrou Jorge Carlos Fonseca na sessão solene do Dia da Liberdade e da Democracia na Assembleia Nacional de Cabo Verde. Deputados sublinham que ainda há muito por fazer.

O Presidente da República de Cabo Verde defendeu este domingo (13.01) uma maior participação da sociedade civil, a par de um sistema de partidos, capaz de propiciar espaços de liberdade, transparência de procedimentos e afirmação e realização da cidadania.

Jorge Carlos Fonseca falava na Assembleia Nacional de Cabo Verde, durante a sessão solene do Dia da Liberdade e da Democracia, em que recordou que "a democracia nasce da sociedade e na sociedade". O Dia da Liberdade recorda a data em que, pela primeira vez, em 1991, os cabo-verdianos exerceram o seu direito de voto nas primeiras eleições multipartidárias, após 16 anos em regime de partido único.

"Não é novidade para ninguém que há já algum tempo em Cabo Verde vozes a clamar contra a centralização excessiva do poder político, senão contra a sua fulanização, e a pugnar por uma cada vez maior localização ou regionalização do poder, forma mais eficaz de diagnosticar e resolver os problemas das comunidades e assegurar um desenvolvimento equilibrado e justo das diferentes parcelas do território nacional", disse o chefe de Estado.

Jorge Carlos Fonseca considera que, "num Estado de direito democrático, a necessária concorrência entre os partidos políticos e outras instâncias ou organismos da sociedade civil não deverá traduzir-se numa qualquer ideia de extinção dos partidos ou, mesmo, no apagamento do essencial de sua função de representação política da comunidade e de participação no exercício do poder político". 

"Haverá ainda sociedade e Estado e necessidade de mediação entre uma e outro. E nessa mediação o papel do que são hoje os partidos políticos mantém-se, bem que com configuração, extensão e visibilidade diferentes", disse, acrescentando que "a competição entre o sistema partidário e outros sistemas ou subsistemas da sociedade civil poderá exprimir-se e resolver-se numa constante partilha e recomposição de espaços e territórios, definidas não só normativamente, mas através de mecanismos naturais de compressão e descompressão". 


Parlamentares pedem mais em tempos complexos

Na mesma sessão, o presidente da Assembleia Nacional de Cabo Verde disse que é preciso estar atento aos "sinais e alertas" e encontrar "respostas às inquietações de uma sociedade civil cada vez mais atuante e ciosa dos seus direitos e aspirações".

Para Jorge Santos, vivem-se "tempos complexos, de constantes ameaças e incertezas, em quase todos os continentes". "A relação entre os representantes e os representados, ganha relevância crucial para a sobrevivência do sistema democrático e para a paz social", disse.

António Monteiro, da União Cabo-verdiana Independente e Democrática (UCID), foi o primeiro deputado a falar nesta sessão, referindo-se à data que se celebra como "o desfecho de um processo que deu ao povo cabo-verdiano o seu destino" e que "abriu o caminho da democracia". O parlamentar reconheceu, contudo, que "ainda há muito por fazer, além do que foi feito". E sobre o desenvolvimento do país, tantas vezes referido no Parlamento, o deputado disse que é ainda "pouco sentido pelo povo".

Por seu lado, Rui Semedo, líder parlamentar do Partido Africano da Independência de Cabo Verde (PAICV), recordou o percurso que antecedeu a realização destas primeiras eleições, uma "data tão emblemática para a República". O deputado homenageou no seu discurso o comandante Pedro Pires. Centrando-se depois no presente, Rui Semedo reconheceu que, "não obstante os ganhos, há coisas que não vão bem e que precisam urgentemente ser corrigidas". E enumerou falhas nos mecanismos de transparência e prestação de contas, nos direitos da oposição democrática, no controlo e fiscalização do executivo, respeito pelas conquistas da liberdade de imprensa, entre outras.

Rui Figueiredo, líder parlamentar do Movimento pela Democracia (MpD), disse que esta evocação ganha particular significado nos tempos hodiernos, marcados por incertezas quanto ao devir da democracia e da liberdade no mundo e turvados por ameaças populistas e extremistas". Recordando as classificações que Cabo Verde tem alcançado em vários rankings internacionais, reconheceu, contudo, que "persistem problemas a ser resolvidos", mas que tal facto não deve impedir a celebração dos ganhos conseguidos.

Agência Lusa | Deutsche Welle

Portugal | Netos do cavaquismo, filhos do socratismo


Tiago Mota Saraiva* | Jornal i | opinião

De Pedro Marques a Montenegro, os netos do cavaquismo e filhos do socratismo perfilam-se para conquistar as lideranças de PS e PSD. Aspiram a mandar no Estado e a poder decidir sem qualquer racional técnico, ideológico ou científico

Nos anos 90, o programa do 5º, e último, ano da Faculdade de Arquitectura de Lisboa era um aeroporto. Professores preparavam-se para o concurso da grande infraestrutura que havia de vir e colocavam os estudantes a ensaiar modelos e a estudar alternativas. Não havia teses, nem Bolonha mas uma indómita vontade de participar no futuro. Havia concursos públicos como forma privilegiada para atribuir a encomenda pública e se o então ministro Ferreira do Amaral nos viesse apresentar umas patéticas simulações tridimensionais de um edifício aeroportuário numa localização sem estudo de impacto ambiental, o país rebentaria entre risadas e contestação.

Independentemente da voracidade com que o cavaquismo ia, em surdina, depauperando o Estado, numa escala que só passados 20 anos podemos mensurar (entre BPNs e PPPs), ainda parecia impossível que um projecto público como este ou a sua localização não fossem sujeitos a discussão pública ou a um concurso público aberto.

O socratismo, filho de um cavaquismo de self-made men que faziam gala em odiar o conhecimento e a política (enquanto nobre arte ou ciência de escolher em função do que se entende como bem comum), institucionalizou a ideia do “fazer obra” independentemente do processo, da técnica, do modo e dos vícios.

Sem mundo, sem política e sem ideologia, mas com toda a sua vida profissional feita nos corredores dos partidos e governos do centrão, foi-se constituindo uma nova linhagem de decisores portadores deste legado. Gente sem qualidades, capaz de ser das primeiras a morder a mão do pai Sócrates no momento da queda (colocando hoje, pessoas como eu - feroz opositoras dos seus governos - como as mais preocupadas em que tenha um julgamento justo). Gente que se conseguiu aguentar nos corredores do poder apesar da maioria parlamentar improvável que se constituiu nesta legislatura. Gente da minha geração que faltou a todos os combates políticos onde não se pagavam senhas de presença, desde a “geração rasca” à “geração à rasca”. Gente que desconhece e despreza tudo o que está além do Terreiro do Paço.

De Pedro Marques a Montenegro, os netos do cavaquismo e filhos do socratismo perfilam-se para conquistar as lideranças de PS e PSD. Aspiram a mandar no Estado e a poder decidir sem qualquer racional técnico, ideológico ou científico. Sem capacidade ou cultura para entender os perigos que se agigantam nesta Europa, actuam de uma forma cega e ao sabor da espuma mediática. Sentem-se predestinados para liderar os partidos do centrão e o país, sem perceber as exigentes batalhas internacionais e ideológicas que temos pela frente. Sonham ser Macrons em todo o seu esplendor de banalidade e autoritarismo.

Da que se convencionou chamar de “geração mais bem preparada de sempre”, arriscamo-nos a aproveitar “poucachinho”. Um dos principais desafios do nosso futuro próximo é perceber se se consegue arrancar as raízes deste eucaliptal do cavaquismo-socratismo e dar origem a uma realidade política nova.

*Escreve à segunda-feira

Portugal | Simplesmente Cristina


Inês Cardoso | Jornal de Notícias | opinião

Cristina Tavares foi despedida na semana passada. Pela segunda vez. A primeira foi em 2017. Depois de o tribunal obrigar a corticeira onde trabalhava a readmiti-la, passou a ser castigada com trabalho pesado e inútil.

Todos os dias carregava e descarregava a mesma palete, num local com temperaturas elevadas, isolada dos restantes funcionários. E obrigada a utilizar uma casa de banho sem privacidade, diferente da dos colegas e com tempo de uso controlado.

A Autoridade para as Condições do Trabalho reconheceu e documentou o assédio moral sobre Cristina e levantou três autos, um dos quais já concluído com a aplicação de uma multa de 31 mil euros. Nem a fiscalização das autoridades, nem a atenção pública sobre o caso impediram a empresa de voltar a dispensar a funcionária. Que vai para tribunal. Pela segunda vez.

Num país em que a precariedade tem demasiada força (um quinto do emprego criado no último ano), o medo leva muitos trabalhadores a aceitarem violações da lei sem denunciar ou reagir. Haverá na história de Cristina muitas nuances que desconhecemos, mas uma coisa é certa: a sua determinação tem obrigado as autoridades a olhar de frente para a violação de direitos laborais.

Neste combate, também os sindicatos têm sido incansáveis, preparando-se para sair à rua, no próximo sábado, numa caminhada solidária. Para quem se entretém a fragilizar os sindicatos considerando-os máquinas orientadas para greves e pouco atentas às pessoas, o apoio e mobilização à volta de Cristina são um bom exemplo do que o sindicalismo tem de mais nobre e solidário.

O espaço mediático está atualmente dominado por tantos fogachos que vale sempre a pena ver casos como o de Cristina ganharem espaço nos jornais e televisões. Pelo que revelam do inferno em que pode transformar-se um local de trabalho. Mas sobretudo para nos lembrar de todos os instrumentos que existem para o proteger.

*Diretora-adjunta

Portugal | Oh i oh ai, os Passos Montenegros vêm aí…


A novela tem pano para mangas, o que significa (esclarecendo os que se expressam bem em inglês mas não entendem expressões em português) que o caso está para durar no tempo e na comunicação social das tricas e laricas. Mas qual novela? Ora, a do PSD anti Rio e pró linha tétrica dos Passos Montenegros de Mais à Direita Volver.

Este é o assunto primeiro do Curto de hoje, ainda quentinho, pela lavra de Santos Costa, do Impresa Balsemão e Companhia Ilimitada Porque Vale Tudo. Vamos nessa.

Que uns dizem assim e outros aqueloutro do dito. Está bem. Até podem andar à trolitada que seja para aquecerem. Com este frio dará um jeitão e sempre poupam nos aquecimentos que funcionam à custa dos contribuintes papalvos e enregelados. Até mesmo dos velhotes com reformas de miséria que pagam a eletricidade dos aquecimentos dos deputados e de outros felizardos em organismos para por lá gozarem o quentinho dos ares condicionados e etc. Mas esses mesmos velhinhos, de reformas de miséria, têm de se contentar com o frio porque não têm reformas suficientes para poderem suportar as contas de eletricidade que estão apensas ao funcionamento do quentinho e bom. Coisas desta dita democracia e dita justiça social. Ops. Dito isto estamos a ver sorrisos ou  muitos milhares de esgares? Milhões? Pois.

Avançando. Dizia alguém que este governo de Costa navega à bolina e sem oposição. E é mesmo, uma vez que constatamos que nem CDS, nem PSD, são oposição válida, credível, alternativa ao governo de António Costa. E são assim porque motivo? Porque antes estiveram a governar exclusivamente para os tais 1% que eram e são DDTs (Donos Disto Tudo), os tais que atiram os lucros e as verbas dos cambalachos para os offshores. Que, como se não bastasse, debulharam os portugueses durante anos e anos, condenando-os à miséria e correspondentes ausências de abrigo. Vimos famílias destroçadas por via disso, cumprindo-se o adágio de “casa onde não há pão todos ralham e ninguém tem razão”. Boa Passos! Boa Cavaco! Boa doutores-ministros daquele governo debulhador que nem eram doutores mas sim uns intrujões. Credibilidade? Só se a memória fôr curta e desavergonhada. Credibilidade? Só se for na matéria que ainda hoje se mantém no fundo da pia dos despejos e 'obração'. Pois.

Recomende-se, para aquecer, que acabemos este arremedo de entrada do Curto cantando, rindo, batendo palmas e com os pés no chão, agitando ao máximo os membros superiores e inferiores: “Oh i oh ai os Passos Montenegros querem vir aí. Oh i oh ai já estamos fartos deles e de ti…” E por aí adiante. Pronto. Já aqueceram? Cuidado com a conta de eletricidade. É que o Mexia já está podre de rico e os das ilhargas também. Os offshores citys que revelem.

Bom dia, se conseguirem, e boa semana, se tiverem essa sorte. Abram os olhos como as mulas que carregam os donos-cavaleiros embriagados, de olhos mortiços e até fechados, mas que chegam a casa, ao destino, para se abrigarem do vento e da chuva, da intempérie que as direitas em Portugal preparam com toda a manha que caracteriza os que nos espoliam sem dó nem piedade, ou sem uma réstia de pudor.

Vejam o Curto. Vale. Inté. (MM | PG)

Bom dia este é o seu Expresso Curto

Uma guerra civil em que ganham os dois?

Filipe Santos Costa | Expresso

Bom dia.

Vamos às últimas na guerra civil do PSD.

Depois de Luís Montenegro se ter disponibilizado para disputar a liderança e ter desafiado Rui Rio para que convoque eleições diretas já, o presidente do PSD não fez a vontade ao ex-líder parlamentar do partido, mas anunciou um Conselho Nacional para votar uma moção de confiança. Agora, é hora de contar espingardas e fazer apostas. Luís Marques Mendes já fez as suas.

“Eu acho que Rui Rio vai ganhar”, disse o ex-líder do PSD, e atual comentador da SIC. A razão é, tão só, a história e a estatística: “Nunca vi ao longo da história do PSD um líder perder uma votação relevante num Conselho Nacional”, explicou Mendes. “Se isso acontecer”, acrescentou, “acabam por sair ambos vencedores”. Uma guerra civil em que ganham os dois, portanto. Rui Rio, porque “sai reforçado” e não fica nenhuma dúvida de que irá a votos contra António Costa em outubro, qualquer que seja o resultado das europeias; Luís Montenegro “também ganha” porque teve a coragem de se chegar à frente e pedir a clarificação, e fica “na pole position” para a sucessão de Rio depois das legislativas de outubro.

O antigo presidente social-democrata desdramatizou o desafio feito por Luís Montenegro, distanciando-se dos que usam expressões como “golpe de Estado” ou “golpe palaciano”. “Estas coisas são normais e é sempre melhor uma clarificação”, diz Mendes, para quem o ideal seria ir para diretas já - uma vitória de Rio deixá-lo-ia “reforçadíssimo”, uma vitória de Montenegro abriria “um novo ciclo”, com “um novo elán”. Havendo primeiro o Conselho Nacional, Mendes diz que seria “preferível o voto secreto”, para que os conselheiros tivessem maior liberdade. Com os apoiantes de Rio empenhados em reduzir as motivações dos críticos à preocupação com “os lugarzinhos nas listas”, Mendes advertiu que “a história dos lugares é uma avenida com dois sentidos, há dum lado e do outro” e admitiu que “há uma parte significativa, de um lado e de outro, que vota pelos lugares”.

E dos dois lados perfilam-se apoios. Paulo Rangel colocou-se ao lado de Rio, elogiando a “coragem” e “bom senso” com que respondeu ao desafio. Francisco Pinto Balsemão, presidente do Conselho de Administração do Grupo Impresa (proprietário do Expresso), criticou o timing do desafio de Montenegro, bem como o seu “conteúdo um pouco melodramático, ou patético”. Do lado de Luís Montenegro, Maria Luís Albuquerque lamentou ontem que Rio não tenha aceitado uma clarificação imediata em diretas, e criticou a forma como o presidente do PSD recorreu a ataques pessoais para responder ao desafio político que lhe foi feito por Montenegro. Paula Teixeira da Cruz também já havia considerado a declaração de Rio “no mínimo miserável”.

O Observador fez uma análise desses ataques de Rio, que disse ou insinuou que Montenegro é irresponsável, imaturo, inconsciente, sem ética... e maçon.

Hoje, o Presidente da República recebe Luís Montenegro em Belém, depois de se ter encontrado com Rio, no Porto, na sexta-feira à noite.

A luta continua, e a balcanização do PSD também.

OUTRAS NOTÍCIAS

Não é só Rui Rio que, em clima de balcanização, quer ver a sua autoridade reforçada com uma moção de confiança. Na Grécia, Alexis Tsipras fez o mesmo, depois da demissão do ministro da Defesa, um ultranacionalista e populista. Neste caso, é literalmente uma questão balcânica - o Governo de Atenas, que resistiu às agruras da troika, pode não resistir ao novo nome da Macedónia, um dos seus vizinhos a norte. Desde a semana passada o país chama-se República da Macedónia do Norte, uma decisão que mereceu o acordo de Tsipras, o que pôs fim a uma velha disputa diplomática, mas também pode por fim ao governo grego. Desde que foi assinado o acordo de Skopje, há um ano, que os ultranacionalistas gregos ameaçavam romper com Tsipras, pois não aceitam que Macedónia, nome de uma região grega, designe também outro país.

Depois de mais um fim de semana de protestos dos coletes amarelos, Emmanuel Macron propôs um grande debate nacional em França em torno de 35 questões, com temas que abrangem a fiscalidade, a democracia, a ecologia ou a imigração. Não se sabe que consequências terá a iniciativa do presidente francês, mas uma consequência deste movimento de protesto parece iniludível: o reforço de Marine le Pen. A líder da extrema-direita francesa está bem lançada para uma vitória nas eleições europeias.

Amanhã é o dia decisivo para o Brexit, com a votação na Câmara dos Comuns do acordo entre o Reino Unido e a UE. Theresa May voltou a dramatizar as consequências de um chumbo, e deverá fazê-lo outra vez hoje, num último esforço para conseguir uma improvável maioria de apoio. Entretanto, Bruxelas poderá adiar até julho a data limite para o Brexit, de modo a evitar uma saída desordenada já no fim de março. Se assim for, o Reino Unido ainda terá de votar nas eleições europeias de maio.

António Costa deu ontem a garantia aos britânicos que vivem em Portugal de que poderão, depois do divórcio com a UE, continuar serenamente em Portugal. O secretário-geral do PS chamou ainda a atenção para a importância das eleições europeias, alertando que a Europa está a ser atacada pelo "virus do protecionismo e do nacionalismo".

Noémia Jorge, Cecília Aguiar e Miguel Magalhães não são nomes consagrados como é Fernando Pessoa, mas isso não os impediu de dar umas tesouradas na obra do poeta português mais celebrado em todo o mundo. Os três autores de “Encontros”, um manual de língua portuguesa para o 12º ano, da Porto Editora, terão achado que a mocidade portuguesa não está preparada para alguns versos com linguagem mais explícita e censuraram-nos, conforme noticiou a Marta Gonçalves.

Trata-se de três versos da “Ode Triunfal”, assinada pelo heterónimo pessoano Álvaro de Campos. Ei-los: “Ó automóveis apinhados de pândegos e de putas”; “E cujas filhas aos oito anos – e eu acho isto belo e amo-o! / Masturbam homens de aspecto decente nos vãos de escada”. Os alunos em causa têm pelo menos 17 anos. Estamos no ano da graça de 2019.

manchete do Público conta uma história tipicamente portuguesa. Em abril de 2018 juntaram-se dois ministros e representantes do Banco Central Europeu para, com a devida pompa e circunstância, lançarem o programa Casa Eficiente 2020. Trata-se de uma linha de financiamento com condições favoráveis para melhorar a eficiência energética e hídrica das habitações portuguesas. O programa, que arrancou em junho com uma dotação de 200 milhões de euros, permitiu nos primeiros seis meses empréstimos num valor total de apenas 300 mil euros. O Governo diz que a responsabilidade é da banca. E, como é possível constatar, um crédito para comprar carro é mais fácil e tem melhores condições do que um empréstimo para fazer obras em casa.

Uma semana após a estreia do novo programa de Cristina Ferreira, uma reportagem especial da SIC mostra o outro lado do fenómeno da TV que está a dominar as audiências.

Por falar em Cristina: Marcelo Rebelo de Sousa esteve de surpresa no Hot Clube para ouvir jazz. Foi no sábado à noite, em resposta a um desafio do radialista José Duarte, conta oPúblico. O Presidente da República ouviu a apresentação do terceiro disco do Vitor Pereira Quintet.

O primeiro concerto dos Xutos e Pontapés foi a 13 de janeiro de 1979. Passaram ontem 40 anos. Diz quem assistiu que"foi uma experiência fugaz, mas intensa". A banda prepara-se paralançar um novo disco, o primeiro sem o guitarrista Zé Pedro, embora inclua gravações feitas pelo músico que morreu em 2017.

O Diário de Notícias dá conta de uma nova greve dos guardas prisionais. Da próxima quarta-feira até 3 de fevereiro os reclusos ficam 22 horas por dia nas celas, terão apenas uma hora de visita por semana, e deverão faltar a tribunal e ao trabalho.

Mulher, marxista, pacifista, revolucionária, "uma das melhores cabeças do socialismo internacional" - Rosa Luxemburgo foi assassinada há cem anos. A RTP recorda a sua história aqui.

AS MANCHETES DE HOJE

Correio da Manhã: Governo corta benefícios na ADSE
Negócios: Governo faz balanço "favorável" das PPP na Saúde
Jornal de Notícias: Crianças diabéticas forçadas a picadas por falta de dispositivo
Público: Plano para tornar casas mais eficientes falhou em toda a linha
i: "Há uma justiça para ricos e uma justiça para pobres"

O QUE ANDO A LER

Não vi a série “The Handmaid’s Tale”. Não recorro à pirataria para ouvir música, ler jornais, nem ver filmes ou séries de televisão, por muito que me interessem. Tanto quanto sei, em Portugal a única via legal de ver essa série da Hulu é através de um operador de cabo de que não sou assinante, por isso, mantenho-me fora desse buzz (já agora: é impressionante a quantidade de gente razoável e bem formada que não roubaria nada… a não ser direitos de autor, e se recusa a reconhecer o quanto é errado recorrer à partilha ilegal de conteúdos, seja de entretenimento ou de informação. Adiante...)

A vantagem de não ter visto a série é o prazer com que estou a ler o livro de Margaret Atwood que lhe deu origem ("A História de uma Serva" está editado em Portugal pela Bertrand). Trata-se de uma distopia que nos apresenta a República de Gileade, nome dos Estados Unidos do futuro, transformados num regime teocrático, fundado por fundamentalistas religiosos depois de acontecimentos que para mim (que ainda estou a meio do livro) não são claros - há uma guerra em curso e há uma dramática crise de fertilidade, e ambas estão na origem de uma sociedade totalitária em que todos têm papéis perfeitamente definidos e são rigorosamente vigiados. É também uma sociedade profundamente puritana, com a Bíblia como livro fundador, e misógina até à medula: os homens governam, as mulheres obedecem, e umas obedecem mais do que outras. Não podem ler, só podem falar com quem são supostas, e, sendo uma sociedade militarizada, usam roupas pré-definidas, como se fossem fardas. O seu espaço é dentro de casa.

A protagonista, Offred (não é o seu nome, mas o que lhe foi dado pelo Estado), é uma Serva, uma das várias categorias em que estão estratificadas as mulheres. As Servas têm como único papel engravidar dos Comandantes (figuras da nomenclatura militar e política) e dar à luz crianças que devem ser entregues às Esposas dos Comandantes. No passado, Offred teve um marido, uma filha, e aquilo a que podemos chamar uma vida normal, com as grandes e pequenas coisas das quais muitas vezes nem se dá conta - aquilo que a protagonista recorda repetidamente, como forma de não se deixar afundar na existência brutal, impessoal e invisível que lhe está destinada.

Esta é a minha estreia na obra da escritora canadiana, e a primeira coisa que me cativou foi a escrita, simultaneamente direta e lírica. Há um tom onírico na narrativa que transmite ao leitor a sensação de irrealidade - diria até imaterialidade - em que a protagonista vive. A segunda coisa que me impressionou foi descobrir que o livro é de 1985. A tecnologia existente neste futuro alternativo não tem nada de futurista, e fica-se pela que existia na primeira metade dos anos 80. No entanto, as questões levantadas pela obra são tão atuais, e algumas ameaças parecem extrapoladas de perigos tão contemporâneos, que é dificil acreditar que o livro tem 34 anos. Suponho que seja isso que faz um clássico.

A autodeterminação da mulher, a violência de género, o fanatismo religioso, a recusa da ciência e da cultura, a rejeição de quem é diferente, o fim da privacidade, a reacção violenta dos ultras contra os “excessos” de liberdade ou os “excessos” do feminismo… até há um Muro que serve como símbolo do poder.

Fui à procura de críticas antigas ao livro, para perceber se este era tão pertinente quando saiu como é hoje. Encontrei poucas, mas dei com esta, publicada pelo New York Times em fevereiro de 1986. A autora aponta várias objeções à obra, e uma delas é esta: “o livro não me diz a que é que, nos nossos atuais costumes, eu devo estar atenta se não quiser que os EUA se tornem num Estado de escravos como a República de Gilead”. Talvez as ameaças de “A História de uma Serva” sejam mesmo mais atuais hoje do que quando o livro foi publicado.

Tenha uma boa segunda-feira e uma boa semana, apesar do frio que aí está e da chuva que vem aí.

Moçambique | Mário Macilau: Levar a fotografia às comunidades e contrariar a arte para as elites


Fotógrafo moçambicano está a construir residência artística longe de Maputo para aproximar arte e comunidades. Em entrevista à DW, critica falta de apoio do Governo.

Mário Macilau quer levar a fotografia às comunidades e acabar com a percepção, ou realidade, de que a arte é só para as elites e de que o seu lugar é apenas a galeria.

Para isso, o fotógrafo moçambicano está a construir uma residência artística longe da metrópole Maputo, justamente para aproximar artistas e comunidades.

Quanto a parcerias com outros fotógrafos moçambicanos, Macilau diz que desistiu, pois há muita coisa que origina o seu fracasso, pelo que pode contar apenas com trabalho "a solo".

DW África: O que tens estado a fazer nos últimos tempos?

Mário Macilau (MM): Tenho estado a fazer quase o mesmo: trabalhar à medida em que vou pesquisando. E trabalhar para mim é muito consistente. Embora vá mudando com o tempo, vou tendo novas ideias em termos de temas e também porque para mim a fortografia, de uma forma geral, não é uma coisa estática. Então, tenho estado a aprender com o avanço da tecnologia, com a introdução da fotografia digital, tenho estado a trabalhar nisso. Isso criou alguma possibilidade de refletir sobre o que eu fiz, despertando algo em mim.

A maioria do projetos que fiz no passado era tão relevante que merecia uma continuação. Por mais que eu tenha feito um projeto há três anos, os temas continuam lá e sofreram as suas mudanças, evoluções e transformações. Eu também, como humano, tenho as minhas, à medida em que vou crescendo e aprendendo, vejo a vida de uma outra forma. Com isso, quero dizer que tenho estado a mexer nalguns projetos que não consigo largar - como o movimento religioso Mazione, estou a trabalhar nisso desde 2016.

DW África: Para além dessa recorrência de temáticas, alguma coisa mudou. O que é novo na tua temática?

MM: Como acabei de dizer, Moçambique está a mudar. E o que mais me chama a atenção é a preservação de valores culturais. Quando chegas a Maputo, vês na praia da Costa do Sol jovens que praticam essas crenças e rituais [maziones], mas quando te encontras com eles no escritório não querem que os reconheças. Para mim, isso tem a ver com o capitalismo, com a globalização que estamos a viver. Estamos a tentar fugir da nossa cultura para aceitar a cultura globalizada, algo que, a meu ver, não deveria existir. Nesse sentido, uso a fotografia como uma forma de incentivar e preservar esses valores culturais para que um dia sejam lembrados. Como se diz, a fotografia é a memória e o testemunho.

DW África: Tens projetos pessoais. Queres falar-nos de alguns deles?

MM: Esse é um dos projetos pessoais que vai resultar num livro que vai sair já em março e também estou a pesquisar outros temas em Moçambique.

DW África: E projetos que beneficiem moçambicanos, como, por exemplo, oficinas de fotografia?

MM: Já há alguns anos que tenho estado a tentar fazer em Moçambique e isso tem sido complicado devido ao nosso famoso coro, que são as condições e os interesses do Governo. Mesmo assim, não sou de culpar os outros e de parar, mas não é fácil. Tentei fazer muitas coisas, como o festival de fotografia, que nunca chegou a funcionar, tentei criar alguns prémios que não chegaram a funcionar e, neste momento, estou a afastar-me um pouco de algumas energias a nível local, criando projetos pessoalmente.

Estou a montar o meu centro de residência na Ponta de Ouro e tenho o objetivo de convidar artistas de fora e locais que possam criar projetos de modo a beneficiar a comunidade local e a educar a mesma comunidade para que ela também entenda sobre a arte, porque muitas vezes o artista cria projetos na comunidade e depois leva para uma galeria que está no centro da cidade e quem frequenta é a elite. E depois, quando criamos projetos, a comunidade não entende e reclamamos que a sociedade não entende nada.

DW África: Disseste que tiveste projetos que não funcionaram. Quais foram os entraves?

MM: Nesse projeto como fotógrafo quis convidar pessoas para participarem, porque ninguém pode fazer nada sozinho. Estava a andar tudo bem e as pessoas prometiam associar-se, mas, na prática, não o faziam. Aquelas que aceitaram participar depois sentiram um peso. porque não tinham nenhum retorno financeiro. porque não temos nenhum apoio ou parceria a nível local. Até havia parcerias, mas só ofereciam o espaço.

DW África: E que tipo de colaboração tens com o Ministério da Cultura?

MM: Não gosto muito de ser pessimista, mas isso não existe.

DW África: Não há nenhum tipo de aproximação? Não há fóruns específicos onde fotógráfos, por exemplo, se encontrem periodicamente com algum departamento para discutir o andamento do mundo da fotografia?

MM: Quanto ao Ministério da Cultura, não existe mesmo nada, pelo que sei. Também reconheço que é uma instituição política e administrativa, mas ela não funciona de modo a colaborar com artistas a nível local. E não é só ao nível do Ministério, tenho estado a expor muito pelo mundo fora e não existe nenhum interesse da embaixada de Moçambique em querer, pelo menos, ver a exposição de um moçambicano. Existiram apenas dois cônsules que foram muito simpáticos, como é o caso de Carlos dos Santos, na altura em Londres e agora nos Estados Unidos, que faz sempre visitas aos artistas e acomoda-os muito bem. Também há  outro embaixador que está no Dubai. Em quinze anos de exposições no estrangeiro, devo dizer que nunca tive esse apoio do Governo.

Nádia Issufo | Deutsche Welle

Moçambique deixar de pagar os empréstimos ilegais não é opção mesmo com julgamento nos EUA


A expectativa que os moçambicanos têm que um julgamento nos Estados Unidos da América de Manuel Chang, e dos outros arguidos no caso das dívidas ilegais, traga alguma Justiça para o nosso país é utópica. 

As autoridades norte-americanas estão a agir pois investidores do seu país foram defraudados pela Proindicus, EMATUM e MAM e a sua moeda foi usada para pagar corrupção e em outros crimes. Moçambique deixar de pagar os empréstimos ilegais não é opção do Governo de Nyusi mas também não é o desejo dos Parceiros de Cooperação ou mesmo pelo Fundo Monetário Internacional.

“Através de uma série de transacções financeiras, aproximadamente entre 2013 e 2016, a Proindicus, a EMATUM e a MAM contraíram dívidas no total de 2 biliões de dólares norte-americanos através de empréstimos garantidos pelo Governo moçambicano. Os empréstimos foram organizados pelo Banco de Investimento 1 e pelo Banco de Investimento 2 e vendidos a investidores em todo o mundo, inclusive nos Estados Unidos. No decurso das transacções, os co-conspiradores, entre outras coisas, conspiraram para defraudar investidores e potenciais investidores nos financiamentos da Proindicus, EMATUM e MAM através de várias deturpações e omissões relativas, entre outras coisas: (i) finalidade do dinheiro dos empréstimos, (ii) pagamentos de suborno a funcionários do Governo moçambicano e a banqueiros, (iii) o montante e datas da maturação da dívida pública da Moçambique, e (iv) a capacidade e a intenção de Moçambique reembolsar aos investidores” pode-se ler no Despacho da acusação contra Manuel Chang, António Carlos do Rosário, Maria Isaltina Lucas deixando evidente que ao United States District Court for Eastern District of New York não interessa a violação da Constituição de Moçambique e das leis orçamentais.

O @Verdade apurou que para além da Auditoria da Kroll tem sido fundamental para a acusação norte-americana a colaboração prestada pelo banco Credit Suisse que pretende passar a sua irresponsabilidade institucional apenas para os seus antigos funcionários que lideram como os empréstimos para Moçambique.

É que se ficar provado que o banco suíço, e também o russo VTB, cometeram ilegalidades no processo de concessão dos empréstimos e na sua colocação nos mercados financeiros serão eles os responsáveis por ressarcir aos investidores das dívidas da Proindicus, EMATUM e MAM.

Portanto independentemente dos três moçambicanos, assim como os banqueiros e responsáveis do fornecedores, serem condenados nos EUA o nosso país não resolve um dos problemas principais criados pela Proindicus, EMATUM e MAM que é terem tornado a Dívida Pública insustentável e o seu pagamento tornar ainda mais sombrio o futuro do povo moçambicano.


FMI e Parceiros de Cooperação nunca recomendaram não pagar as dívidas ilegais

Embora especialistas em Direito, nacionais e estrangeiros, afirmem existir matéria para que o Governo de Filipe Nyusi repudiasse aos empréstimos e não os aceitasse pagar essa nunca foi a sua vontade.

Desde que tornou-se Presidente Nyusi esforçou-se por legalizar as dívidas Proindicus, EMATUM e MAM e está a renegociar o seu pagamento com os investidores quiçá para proteger-se, assim como aos restantes “camaradas” de partido envolvidos na fraude, mas também porque o mundo capitalista a isso o obriga.

A verdade é que não pagar as dívidas ilegais não é opção para Moçambique sob pena de continuar um Estado pária nos mercados financeiros globais e o Investimento Directo Estrangeiro que tem minguado continuar parco.
Importa ainda recordar que para o Fundo Monetário Internacional(FMI) o questão fundamental das dívidas nunca foi a sua inconstitucionalidade e ilegalidade mas apenas o facto de serem ocultas.

Aliás desde o início de 2018 que Moçambique deixou de estar na situação de misreporting relativamente a informação macroeconómica e a última missão do FMI que visitou Moçambique, em Novembro passado, já nem mencionou as lacunas por preencher na Auditoria da Kroll tendo acolhido “com agrado os esforços contínuos da Procuradoria-Geral da República, em cooperação com os parceiros de desenvolvimento, para trazer responsabilização relativamente à questão das dívidas anteriormente ocultas”.

Mesmos os Parceiros de Cooperação que suspenderam grande parte do seu apoio ao nosso país como forma de forçar a investigação sobre os dívidas da Proindicus, EMATUM e MAM nunca advogaram que Moçambique deveria repudia-las e não paga-las, afinal os investidores defraudados por Manuel Chang, António Carlos do Rosário, Maria Isaltina Lucas e companhia são oriundos dos seus países e pretendem receber, com lucros, o dinheiro que investiram apesar de todas ilegalidades e corrupção.

Paradoxalmente o banco que é mentor das dívidas ilegais é suíço, país que lidera o grupo de contacto nas negociações para a paz definitiva em Moçambique. Até hoje a Presidência da República não tornou pública as razões da visita “secreta” de Filipe Nyusi ao país europeu no passado dia 13 de Setembro.

Importa ainda recordar grande parte dos 2,2 biliões de dólares não foi gasto em Moçambique os barcos, os radares e outros equipamentos que não estão a ser usados foram adquiridos principalmente em países da União Europeia. Até mesmo os subornos que terão sido pagos não vieram na íntegra para o nosso país.

Adérito Caldeira | @Verdade

Angola | Operação Resgate: "A única coisa que mudou é o nome"


Polícia prometeu reforçar "Operação Resgate", que está em curso em Angola. Mas críticos do Governo dizem que, para a população, "nada mudou" e lamentam falta de alternativas.

Para o politólogo angolano Agostinho Sicatu, a "Operação Resgate" não trouxe nada de novo. Segundo o especialista, a polícia continua a agir como no passado, antes da operação começar, em novembro.

"É uma operação que a polícia vem levando a cabo há algum tempo. A única coisa que mudou é o nome: 'resgate'. Mas são as mesmas ações, aumentou até o grau de tortura aos cidadãos. Hoje, os cidadãos vão tendo mais medo da polícia. Mas, de modo geral, não mudou absolutamente nada", afirma Sicatu. "Na vida do cidadão, não trouxe nenhuma novidade."

Promessa de "mais força"

A "Operação Resgate" visa "repor a autoridade do Estado". Até aqui, muitos estabelecimentos comerciais e igrejas já foram encerrados. Mas os fiéis continuam a exercer a sua liberdade religiosa, ainda que à porta fechada, como constatou a DW no Zango II, em Luanda. E, nas ruas da capital, as vendedoras ambulantes voltaram à sua atividade, embora de forma cautelosa.

polícia prometeu, para este ano, "mais força" na "Operação Resgate". Angola "precisa de ordem, disciplina e respeito pelas pessoas e instituições", afirmou na semana passada o comissário-chefe Paulo de Almeida.

O ativista Benedito Jeremias concorda que o Estado precisa de resgatar os seus valores, mas também defende medidas preventivas, como a criação de postos de trabalho para a juventude, a maior franja da sociedade no desemprego.

"É verdade que o Estado precisa de ser organizado, as instituições precisam de ser organizadas, a sociedade também deve obedecer às leis que estão estabelecidas para evitar o açambarcamento ou a danificação das instituições públicas, mas, para tudo isso, o Estado precisa de preparar-se."

Para Benedito Jeremias, o sucesso da "Operação Resgate" depende, em grande medida, da eficácia das políticas públicas.

Com a "falta de políticas públicas sérias, capazes de fomentar emprego de qualidade, as pessoas encontram no mercado informal uma alternativa para a sua empregabilidade", diz o ativista. "O Estado, ao tomar essas medidas, está a criar também dificuldades para as pessoas."

Manuel Luamba (Luanda) | Deutsche Welle

Angola | "Também há corrupção nas Forças Armadas"

No JA de hoje (14) podemos ler a entrevista em que Correia Neto “encosta às cordas” a corrupção que existe nas Forças Armadas.

Para já trazemos ao PG um ligeiro “levantar do véu” da entrevista que é manchete e que certamente vai despertar bastante interesse. O jornal em papel já está a circular em Luanda, mas ainda não online.

Sobre o tema pode ler no JA:

“Em entrevista ao Jornal de Angola, o embaixador na Alemanha, Alberto Correia Neto, admite que também há muitos casos de corrupção nas Forças Armadas, onde “pessoas que já não existem” continuam a constar das folhas de salário. O também general e antigo comandante da Força Aérea Nacional crítica, por outro lado, a teoria de perseguição da deputada “Tchizé” dos Santos.”

Angola | Orfandades


Anda o país mergulhado na perspectiva do que poderá vir a ser o ano que há dias começou, inquietado entre as dúvidas se os sacrifícios em 2019 serão maiores ou se haverá  alguma bonança para aliviar as dificuldades por que passa a maioria  dos cidadãos.
  
Jornal de Angola | editorial

Os discursos políticos são enigmáticos e nem sempre reveladores da dimensão de algumas medidas que o Governo está a tomar ou pensa vir a  tomar. As análises de várias agências e bancos internacionais vocacionados na avaliação das perspectivas de desempenho económico dos países  variam consoante o gosto. Há as mais positivas, que alimentam a esperança em dias melhores, e há, também, as pessimistas, que apontam para uma realidade de maior austeridade. 

É no meio dessas dúvidas que a maioria dos angolanos e das famílias inicia o ano, torcendo para que a economia possa dar um salto e abrir mais postos de trabalho, para que se possa produzir internamente pelo menos aquilo que necessitamos para a nossa dieta alimentar, deixando as divisas para as máquinas e equipamentos, para as peças e sobressalentes, para alguns insumos e  para o know how, invertendo a prática, errada, de quem compra é que fica rico ao invés de quem vende, que era o paradigma que se impôs e fez aumentar grandemente o fosso das desigualdades sociais entre os angolanos. 

Um figurino que foi imposto por uma minoria de privilegiados que não se conforma com as mudanças que se estão a operar no país e torcem, de todas as formas e maneiras, para que se agudizem as condições de vida da maioria e, com ela, cresça o movimento reivindicativo e se quebre a paz social para abrir caminho à desejada crise política que poderia, no seu entender, levar ao regresso dos “velhos bons tempos”!  

E para isso não hesitam nos meios e formas, incluindo até as mais espúrias alianças, para manter-se  sob os holofotes e na ribalta, quais aparecedores predestinados, onde procuram passar uma imagem e comportamentos imaculados, como se não houvesse memória colectiva do que se passou e de como conseguiram os títulos que tão gananciosamente ostentam. 

Desconhecedores do país real, das dificuldades por que passa o comum dos cidadãos no seu dia-a-dia que agora exaltam para erguer a bandeira da crise, avançam com teorias e profecias de uma Angola que só era boa quando lhes cobria os apetites insaciáveis e que julgavam tratar-se de uma propriedade privada.  

Afastada essa realidade, quando se procura tornar o país mais inclusivo, mais normal, onde cada um possa ter  oportunidades sem ter necessidade de ter apelido divino, procuram mascarar os factos, misturam alhos com bugalhos, comparam o incomparável para confundir os menos atentos, surgindo como que  quais salvadores da Pátria. 

O combate à corrupção é ilimitado temporalmente. Não se ganha com meia dúzia de prisões ou com a condenação de uns quantos comprovadamente culpados. O país esteve à saque, por décadas e criou-se uma cultura de apropriação indevida dos bens públicos, do descaminho das verbas atribuídas  aos mais diversos programas de satisfação das necessidades das populações. E como  os exemplos copiam-se de cima, a sociedade foi impregnada desse mal, procurando cada um à sua escala, impor a lei da gasosa consoante o seu grau de influência e de intervenção. 

Por isso não se adivinha  fácil essa cruzada contra a corrupção, que passa pela moralização da sociedade. E o primeiro passo nesse sentido é, efectivamente, o fim da impunidade e a não repetição de práticas erradas de um passado recente, com maior transparência nos actos administrativos e na gestão do erário. Dispensar o supérfluo e dirigir as atenções para o que é, efectivamente, prioritário, dividindo melhor os sacrifícios para que não sejam sempre os mesmos a pagar a factura do fracasso de políticas e programas que perseguiam uma mania das grandezas que se institucionalizou entre nós. 

Portanto, os tempos do passado deixaram muitos órfãos, muitos deles ainda na dúvida se as mudanças em curso são para valer ou  para “inglês ver”. Por isso colocam-se  em cima do muro, a ver para que lado irá seguir o processo, chegando mesmo a consentir, com o seu silêncio comprometedor, o beneficio da dúvida ante  insinuações torpes em que se pretende comparar resultados e práticas de meses com os de décadas.  

Décadas onde não são conhecidas acções e posicionamentos que questionavam o status quo, que afinal não era mais do que a materialização de um vasto plano de açambarcamento total do país, para manter uma trajectória dinástica, felizmente interrompida pela conjugação de uma série de factores que estão a possibilitar que haja hoje uma esperança renovada de que será possível inverter o quadro, desde que se faça, efectivamente, uma ruptura com o passado e se siga uma agenda que atenda directamente às preocupações  dos cidadãos.  

Sem fantasmas de crises políticas internas, seja entre os diversos contendores, seja intramuros no partido no poder, por uma mais que normal discordância quanto a interpretações de números protagonizada pela antiga e a nova liderança que não pode, nem deve,  ser confundida com o insucesso de uma transição política que foi, de facto, exemplar, com os seus altos e baixos potenciados pelos apetites bicéfalos.

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