quinta-feira, 2 de abril de 2020

Guiné-Bissau | "A liberdade de imprensa está ameaçada"


Vários profissionais da comunicação social na Guiné-Bissau têm sofrido ameaças contra a integridade física. Sindicato vai apresentar queixa junto das autoridades do setor.

Nos últimos tempos, as agressões verbais e físicas têm sido frequentes contra os jornalistas na Guiné-Bissau. Alguns casos envolveram inclusive figuras políticas. Em entrevistas e conferências de imprensa de políticos e dirigentes, os jornalistas têm sido atacados por militantes e simpatizantes dos partidos e até por altos responsáveis do país.

A rádio privada Capital FM, sedeada em Bissau, viu, num curto espaço de tempo, os seus profissionais serem chamados à Justiça ou agredidos.

Serifo Tawel Camará, da Capital FM, conta à DW África que foi vítima de agressão por homens armados, "não identificados" e com uniformes da polícia. "Apareceram e atacaram-me logo à porta da rádio, não sei qual era a intenção dessas pessoas", recorda.

A intimidação contra os jornalistas da Rádio Capital não é de agora, segundo Camará. "Na semana passada foi notificado Sabino Santos, no Ministério Público, e no dia seguinte foram notificados dois profissionais da Rádio Capital, Adão Ramalho e Ansumane Só."

Outro caso registado na semana passada é o de Iaia Samá, jornalista da Rádio Cidade FM, que, através de um post no Facebook, informou que "por razões de ameaças à integridade física, deixará, por enquanto, de apresentar o programa 'Bom Dia Cidade'", um espaço de interação com os ouvintes sobre os assuntos do país.

Sindicato vai contactar autoridades

A presidente do Sindicato Nacional dos Jornalistas e Técnicos da Comunicação Social (SINJOTECS), Indira Correia Baldé, não tem dúvidas de que "a liberdade de imprensa e de exercício da profissão está ameaçada".

O SINJOTECS promete encetar contactos com o Ministério do Interior e a Polícia Judiciária "para reportar os factos e ver como é possível reverter estas ameaças que os profissionais da comunicação social estão a enfrentar no momento".

O decano da comunicação social guineense, Lamine Djata, diz que "é uma tentativa vã" pretender calar os jornalistas.

"A liberdade de imprensa pertence aos jornalistas. Não vejo a forma de as pessoas imiscuírem na sua aplicação prática sem serem jornalistas", afirma. Djata acredita que essa é certamente uma "guerra perdida, porque nunca a classe jornalística perdeu uma guerra deste tipo".

Para o jornalista e professor universitário João Umpa Mendes, com toda a pressão sobre os profissionais da comunicação social, há um ponto positivo a realçar: "Há uma coisa que eu vejo como resultado de alguma evolução. Quando os jornalistas são chamados às instâncias judiciais, isso mostra que é essa a postura que deve ser observada", defende.

Umpa Mendes não quer acreditar que haja, salvo algumas exceções, colegas que escrevem premeditadamente artigos ou peças "para prejudicar essa ou aquela figura". Por fim, defende que os órgãos de comunicação social devem continuar a desempenhar o seu papel, "independentemente das pressões, e fazer também com que as pessoas que tentam fazer essas pressões compreendam que os jornalistas estão só a fazer o seu trabalho".

Condições precárias

Para além das ameaças, o exercício jornalístico na Guiné-Bissau é caraterizado por falta de condições de trabalho. Há dificuldades dos órgãos de comunicação social até para cumprir com o básico, para que os jornalistas sejam mais livres no seu desempenho profissional.

A liberdade também é condicionada por censura nos órgãos públicos para atender a orientações políticas. Em setembro de 2017, os funcionários da televisão pública guineense subscreveram uma petição para exigir o fim da censura na única estação televisiva do país.

Iancuba Dansó (Bissau) | Deutsche Welle

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