Correio do Brasil –
de São Paulo
Concentrada na
capital paulista, com o apoio explícito do governador do Estado, Geraldo Alckmin,
a extrema direita programou para o próximo sábado, no Centro de São Paulo, a
reedição da Marcha que procurou justificar socialmente o golpe militar de 1964:
a Marcha da Família, com Deus pela Liberdade. Analistas políticos ouvidos
pela reportagem do Correio do Brasil não apostam R$ 0,10 no sucesso
da passeata mas, se veem com naturalidade o apoio que tem recebido de meios de
comunicação ligados aos setores mais retrógrados da sociedade brasileira, como
o diário conservador paulistano Folha de S. Paulo (FSP), chamaram
atenção para o envolvimento de uma TV pública na divulgação do libelo golpista,
que defende uma nova tomada do poder por parte dos militares.
Os vídeos
publicados nas redes sociais mostram contradições e muita confusão ideológica
por parte dos organizadores, o que beira o ridículo. Em seu vídeo de convocação
para o ato, uma das integrantes fala contra a desigualdade social, enquanto
outro ‘coxinha’, como são chamados os direitistas reacionários, em entrevista à
FSP, critica a distribuição de renda no país: “Imagina todo mundo tendo
condições de viver num mundo igualitário, não existe isso”.
Uma foto divulgada
no perfil que a manifestante de ultradireita mantinha em seu perfil doFacebook,
removido há pouco, a colocava ao lado do governador do Estado, GeraldoAlckmin,
no que parece ser um evento da extrema direita. Ao fundo outro rapaz que foi
entrevistado no vídeo da FSP. No caso, a presença do governador Alckmin, ainda
que não confirmada, oficialmente, indica ainda participação da extrema direita
religiosa, posto ser de domínio público sua participação na Opus Dei, a facção
da Igreja Católica mais à direita.
Além de Alckmin, já
se manifestaram abertamente favoráveis à manifestação golpista outros
representantes da direita nacional como o colunista da FSP Olavo de Carvalho, o
deputado Jair Bolsonaro (PP-RJ) e a jornalista Rachel Sheherazade que
recentemente justificou e defendeu a agressão contra um jovem negro amarrado em
um poste no Rio de Janeiro.
Para enfrentar os
golpistas, setores da esquerda convocaram, para o mesmo local e horário, a
Marcha Anti-Golpista e antifascista. A concentração será dia 22, na Praça da
Sé, no Centro de São Paulo, às 15h.
Incitação ao crime
Em sua página, na
internet, o jornalista Fernando Brito, editor do site O Tijolaço, questiona a
presença pública de manifestantes que, abertamente, incitam o crime. “Qual a
dosagem de ódio e insanidade que determina que alguém passou da linha?”,
questiona. Brito exemplifica o caso do fotógrafo Bruno Toscano:
“Bruno é uma das
sumidades que apareceram num vídeo como organizadores da Marcha da Família
com Deus 2, o Retorno. É ele de óculos escuros, despejando asneiras como ‘não
votaria em alguém menos preparado intelectualmente do que eu’, ‘imagina eu
tendo uma Ferrari, você tendo uma Ferrari, todo o mundo tendo uma Ferrari’ e
‘quem é o dono do mundo é o barão Rothschild’. Se fosse só mais um maluco
anticomunista falando bobagens, tudo bem. Mas Bruno é mais do que isso. Um
apologista da violência com obsessão pela ‘ameaça socialista’, os gays,
clamando por um golpe militar e pedindo sangue”, afirma, em seu artigo.
“Já era uma figura
carimbada na internet, foi processado e denunciado algumas vezes no Facebook.
Nascido em Belém do Pará e morando em São Paulo, era administrador de uma
página no FB chamada Revoltados Online. No ano passado, convocou seus amigos
para um ato contra o Foro de São Paulo que acabou em pancadaria. Skinheads e
neonazistas partiram para cima de militantes de esquerda. Uma senhora de 56
anos apanhou”.
“Adora ameaças e
bravatas: ‘Vamos lançar uma campanha: Cuspa na cara de um político, ministro e
abutre togado… É o que 99% deles merecem… Já que cuspiram na cara de nossos
bravos militares que impediram a comunização do Brasil na década de 60… Se eles
podem, porque não podemos???’. Também sugere justiçamentos: ‘Está mais do que
na hora dos PTraíras serem fuzilados em praça pública de preferência… Assim
como os italianos fizeram com Mussoline (sic)’. No pacote de imbecilidades
entram também, claro, as doenças de sempre, como homofobia, racismo (há uma
série inacreditável sobre nordestinos) e irresponsabilidade generalizada. O
ex-prefeito de Belém Edmilson Rodrigues, do Psol, o processou depois de ser
acusado de ‘roubar o leite das crianças’ e de ter ‘enriquecido ilicitamente’.
Claro que quem o leva a sério são os fanáticos de extrema-direita que, no final
das contas, não enchem um microônibus, apesar do barulho que fazem. Mas basta
um para uma besteira acontecer. Basta um palhaço, como Bruno. Um palhaço
perigoso, que comete diariamente o incitamento de crimes de ódio e intolerância
sob o governo que ele chama de ditadura”, alerta Fernando Brito.
TV pública
O jornalista Paulo
Nogueira, editor do site Diário do Centro do Mundo, também aborda a
questão sob o ângulo do apoio que um evento, marcadamente golpista, recebe de
uma emissora estatal de TV: “Os contribuintes de São Paulo estão pagando para
que a TV pública do Estado, a TV Cultura, divulgue a Marcha da Família. O
evento é organizado por golpistas e terroristas assumidos, embora a TV os tenha
pintado com tintas graciosas. O tal Bruno Toscano, que ganhou destaque no
jornal impresso, no UOL, e agora é estrela da TV Cultura, tem longa ficha
criminal”.
Nogueira também
aponta a presença de “Maycon Freitas, eleito pela (revista semanal de
ultradireita) Veja no ano passado como ‘a voz que emergiu das ruas’. Hoje ele
se assume, com orgulho, de direita, e também defende uma intervenção militar.
‘Provisória’, diz ele, sem saber que repete o que também diziam em 64. É
evidente que a mídia está procurando salvar a marcha de um fracasso absoluto.
Tenta-se, a todo custo, promovê-la, por motivos que não seria difícil imaginar.
A TV Folha até tentou fazer um contraponto: uma entrevista com Clovis Rossi
falando mal da Marcha, mas a tentativa é só para disfarçar”.
“Há 50 anos, a
Folha de São Paulo assumia-se francamente em favor da derrubada do presidente
eleito, João Goulart. Para isso, o jornal, assim como quase todos os grandes
meios de comunicação da época, se valiam de uma verdadeira alquimia verbal: os
golpistas eram chamados de democratas e o golpe foi chamado de movimento de
retorno à democracia. Foi o maior engodo da história do Brasil. E foi preparado
meticulosamente, ao longo de muitos anos, contando com gordo financiamento dos
Estados Unidos. Agora sabemos que a cúpula militar foi subornada. Há relatos de
generais recebendo ‘malas de dólares’ pouco antes do golpe”, segue Nogueira.
É curioso que a
Folha, que jamais se desculpou pelo apoio ao golpe, agora dê tanto espaço a
Bruno Toscano, um dos organizadores da Marcha da Família, a qual defende, entre
outras coisas, justamente uma nova “intervenção militar”, conclui o jornalista
Miguel do Rosário, editor do site O Cafezinho.
Na foto: Bolsonaro
apoia a ditadura militar no Brasil (clicar para ampliar).
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