Cegos procuram
alternativas para sair da mendicidade
23 de Setembro de
2012, 10:11
André Catueira, da
agência Lusa
Chimoio,
Moçambique, 23 set (Lusa) - Debaixo de um sol matinal abrasador, Nércia Augusto
encosta à parede uma bengala de pau e acomoda-se no chão, junto ao passeio da
principal avenida de Chimoio, e estende a mão enquanto solta um 'gospel' para
chamar a atenção.
"Eu só
regresso a casa ao escurecer. Da doação que recebo apenas dá para comprar pão e
poucas vezes algo mais consistente. É com isso que consigo sobreviver, pois não
tenho outra opção", explica à Lusa Nércia Augusto, de 23 anos, filha
primogénita de um casal de cegos.
Os factores sociais
e económicos são tidos como as principais causas da mendicidade entre os
deficientes em Moçambique.
Dependentes dos
trocados que recebem nos passeios da cidade e nos semáforos quando pedem
esmola, ficam expostos e vulneráveis ao VIH/Sida devido ao elevado índice de
violência e abusos sexuais.
"Estamos a
prestar apoio no aconselhamento quanto à postura e auto-estima. Também temos
muitos projectos em carteira para afastar os cegos da mendicidade", disse
à Lusa Francisco Tembo, presidente da Associação dos Cegos e Amblíopes de
Moçambique (ACAMO), em Manica, no centro do país.
Uma campanha da ACAMO,
de registo de deficientes, está em curso para se apurar o grau de necessidade e
vulnerabilidade de cada um, para melhor direcionar as atividades da associação.
Atualmente estão inscritos 639 membros em todos distritos de Manica.
Um projecto de
geração de rendimento, assente na produção de tapetes de sisal, tem contribuído
grandemente para a redução de mendigos nas ruas de Chimoio. Mas o fim de apoio
alimentar, de uma organização parceira, pode deitar abaixo a iniciativa.
"Tínhamos
apoio alimentar do governo e duas igrejas para permanência dos membros (para o
fabrico dos tapetes), mas foi cancelado antes de atingirmos a sustentabilidade.
Agora, recebemos, a título de doação, uma tonelada de sisal e a mão de obra
está fraca, precisamos contornar este défice", precisou Miguel Quembo,
membro da ACAMO.
A organização está
a procura de financiamento para mandar à formação 12 membros na área de
tecelagem, que deverão também ensinar os principiantes, como forma de envolver
mais deficientes na produção.
"Além da tecelagem,
o governo aprovou e financiou um projecto de produção de pão, que tem ajudado
muitos deficientes. Agora temos em carteira um projecto para instalação de uma
moagem que, além de atender os membros, iria contribuir para as suas
economias", precisou Tembo, que acredita em ações coordenadas para travar
a mendicidade.
Geralmente, os
portadores de deficiência visual levam consigo os filhos, para os guiar na
prática de mendicidade, mas uma campanha governamental, em coordenação com a
ACAMO, recolheu as crianças em idade escolar para que estudassem.
Atualmente, os
filhos guiam os pais no período em que estiverem livres, mas muitos abandonam a
escola para se dedicar a mendicidade com os progenitores.
O Conselho de
Ministros de Moçambique aprovou este mês o Plano da Área de Deficiência
2012-2019, com um orçamento de 890 milhões de meticais (254.2 milhões de
euros), para harmonizar as intervenções, do governo e parceiros, na assistência
a portadores de deficiência.
O Ministério da
Mulher e Acção Social moçambicano é o único órgão do governo que apoia
directamente os deficientes nas áreas de educação formal e psicossocial.
Em Chimoio, a
pobreza sai à rua todas as quintas-feiras, quando os mendigos vão receber
ofertas, às portas das lojas.
As autoridades
preveem a construção de três centros para receber as ofertas e proporcionar o
desenvolvimento de atividades de criação de rendimento.
Guebuza destaca
"êxitos" do partido no poder na abertura do X Congresso
23 de Setembro de
2012, 11:44
Luís Andrade de Sá, Agência Lusa
Pemba, Moçambique,
23 set (Lusa) - O Presidente moçambicano e líder da Frelimo, Armando Emílio
Guebuza, recordou hoje os êxitos do partido no poder em Moçambique na abertura
do X Congresso, do qual disse ser a "consagração da autoestima".
"Hoje, como
ontem, a defesa da autoestima e da unidade nacional estão no centro da agenda
política da Frelimo", disse Guebuza, que se mostrou convicto na
"vitória sobre a pobreza e a fome" no país.
Armando Guebuza
falava na abertura do X Congresso do partido, que se realiza em Pemba, 2.500
quilómetros a norte de Maputo, e que será marcado pelo início da sua sucessão
na chefia do Estado, em 2014, mas consagrando-o como líder da Frelimo.
Evitando referir-se
a essa futura situação de "duplo poder" no país, Guebuza destacou as
"vitórias" da Frelimo, que, disse, têm permitido um crescimento
económico superior a sete por cento nos últimos anos, associando-o à recente
explosão dos recursos minerais.
A Frelimo dá
"ênfase à necessidade de que os resultados beneficiem os moçambicanos que
se devem sentir donos desses recursos", disse Guebuza, referindo-se à
prospeção de carvão, gás, petróleo e outros minerais que, nos últimos anos,
atraíram grandes multinacionais ao país.
"A mensagem é:
continuemos todos a construir em Moçambique um Moçambique que nos deve
orgulhar", disse Guebuza, na abertura do congresso, transmitida em direto
pelos canais públicos de televisão, TVM, e de rádio, RM.
Mais de 1.950
delegados foram eleitos pelos cerca de 3,5 milhões de membros da Frelimo para
os representarem no X Congresso, que se realiza exatamente 50 anos depois do I,
então na capital da Tanzânia, Dar-es-Salaam.
Representantes do
MPLA, de Angola, PAIGC, da Guiné-Bissau, PAICV, de Cabo Verde, Fretilin, de
Timor-Leste e dos portugueses PS e PSD assistem ao congresso, lado a lado com
elementos dos partidos comunistas ainda no poder - China, Cuba, Vietname e
Coreia do Norte - e de partidos regionais, como o sul-africano ANC e o
zimbabueano ZANU-PF.
Preços altos e
contradições sob o sol escaldante de Pemba
23 de Setembro de
2012, 15:09
Luís Andrade de Sá
(texto) e António Silva (fotos), Agência Lusa
Pemba, 23 set
(Lusa) - Por uma semana, o poder político de Moçambique mudou-se para Pemba,
uma cidade no norte, habitualmente sonolenta e que ainda não despertou
completamente para os efeitos da invasão: hotéis cheios, voos lotados e preços
mais caros.
"Desde quando
é que um prato de lulas custa 400 meticais?" (cerca de 12 euros),
perguntava, sem sucesso, o único "paisano" num mar de camisetas,
bonés e lenços da Frelimo, na praia urbana do Wimby.
À noite, num
restaurante mais seleto, junto do porto, repleto de ministros, gestores
públicos, jornalistas e assessores, os vinhos sul-africanos e portugueses eram
vendidos a partir de 500 meticais mas arranjar mesa era quase tão difícil como
um oponente interno de Armando Guebuza ser eleito para o comité central.
O X Congresso da
Frelimo, partido no poder em Moçambique desde a independência, em 1975, é o
congresso de Armando Guebuza, da sua re-consagração partidária, apesar de
dentro de meses abandonar a chefia de Estado. Ou, talvez, por isso mesmo.
Hoje, no dia do arranque
do congresso, o semanário Domingo não poupava nas palavras para descrever o
candidato, sem adversário, à sua sucessão na Frelimo: "Homem de negócios
brilhante, líder político pragmático, para gáudio das bases do partido que
nunca se sentiram esquecidas", lia-se no editorial do jornal detido pelo
Banco de Moçambique.
E Guebuza voltou,
hoje, a sorrir às bases quando assegurou que os militantes não eleitos para o
congresso são tão bons ou melhores do que os delegados ali presentes e, depois,
teve um momento inolvidável de propaganda do tipo comunista asiático, quando
garantiu que "até há machambas (hortas) que levam o nome do X
Congresso".
Se o estilo poderá
recordar a Coreia do Norte, a realidade é, porém, outra. O Blackberry é o
telemóvel preferido dos delegados e a entrada no recinto dos continuadores
(como a Frelimo chama aos pioneiros) foi filmada por dezenas de gadgets,
tablets e outros acessórios que custam mais de 10 ordenados mínimos nacionais.
Frente de
libertação, partido marxista-leninista, organização empresarial, por quase tudo
já passou a Frelimo, num processo de contradições visível nos convidados
estrangeiros que torram sob o sol de Pemba.
Na cidade está
presente o núcleo duro do comunismo internacional, com os partidos no poder na
China, Coreia do Norte, Cuba e Vietname, assim como o Partido Comunista do
Brasil, mas que, como disse à Lusa o seu dirigente Ronaldo Carmona, está no
governo, não no poder.
No entanto, foi
para Mari Alkatiri, da Fretilin e que viveu em Moçambique durante a invasão
indonésia de Timor-Leste, a ovação da manhã, e isto depois de dois
conservadores, o representante do PLD japonês e do PSD português, terem sido
nomeados como "camaradas" pelo presidente da Frelimo.
Um epíteto a que
Nuno Morais Sarmento (o representante do PS é Jorge Fão) está habituado,
porque, disse à Lusa, este é o terceiro congresso da Frelimo a que assiste, a
que se soma, quatro do MPLA.
*O título nos
Compactos de Notícias são de autoria PG
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