Isabel
Moreira – Expresso, opinião
Não
existe política digna desse nome que não esteja ao serviço da cidade. A polis
tem de ser sempre o chão que faz andar quem quer servir o bem-comum. Não há
nada de artístico em ver a política como uma forma de alcançar e de manter o
poder. Se Maquiavel definiu assim a política, não consta que tenha atribuído à
definição um juízo moral positivo. Olhou e definiu.
Talvez
hoje muitos olhem para o que se passa na nossa vida política e sintam a pulsão
maquiavélica prevalecer sobre o que os tempos de instabilidade interna e
externa, a todos os níveis, exigem: a pulsão política posta no bem-estar e na
prosperidade.
A
direita crente no desenvolvimento social e institucionalista foi substituída
pela deliberada intenção de empobrecer o país, causar clivagens entre esferas
da comunidade, dormir bem numa pátria onde um milhão de homens e mulheres são
pobres, atacar a instituição que guarda lei das leis, negociar com os credores
do lado de lá da mesa, atacar sempre os mesmos, destruir o Estado social,
apagar os valores da confiança e da solidariedade.
Esta
direita que se abandonou, abandonando o país, dorme bem sabendo que se um
milhão de pessoas não tem acesso a bens básicos, se o valor
"trabalho" desapareceu, então, como bem disse António Costa, este
país não respeita a base da República, que dá pelo nome de dignidade da pessoa
humana.
Esta
direita dorme bem porque da antiga não resta nada. Pior: resta a direita que
aprendi ser a dos interesses e não a dos valores; a direita das agendas
pessoais; a direita que permite assistir ao espetáculo de ver entrar no Governo
académicos respeitados como Poiares Maduro, os quais, numa metamorfose imoral,
negam tudo o que foram, patrocinando a festa da intriga institucional.
Se
a direita dorme bem, o povo dorme mal. E resta uma palavra: chega.
Chega
de ver celebrado um país resgatado condenado a ser uma periferia pobre, sem
jovens, sem trabalho, com idosos desprezados, com pobreza pobre de mais para
ser escondida, sem emprego, sem direitos, sem um plano estratégico vitorioso a
dez anos, a tal consistência de que fala António Costa, a recusa de esconder na
Europa a nossa voz, fazendo-a ouvir, como usa acontecer com outras vozes.
Chega.
Hoje
já ninguém pode perguntar "qual é a alternativa?".
A
alternativa é clara. Nas europeias, os portugueses expulsaram do seu horizonte
a direita e não confiaram suficientemente no PS. A alternativa é o PS perceber
isso, como o fez, com coragem, António Costa. A alternativa é perceber que
aceitar resultados fracos é aceitar que somos alternativas fracas. A
alternativa é ambicionar muito mais do que a mudança de titulares nas cadeiras
do poder. A alternativa tem sido veiculada pela voz de António Costa, mas é
acompanhada e tida por evidente por uma massa incalculável de militantes, simpatizantes
e outros. Essa alternativa é urgente. Também por isso, todos os notáveis do PS
disseram-no numa declaração.
Chega.
Não há nada de artístico em ver a política como uma forma de alcançar e de manter
o poder.
O
PS não pode ser a outra face desta direita.
Sem comentários:
Enviar um comentário