Diário de Notícias
- Lusa
O presidente da
Cáritas diz que há muitos desempregados que preferem pedir às instituições em
vez de recorrer ao Rendimento Social de Inserção devido ao estigma em torno da
medida, que abrange mais de 280 mil pessoas.
"Há muita
gente que não quer aceder à medida porque se criou um estigma de tal forma que
há pessoas que têm vergonha de dizer que são beneficiários do RSI",
afirmou Eugénio Fonseca, em entrevista à agência Lusa.
Contou o caso de
uma professora que durante 18 anos lecionou, mas nunca conseguiu ser efetiva.
Acabou por ficar desempregada e, quando o subsídio terminou, viu-se numa
situação de pobreza.
"Tive de ir
falar com ela para um café porque não queria ir à instituição. Recomendei-lhe
que se inscrevesse na Segurança Social para ser beneficiária do RSI, mas ela
disse logo que não ia por causa do rótulo que se gerou à volta daquela
medida", contou.
"A pobreza
envergonhada existe pelo estigma já antiquíssimo que se criou" em Portugal
sobre os pobres.
Antes da crise, a
taxa de pobreza em Portugal situava-se nos 17.9%, "mais de 20% deste total
eram trabalhadores por conta de outrem, cujo rendimento não era suficiente para
suportar os encargos necessários para a sua sobrevivência".
"Mesmo assim
continuávamos a dizer que era gente que não queria trabalhar, que queria viver
à custa dos outros e do erário público", mas a situação de crise veio
mostrar que "não é bem assim".
Essa estigmatização
também atingiu o Rendimento Social de Inserção: "Como se percebeu que
havia uma camada da população que não olhava bem para esta medida [devido a
casos de fraude], terminadas classes políticas quiseram fazer do RSI uma arma
política e no fim acabaram por, em nome do rigor que a medida devia ter,
prejudicar aqueles que não falseavam o Estado".
A consequência foi
a redução do leque de pessoas que podem aceder à medida com a introdução, em
julho, das novas regras de atribuição das prestações.
Muitas pessoas que
habitualmente recorriam à Cáritas deixaram de o fazer porque a "pequena
ajuda [do RSI] chegava para resolver as situações de agressividade que viviam
em tempos de carência".
Mas o RSI não foi
criado para resolver problemas de pobreza: "O que soluciona o problema da
pobreza é a educação", através da capacitação das pessoas para desempenhar
tarefas com vista à sua autonomia, defendeu.
"O RSI
potenciava isso, mas não era pelo valor da prestação que as pessoas podiam
viver folgadamente", disse, lembrando que a prestação por beneficiário é,
em média, de 80 euros mensais.
Eugénio Fonseca
disse que as pessoas que caem numa situação de pobreza, numa primeira fase,
escondem-se nessa condição e apenas aparecem quando "já não conseguem
suportar mais o sofrimento da carência".
Depois é muito
difícil as instituições conseguirem responder a todas as solicitações.
"Foi o drama que tivemos em 2012 de não poder ajudar toda a gente e
naquilo que as pessoas pediam".
As instituições de
solidariedade social são o grande apoio dos carenciados, mas "não cobrem
todas as problemáticas sociais do país".
E, salientou, a
Segurança Social está "praticamente descapitalizada" na área da ação
social relativa às prestações pecuniárias ocasionais.
"Há centros
distritais em que os técnicos mandam diretamente as pessoas para as paróquias,
porque não têm financiamento".
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