Deutsche Welle
Somente este ano,
quatro jornalistas foram mortos, segundo a Repórteres Sem Fronteiras.
Impunidade e censura estão entre os principais problemas enfrentados pela
imprensa.
Apesar de viverem
numa democracia há mais 28 anos, os jornalistas brasileiros ainda encontram
dificuldades para exercer livremente a profissão. Somente em 2013, quatro
profissionais da imprensa foram assassinados no Brasil.
Segundo ONGs
especializadas no assunto, outros problemas enfrentados pelos jornalistas
brasileiros são a proibição de vincular notícias sobre determinadas pessoas, a
alta concentração da propriedade dos meios de comunicação e a relação próxima
entre donos de veículos de comunicação e políticos.
Em 2013, o Brasil
caiu nove posições no ranking de liberdade de imprensa da organização
Repórteres Sem Fronteiras (RSF), ficando em 108º lugar numa lista que conta com
179 países.
O Brasil também
ficou em décimo lugar no Índice de Impunidade de 2013, organizado pelo Comitê
para Proteção de Jornalistas (CPJ) e divulgado nesta quinta-feira (02/05),
véspera do Dia Mundial da Liberdade de Imprensa. O índice aponta os países onde
jornalistas são assassinados com regularidade e onde esses casos permanecem sem
solução. Quanto mais elevada a colocação, pior a situação no país.
O índice é baseado
em crimes cometidos entre os anos de 2003 e 2012 e que permanecem na
impunidade. Nesse período, há nove casos de assassinatos de jornalistas ainda
não resolvidos no Brasil. Segundo o CPJ, desde 2010 o país não registrou
nenhuma nova condenação. Repórteres do interior do país estão em situação
especialmente vulnerável.
Em 2012, com quatro
jornalistas assassinados por causa do seu trabalho e dois obrigados a deixar o
país após receber ameaças por investigarem casos envolvendo policiais, o Brasil
ficou na quinta posição na lista dos países mais perigosos para se exercer a
profissão de jornalista, segundo a RSF.
Exílio para
proteção
Depois de 22 anos
de profissão, o jornalista Mauri König, da Gazeta do Povo de
Curitiba, foi um dos dois profissionais da área obrigados a deixar o país no
final do ano passado depois de receber ameaças. König é um jornalista
investigativo que recebeu o Prêmio Internacional de Liberdade de Imprensa do
CPJ, em 2012.
As ameaças contra o
jornalista, que também é diretor da Associação Brasileira de Jornalismo
Investigativo (Abraji), ocorreram em dezembro, após a publicação de uma série
de reportagens intitulada Polícia Fora da Lei, na qual König denuncia
abusos cometido por policiais, como o uso privado de viaturas por chefes da
corporação para ir a bordéis.
Após as ameaças,
König contou com o apoio do CPJ, do Instituto Imprensa e Sociedade (do Peru) e
do jornal onde trabalha para conseguir deixar o país. O jornalista ficou dois
meses escondido no Peru e, em fevereiro deste ano, voltou para o Brasil e
retomou o trabalho. Ele contou à DW Brasil que as investigações não descobriram
os autores das ameaças.
O jornalista foi
obrigado a alterar a sua rotina para evitar que algo de ruim aconteça.
"Aparentemente está tudo tranquilo, mas não se pode relaxar. Estou sempre
atento a qualquer coisa estranha", afirma König.
O jornalista
atribuiu duas razões principais ao aumento das ameaças feitas contra
jornalistas: a crescente quantidade de reportagens investigativas e a
impunidade. "Mais gente vai ter os seus negócios obscuros revelados e mais
gente, portanto, estaria disposta a ameaçar, a agredir ou até matar jornalista
para não ter essa situação exposta", ressalta König.
Com relação à
impunidade, König diz que, de modo geral, os crimes não costumam ser resolvidos
no país, e isso gera a sensação de que os autores não serão descobertos.
"A polícia brasileira costuma se empenhar mais em crimes que têm grande
repercussão na imprensa, e nem sempre os crimes contra jornalistas ganham
destaque na mídia. Parece uma coisa paradoxal, mas é que, nesses casos, não
existe corporativismo entre os jornalistas. Por isso, boa parte esses crimes
acaba caindo no esquecimento."
Outros problemas
Além da impunidade,
o diretor do escritório para as Américas da Repórteres Sem Fronteiras, Benoît
Hervieu, cita outros fatores que contribuem para o enfraquecimento da liberdade
de imprensa no Brasil, como o modelo econômico do setor de comunicação.
Frequentemente donos de jornais estão envolvidos com a política ou dependem da
publicidade oficial.
"Quando o dono
de um meio também é político ou depende da publicidade oficial, o jornalista
sofre pressão política e econômica e tem a obrigação de falar o que o
proprietário desse meio determina. Essa dependência econômica faz com que a
imprensa não seja independente politicamente", ressalta Hervieu.
Ele afirma ainda
que a censura prévia é também um grande problema no Brasil e cita o exemplo do
jornal O Estado de S. Paulo, que há três anos está proibido de publicar
assuntos que incomodem a família Sarney. "Um jornal como o Estadão pode
assumir os custos de processos judiciais, mas isso pode ser a morte para um
veículo médio ou para um blogueiro. No Brasil, existe um risco para a liberdade
de informação, porque a ofensiva judicial é impressionante", relata.
Além disso, para o
especialista, há um conflito de interesses quando os donos de meios de
comunicação são, na condição de legisladores, os mesmos que estabelecem as
regras para esse setor, o que pode limitar a entrada de novos veículos no
mercado, impedindo a ampla participação da sociedade.
Mas, segundo
Hervieu, apesar de o Brasil ter ficado pela primeira vez antes do México no
número de jornalistas mortos, ainda há no país um esforço para tentar resolver
esses crimes, e isso não acontece em outros locais.
Soluções práticas
Apesar de ser
apenas um começo para melhorar a situação da imprensa, algumas medidas já estão
sendo tomadas no Brasil. Em outubro de 2012, a Secretaria de Direitos Humanos da
Presidência da República criou o Grupo de Trabalho sobre Direitos Humanos dos
Profissionais de Comunicação, composto por representantes do governo e de
entidades do setor.
O grupo irá
analisar e encaminhar denúncias de violência contra profissionais de
comunicação no exercício da função aos órgãos competentes, além de acompanhar
os desdobramentos do caso. Outra função do grupo é propor ações e políticas
públicas para garantir a proteção de jornalistas.
König participou da
primeira reunião do grupo e avalia positivamente a iniciativa. Além do grupo,
há uma proposta de lei em tramitação na Câmara dos Deputados que pretende
reservar à polícia federal a investigação de crimes cometidos contra
profissionais de imprensa.
"Com a
federalização da investigação desses crimes, grupos locais teriam uma
dificuldade muito maior de pressionar para arquivar as investigações. Acho o
grupo de trabalho e a proposta de lei bem práticos. Eles podem ajudar
muito", declara König.
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