Rafael Barbosa* | Jornal de Notícias | opinião
Não é segredo para ninguém, menos ainda para os decisores políticos. Nas nossas cidades, em vez de ordenamento, temos desordenamento do território. A impermeabilização dos solos é a regra, seja pelo cimento das construções, pelo alcatrão das ruas ou pelo encanamento das linhas de águas que, mais cedo do que tarde, saem dos eixos, destruindo tudo. A ocupação dos leitos de cheia é a regra e não a exceção, porque foi assim que fomos ocupando o território e porque não há melhor promoção para um novo investimento imobiliário do que anunciar a vista rio ou a vista mar. E nada disto vai mudar, porque custaria muitos milhões realojar famílias e negócios. E, finalmente, temos as alterações climáticas, como fica de novo provado por esta alternância esquizofrénica em que, de uma estação para a outra, passamos da seca extrema para o dilúvio.
Nenhuma surpresa, portanto, quanto aos sucessivos cataclismos que por estes dias assolam Lisboa e outras zonas mais a sul. Para o ano, talvez seja a vez do Norte, e no seguinte do Centro. Um pouco como os fogos de verão, que vão destruindo o país um pedaço de cada vez. É possível apostar sem receio de perder que, mesmo em Lisboa, se o sol espreitar e o calor espevitar nas próximas semanas, o desastre será esquecido. Lá diz o adágio que, depois da tempestade, vem a bonança. É esse o fado que condiciona o cidadão comum e dá jeito aos políticos e, por consequência, guia as suas políticas. A tentação é sempre a de olhar para o problema imediato, remediar o que for possível, dar uma pancadinha nas costas nos casos em que já não haja nada a fazer e deixar as soluções duradouras para uma qualquer comissão eventual. São decisões e obras pouco apetecíveis, caras, sem visibilidade, sem ganhos imediatos, que não dão para corte de fitas. No próximo inverno, voltaremos a falar disto. Se sobrevivermos ao verão.
*Diretor-adjunto
Sem comentários:
Enviar um comentário