Artur Queiroz*, Luanda
Hoje é um grande dia. Está confirmado que temos um Peron pai do lourencismo e está na forja a nossa Evita, que já começou a ensaiar a canção Não Chores Por Mim Angola. O saco do arroz em breve desce para preços rastejantes, os candongueiros cobram 20 Kwanzas a corrida e a inflação desce vertiginosamente. No máximo, 240 por cento, apenas cem vezes mais do que prevê o senhor ministro Massano. Só um povo eleito pode usufruir de tantas benesses.
Hoje é um dia grande porque já habitam no parque do Iona girafas treinadas para comer areia e pedras em vez de acácias. Um dia destes, graças ao Presidente João Lourenço, vão ser acompanhadas e cobertas por camelos. Os sicários da UNITA nem acreditam que vão ser contemplados com fêmeas de longos pescoços.
Hoje é o dia maior dos grandes dias que vivemos desde 2017. Os representantes dos assassinos golpistas do 27 de Maio dizem que o golpe de estado militar não foi um conflito político. Nada disso. Segundo as organizações e os seus membros que vivem à custa do sangue e vidas das vítimas desde 1992, o golpe “tem de ser entendido como um processo de desaparecimentos forçados, seguidos de execuções sumárias e extrajudiciais”. Por isso querem uma “investigação histórica” a cargo do Carlos Pacheco, Silva Mateus, da Chica e de outros escravos da verdade. Viva Portugal e as suas colónias.
Em 1977 Angola era uma democracia popular na via do socialismo. Em 1977 o MPLA era uma organização revolucionária e seus militantes cavaram trincheiras onde defendiam intransigentemente, heroicamente, a revolução em África. Em 1977 o Presidente da República não era Peron nem impunha o lourencismo. A primeira-dama não era Evita nem facturava com a Fundação Ngana Zanza. Eu sei que para esta tropa Angola só existe desde que João Lourenço chegou aso poder. Mas estão errados. E lá atrás, no início, nem tínhamos onde comprar um quilo de fuba quanto mais Tribunais e juízes.
Em 1977 os golpistas tomaram de assalto o quartel da IX Brigada que na época era a maior unidade militar de Angola e uma das maiores de África. Tomaram de assalto a sede da DISA (Segurança de Estado). Tomaram de assalto a prisão de São Paulo. Convidaram mercenários e outros prisioneiros de guerra a saírem das suas celas e juntarem-se ao golpe. Em 1977 os golpistas tomaram de assalto a Rádio Nacional de Angola. Prenderam e mataram quem se lhes opôs. Cantaram vitória. Disseram aos microfones que os golpistas tinham derribado o governo legítimo.
Em 1977 os golpistas decapitaram o Estado-Maior General das FAPLA. Assassinaram cruelmente os Comandantes Nzaji, Eurico, Bula Matadi e Dangereux. Só não mataram o chefe máximo das Forças Armadas, Comandante Xyetu, porque o seu motorista conseguiu fugir a tempo dos golpistas. Prenderam e levaram à força para a IX Brigada o Comandante Petrof, responsável máximo do Corpo de Polícia Popular de Angola, hoje Policia Nacional. Salvou-se do fuzilamento graças a um estratagema. O comissário político da polícia, Comandante Tetembwa andou a fugir aos golpistas nas ruas de Luanda. Até foi perseguido por um tanque de guerra!
Gravíssimo. Os golpistas montaram uma cilada ao ministro das Finanças, Comandante Saidy Mingas. Foi preso e torturado até à morte. Vingança por ele ter acabado com o “escudo” numa operação secreta que ele e Agostinho Neto dirigiram. O pai do Kwanza foi assassinado com requintes de malvadez.O Comandante Monstro Imortal, afilhado de Agostinho Neto, tinha a missão de matar o Presidente da República e líder do MPLA, explorando a proximidade entre ambos. Foi o único golpista que teve a dignidade e a cortagem de assumir as suas responsabilidades.
Em Maio de
Os Tribunais fecharam ou funcionavam de uma forma precária. O Ministro da Justiça, Diógenes Boavida, mobilizou funcionários judiciais para porem a funcionar algumas estruturas do Poder Judicial. Um esforço tremendo mas obviamente insuficiente. Praticamente não existiam advogados. Em 1977, Agostinho Neto e Diógenes Boavida decidiram que Angola tinha de ser um Estado Revolucionário e de Direito. Em Angola não existia o curso de Direito. A primeira coisa que fizeram foi criar condições para instalar uma Faculdade para formar os primeiros servidores do Poder Judicial. O projecto só se concretizou depois do golpe.
Em 1977 Angola era um país
Em 1977 o poder era exercido pelo MPLA. As forças de defesa e segurança eram comandadas por dirigentes do MPLA. O Chefe de Estado era líder do MPLA. O MPLA era a vanguarda revolucionária do Povo Angolano. Nos estatutos do MPLA os crimes de traição, sedição e deserção eram punidos como fuzilamento. Regras da Revolução.
Em 1976, logo nos primeiros meses de existência da República Popular de Angola, os membros da direcção política e militar do golpe de 27 de Maio prenderam, torturaram e fuzilaram muitos angolanos por serem “contra revolucionários” ou sabotadores do processo produtivo. Eu escapei por pouco. Obrigado, camarada Lúcio Lara. Salvou-me a pele. Nito Alves foi o idiota útil dos golpistas nessas matanças, porque desempenhava o cargo de ministro do Interior, sem saber ler nem escrever. Era uma marionete.
Em 1977 o edifício do Poder
Judicial estava a ser construído mas ainda não tinha passado dos alicerces. Não
existiam magistrados nem funcionários judiciais. Mas estava a ser construído.
Os membros da direcção política e militar do golpe de estado de 27 de Maio
foram todos julgados
O Tribunal Marcial que julgou os
membros da direcção política e militar do golpe foi instalado no Ministério da
Defesa. Os juízes eram militares. Na época, os militantes do MPLA eram
políticos obrigados a pegar
É verdade que na contensão do golpe militar foram detidos cidadãos que andavam na rua. Uns eram apoiantes dos golpistas. Outros apenas curiosos. Nada tinham a ver com os golpistas. Não foi feita uma triagem e todos tiveram o mesmo tratamento. São vítimas do golpe. Mas os responsáveis foram os golpistas.
Hoje é um grande dia. O senhor ministro da Cultura disse que está preocupado com a proliferação de igrejas. Maravilha. Cá por mim, uma é demasiado. Zero é a conta certa. Por favor, Filipe Zau. Livra-nos das quitandas do ópio do povo. A ganza de ópio é lixada. Ficamos quietinhos, sossegados, sem mexer, quase anestesiados mas extremamente lúcidos. Não é uma boa viagem.Hoje é um grande dia. O Brigadeiro Mualupassa da UNITA confirmou que o General Begin morreu mesmo vítima de um conflito grave com a diabetes. Leiam o seu depoimento: “Ninguém pode ousar dizer que foi vítima de assassinato. Aquando do recuo de Andulo, em 1998, o General Begin encontrava-se no Hospital do Chikumbi, de onde viajou até as áreas da Lúbia e, próximo das Comunicações Fixas, fixou a sua residência. Visitamo-lo eu e o Brigadeiro Xanja.
Nessa altura, pediu-nos que fizéssemos uma mensagem ao General Chimuku a pedir medicamentos, principalmente insulina. Saindo dali, não só fizemos a mensagem como também comunicamos ao Velho (Jonas Savimbi) sobre o estado de saúde do General, que era péssimo, com dificuldades de se locomover. Pouco tempo depois, o Velho enviou emissários em sua busca.
Nessas andanças, reencontramo-nos no Tchanji, onde ocorreu o seu falecimento por doença que vinha sendo acometido. Teve um funeral com honras correspondentes ao momento, num pequeno cemitério ao longo da estrada ou picada Luando-Chindumba-Kuemba. Como cemitério, era um local demasiado conhecido. Existem outros corpos que permanecem aí. Nada mais de especial”.
Já posso morrer descansado. Temos
Peron e Lourencismo. Temos Evita. Temos o negócio do 27 de Maio
* Jornalista
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