quinta-feira, 14 de agosto de 2014

DOS SONHOS DA REPÚBLICA AOS PESADELOS DO IMPÉRIO (3)




Rui Peralta, Luanda (ver artigos anteriores)

IX - A sul das suas fronteiras os USA têm toda uma região onde agem como muito bem entendem (já não com a mesma impunidade de outrora. Cuba foi a primeira barreira, erguida em 1959, e o movimento  bolivariano na Venezuela, Equador e Bolívia, ou os diversos processos de modernização em curso no Brasil, Uruguai e Argentina, não esquecendo Nicarágua e as frágeis conquistas salvadorenhas, ou as áreas livres de Chiapas, no México, ou as áreas da guerrilha colombiana), ao ponto de na América Latina reflectirem-se com excepcional evidência os objectivos norte-americanos. Descrita por Henry Stimson, Secretário da Guerra no final da II Guerra Mundial, como " nossa pequena região", desde muito cedo que o Sul do Novo Mundo representou um "maná" de recursos naturais para os USA.

Em 1823, o Presidente James Monroe enviou ao Congresso um documento doutrinário de política externa, que ficaria conhecido como Doutrina Monroe, que assentava na recusa e rejeição da intervenção europeia nos assuntos do continente americano. O empenho frenético que as elites norte-americanas demonstravam na defesa dos interesses internos, foi utilizado, também na "pequena região", de forma a evitar a concorrência europeia e a permitir a expansão do mercado norte-americana. Ao Sul do Novo Mundo foi permitida, pelos senhores do Norte, a formação da Organização dos Estados Americanos (OEA), controlada pelos USA e que agrupa a América Central, Caraíbas e América do Sul. Os limites impostos à OEA pelos Um Departamento de Estado para a América Latina, na administração Roosevelt, durante a "Politica de Boa Vizinhança", em que avisava os "parceiros" latino-americanos sobre a indisponibilidade dos USA em aceitar "ideologias alienígenas", o que obrigaria os USA a "tomarem, unilateralmente, medidas defensivas". Desnecessário será referir que este é um direito exclusivo dos USA e que na OEA nenhum Estado tem o direito de defender-se dos USA ou de considerar a ideologia oficial norte-americana, os seus mitos e a(s) sua(s) cultura(s)  como "alienígenas".

Um dos conselheiros para os assuntos da América Latina da administração Carter referiu que as nações latino-americanas podem agir de modo independente "excepto quando essa acção afecte negativamente os interesses norte-americanos”. A região da América Central e das Caraíbas merece uma atenção muito especial e "dedicada" por parte dos USA. Área rica em recursos naturais e com forte potencial de desenvolvimento, a América Central e as Caraíbas foram transformados em campos de terror. Sindicalistas, activistas pelos Direitos Humanos, líderes comunitários, padres e freiras (nem a Igreja Católica escapa ás atrocidades cometidas pelos grupos paramilitares de extrema-direita, apoiados e financiados por Washington e camuflados pelas oligarquias locais. A "opção pelos pobres" custou á Igreja Católica na América Central um arcebispo, vários teólogos e intelectuais e centenas de padres e freiras, assassinados pelos esquadrões fascistas, apoiados pela CIA). São "bênçãos" dos USA herdados pela "pequena região".

Esta política hegemónica que as administrações norte-americanas exercem na região não sofreu alterações substanciais através dos tempos. Basta recordar Porto Rico, para constatar esse facto, ou observar as oligarquias escleróticas da região. Um exemplo desta "estática"  é a relação USA / Haiti, um relacionamento que comporta o somatório de comportamentos dos USA em política externa: ingerência discreta, ingerência aberta, cavalos-de-troia, testa-de-ferro, apoio financeiro a facções, etc..Em 1915 os USA invadiram o Haiti e procederam ao desmantelamento das instituições haitianas, apropriaram-se de terras, assassinaram milhares de camponeses e deixaram o país entregue a um bando de mercenários. O Haiti foi reduzido ao papel de área de plantação dos USA (servindo de balão de ensaio para a USAID e para diversas ONGs de cariz religioso, principalmente de raiz protestante). Alguns anos depois o Haiti tornou-se (sempre em constante empobrecimento) numa plataforma de exportação para a indústria de montagem norte-americana. Em 1993, quase 80 anos depois da primeira invasão, os USA tornavam a invadir o país (estava-se em pleno auge da Doutrina Clinton), desta vez para repor a legalidade democrática, reconduzindo ao poder o presidente eleito (deposto por um golpe militar) mas só depois de este ter aceitado as condições impostas por Washington.

As consequências das políticas dos USA na América Central e do Sul manifestam-se nos regimes terroristas das oligarquias e no contínuo e calculado atraso da região. Este é, aliás, o legado histórico das relações Norte / Sul no continente americano. Um recente caso passado recentemente com Cuba  é bem demonstrativo da forma como os USA lidam com os países latino-americanos que recusam ser subservientes aos interesses imperiais do Norte e não aceitam subsistir inseridos numa vasta e agrilhoada área periférica.

A Associated Press revelou um programa encoberto,  da administração Obama, para enviar jovens latino-americanos  a Cuba com o objectivo de criar uma campanha de desestabilização. Isto não constitui qualquer facto inédito em Cuba, que desde 1959 vive sob a ameaça constante de ingerência e intervenção por parte dos USA. Esta história  ocorreu depois da detenção, em Cuba de um personagem que dava pelo nome de Alan Gross, suposto funcionário da USAID, agência que é utilizada como cobertura e camuflagem de operações de espionagem e de acções de desestabilização. Um projecto da USAID iniciado em Outubro de 2009  enviou a Cuba jovens da  Venezuela, Costa Rica e Perú. Os jovens viajantes, postos na ilha, faziam-se passar por turistas, percorrendo o país com o objectivo de identificar cidadãos cubanos que pudessem converter-se em  activistas ao serviço da agência. Os agentes organizaram um centro  de prevenção e luta contra o SIDA, encobrindo, assim, as suas actividades.

Entre os documentos que a AP obteve, um (escrito em espanhol) assegurava: “a pesar de que nunca hay total certeza, puedes tener  confianza de que las autoridades no van a tratar de hacerte daño  físicamente, sólo te van a asustar… Recuerda que el gobierno cubano  prefiere evitar los informes negativos de los medios en el extranjero,  por lo que un extranjero golpeado no es conveniente para ellos.” No total, cerca de uma dezena de latino-americanos foram utilizados neste programa contra Cuba, por um  salário de pouco mais de 5 US dólares /  hora.

A USAID estabeleceu uma parceria com a Creative Associates International e  continuaram os  programas subversivos contra Cuba, apesar dos funcionários norte-americanos terem, após a detenção de Gross (acusado de introduzir ilegalmente tecnologia norte-americana em Cuba) suspendido as deslocações a Cuba. Este novo programa foi adicionado ao “Twitter cubano”, ZunZuneo, colocado em marcha pela USAID  em 2009 e abandonado em 2012. Foram organizados programas “discretos”, (como ZunZuneo) para aumentar o fluxo de informação. Tanto este programa de "agentes viajantes"  como o  ZunZuneo são parte de uma vasta operação, orçamentada em vários milhões de US dólares com o objectivo de efectuar acções de agitação, propaganda e desestabilização em países "politicamente  incómodos" para Washington (a CIA comprometeu-se, recentemente, a deixar de utilizar estes programas).

O programa dos agentes viajantes  começou com a administração Obama, apesar de na campanha para a sua reeleição, este assegurar que chegara o momento de um “novo começo” nas relações com Cuba, depois de décadas de  desconfiança. Em finais de 2009, a Creative Associates  contratou a advogada venezuelana Zaimar Castillo, que dirigia uma organização, a Renova. Segundo uma ex-administradora desta organização, Yajaira Andrade, foram levadas a  San José, Costa Rica, para receberem formação. Foi criada uma conta bancária no Panamá e em Abril, três membros da  Renova aterraram em Havana para uma visita de um mês. Os venezuelanos visitaram as residências  estudantis no campus de uma universidade em Santa Clara e  nos fins- de-semana conheciam as famílias dos estudantes. Outro  grupo de jovens peruanos, independente do grupo venezuelano, foi enviado, também, a Santa Clara e nos relatórios de ambos os grupos  estão descritos alunos e instalações do campus, queixas dos estudantes e eventuais problemas que pudessem ser utilizados. Os  estudantes que poderiam ser recrutados foram listados, elaborado um perfil e as suas qualidades como líderes foram avaliadas.

Os relatórios a que a AP acedeu descreviam a  cultura política da universidade, enumeravam as actividades da Juventude  Comunista e os seus métodos de seleccionamento. As queixas dos  alunos eram cuidadosamente detalhadas: qualidade da comida, serviço de água e  electricidade, instalações e infraestruturas.  Após visitarem duas universidades, os consultores venezuelanos identificaram um “grupo-meta  (grupo objetivo)” que estaria oposto ao governo e que apresentava  "habilidades organizativas" ( organizaram actividades como um acampamento e um “festival universitário”). Os estudantes cubanos contactados  disseram, em entrevistas realizadas recentemente pela AP, que ficaram surpreendidos quando descobriram que os seus amigos estrangeiros actuavam  em representação do governo norte-americano.

Em Setembro de 2010, Irving  Pérez,  gerente da Creative Associates, convocou uma reunião por  Skype onde anunciou alterações de estratégia. “Nuestro programa no va a impulsar más  viajes a la isla, o al menos no como columna vertebral de la operación”, afirmou Pérez aos jovens, que desta forma tomaram conhecimento que deixariam de viajar a Cuba e tratariam  da ajudar a certos “contactos estrela” cubanos, que receberiam  visto de saída para serem capacitados noutro país. Os “beneficiários” cubanos que permanecessem na ilha receberiam pagamentos para financiar as  actividades de recrutamento. Subcontratados da Creative Associates  levariam o dinheiro para o país através de "mulas".

Os planos foram abandonados, mas este tipo de comportamento por parte dos USA é norma na região. Segundo parece, uma eventual "Primavera" cubana ficou adiada...talvez para o Inverno?

X - Nos seus relacionamentos externos os USA adoptam diversos níveis de comportamento em função de padr6es geoestratégicos, geopolíticos e geoeconómicos, ou seja, em função da "sagrada trindade" imperialismo, neocolonialismo, capitalismo (recursos, território, capital). Os labirintos gerados por esta trindade (cenários de ramificações subterrâneas, vasos comunicantes e diplomacias paralelas) são, por sua vez, mecanismos criadores de labirínticos corredores que atingem todas as estruturas e superestruturas das sociedades.

Esta forma de actuar, orgânica (a mitologia propagandística da esquerda, sempre em busca de imagens e de mensagens de impacto, compara-a, erradamente, a um polvo) é própria das grandes colónias de bactérias, ou dos vírus. As sociedades são contaminadas, as suas defesas enfraquecidas e o seu aparelho circulatório torna-se num agente de distribuição, Mesmo com os Estados aliados, Estados-clientes e Estados súbditos, este comportamento é mantido, de forma a reforçar a aliança (e dela melhor tirar vantagem), a lealdade e a dependência do cliente e aumentar o domínio exercido sobre o submisso súbdito. Assim, quando Obama assinou, na passada semana, uma verba adicional, no valor de 225 milhões de USD em fundos de emergência para Israel, com o objectivo de aumentar o arsenal de misseis de intercepção deste país, de forma a melhor capacitar o sistema defensivo (Iron Dome), está a assinar um contracto com um cliente, que é ao mesmo tempo um representante dos interesses norte-americanos no Médio Oriente. Esta verba para reforço, considerada uma emergência, foi unanimemente aprovada pelo Senado e com 395 votos a favor e 8 contra, no Congresso.

Apesar do apoio quase generalizado dos políticos e da indústria mediática dos USA, não existem evidências de que o Iron Dome esteja a funcionar. Efectivamente e ao contrário do que é noticiado (ou propagandeado), a parte do sistema defensivo que está a salvar vidas (no lado israelita) são os mecanismos de aviso atempado através dos telemóveis e a rede de abrigos. O Iron Dome é um sistema desenvolvido por Israel mas com participação norte-americana (Raytheon, empresa privada norte-americana). Aliás os USA testaram-no em 1991 no Iraque. O sistema consiste na intercepção de misseis, ou seja é algo idêntico a um sistema de artilharia antiaérea. Mas é neste ponto que reside o seu calcanhar de Aquiles.

O Iron Dome tem uma baixa taxa de resultados positivos (entre 10% a 20%).  O negócio da Raytheon é construir interceptores (são a primeira companhia neste mercado)  e é a grande beneficiária deste sistema defensivo de concepção israelita, ao participar como parceira, na gestão do projecto e como fornecedora dos misseis interceptores. Cada um destes misseis custa acima dos 100 mil US dólares (alguns meios governamentais israelitas falam em 20 mil US dólares, o que implicaria que os USA subsidiariam em 80% o custos dos misseis). Os rockets do Hamas custam entre os 500 e os 1000 US dólares . Assumindo que o sistema funcionasse e que os misseis custassem 20 mil US dólares, teríamos um sistema altamente deficitário que não compensaria os prejuízos causados pelo Hamas (uma vez que é o sistema de alarme e a rede de abrigos que salvam vidas), pois que cada rocket do Hamas destruído por um Iron Dome representaria um prejuízo de 19 mil US dólares (assumindo que um rocket ou um míssil artesanal cheguem aos mil US dólares) valor muito superior aos estragos causados. Ora, como os preços dos Iron Dome rondam os cem mil US dólares e o sistema é inoperacional, estamos, então, na presença de um negócio chorudo, ilícito e criminoso (se os israelitas tiverem razão, é porque os contribuintes norte-americanos estão a ser enganados).

Factos como este são uma constante. As grandes companhias são financiadas pelos contribuintes, que por sua vez vêm os seus rendimentos decrescer, os seus postos de trabalho desaparecerem, os seus direitos sociais e cívicos serem ignorados, as liberdades individuais espezinhadas e vêem-se excluídos do mercado, ao mesmo tempo que grandes negócios entre Estados e companhias privadas decorrem. A segurança, a guerra, o terrorismo, não são apenas grandes e lucrativos negócios em si mesmo, são também enormes plataformas de negócios protegidos, que excluem a concorrência livre, aberta e transparente, que atropelam e subvertem o sistema jurídico, acorrentam o Poder Judicial (já de si preso á sua organicidade burguesa) e compram a palavra ao Poder Legislativo (também este preso á sua interiorização burguesa, não togada, mas liberalmente dialogante e palavrosa).

Os factos políticos internacionais, os factores da dinâmica externa são cada vez mais geoeconómicos (subordinando, mas não extinguindo-as, a geoestratégia e a geopolítica. Nas dinâmicas internas sucede um fenómeno idêntico, com a economia a tornar-se realidade única, subordinando a politica e transformando-a num mero mecanismo de selecção) , devido ao facto de tornarem-se rentáveis, em função das vastas e imensas potencialidades que a sua exploração representa.

Nessa vertente surgem acontecimentos como a Ucrânia, que revela-se um conjunto apetitoso de plataformas de negócios para o grande capital e seus parceiros-clientes, o Estado. Assim, o Departamento  de Defesa dos USA, anunciou que no próximo ano (2015)  financiará treinamento, formação e equipamento militar á Guarda Nacional  de Ucrânia, força que participa na ofensiva bélica no sudeste do  país, junto ao Exército e que é acusada de albergar  mercenários  fascistas. 

A Rússia, ao tomar conhecimento advertiu que a União Europeia (UE) levantou  “sigilosamente” as restrições de armamento ao Governo de Piotr Poroshenko. Por sua vez John Kirby, porta-voz do Pentágono, afirmou: “É parte dos nossos esforços para reforçar a capacidade de defesa interna, da Ucrânia”, confirmando  os 19 milhões de US dólares em “ajuda militar” a  Kiev. Kirby explicou que o dinheiro provêm do fundo de reserva de  segurança global e que apenas falta a aprovação do Congresso.

A Guarda Nacional integra ex-milícias do grupo de extrema-direita, ultranacionalista,  Sector das Direitas, financiado por ONG's da U.E. e USA. A Guarda Nacional conta também com mercenários da Greystone Limited, uma filial de Academi (ex-Blackwater). Recentemente, legisladores norte-americanos apresentaram na Camara dos Representantes um projecto de lei para converter a Ucrânia em Estado aliado da NATO,  sem necessidade de concretizar a adesão formal, o que permitiria ao  Pentágono ampliar o financiamento em segurança e inteligência. Apoiar a ofensiva de Kiev é "fazer frente aos passos desestabilizadores da Rússia”, como pretende o  representante democrata de Michigan, Sander Levin, o que custou, até ao momento cerca de meia centena de civis mortos e  mais de 180 mil refugiados. Como se não bastasse, ganham consistência as denuncias  de práticas de “limpeza étnica” praticada  pelo  governo ucraniano. Os ataques de Kiev estão concentrados em Lugansk e Donetsk, onde se encontra uma das principais reservas de hidrocarbonetos não convencionais da Europa.

Cercar a Rússia torna-se, assim um bom negócio para o consórcio da NATO, ao mesmo tempo que o Ocidente do Capital elimina a concorrência e ganha mais um Estado súbdito.

XI - No Iraque o caos está instalado, desde que Bush pai decidiu auxiliar a camarilha-real do Koweit, invadido pelo bando de Sadam. Bush filho, por sua vez, fez do Iraque o próprio caos. Como o caos é centrífugo, toda a região foi atraída para o caos, criado pelos USA. Iraque, Afeganistão, Síria, Palestina, Líbano e as tentativas de desestabilizar o Irão, a instabilidade no Iémen e no Paquistão, a desestabilização do norte de África (com a destruição da Líbia e as Primaveras), a destruição da Somália, a divisão do Sudão, a instabilidade no Mali e na Republica Centro-Africana (ambas intervencionadas pelo patrão francês, (um velho sócio dos USA, que de vez em quando faz as diabruras) o terrorismo na Nigéria, a desestabilização de toda a África a sul do Sahara (da costa á contracosta), são consequências de factores internos cruzados com factores externos e rentabilizados como grandes plataformas de negócios, cada vez mais lucrativos porque cada vez mais caóticos.

Periferias em obras, eis o novo slogan, enquanto o centro sofrer os efeitos da deslocação incerta. Nesse cenário bem preparado, feito de histórias mal contadas e de sistemáticas deturpações da realidade, o Pentágono anunciou esta semana, o envio de uma força de intervenção para o Iraque, com o objectivo de impedir o avanço do califado (outra consequência da "trindade" imperialismo, neocolonialismo, capitalismo). Aviões norte-americanos efectuaram bombardeamentos a posições do califado no nordeste do Iraque, que ameaçam a cidade curda de Erbil. O califado capturou largas áreas do nordeste do Iraque e encontra-se perto desta cidade, defrontando as milícias curdas.

Entretanto mais de 40 mil pessoas, da minoria Yazidi permanecem cercadas nas montanhas Sinjar, junto á fronteira com a Síria. Obama fala em potencial genocídio e as forças norte-americanas iniciaram uma operação de abastecimento de água e alimentos a estas populações. Numa intervenção televisiva, a partir da Casa Branca, Obama refere "When we face a situation like we do on that mountain, with innocent people facing the prospect of violence on a horrific scale, when have a mandate to help—in this case, a request from the Iraqi government—and when we have the unique capabilities to help avert a massacre, then I believe the United States of America cannot turn a blind eye. We can act, carefully and responsibly, to prevent a potential act of genocide. That’s what we’re doing on that mountain. I’ve therefore authorized targeted airstrikes, if necessary, to help forces in Iraq as they fight to break the siege on Mount Sinjar and protect the civilians trapped there. Already American aircraft have begun conducting humanitarian airdrops of food and water to help these desperate men, women and children survive. Earlier this week, one Iraqi in the area cried to the world, "There is no one coming to help." Well, today America is coming to help. We’re also consulting with other countries and the United Nations, who have called for action to address this humanitarian crisis." 

O regresso dos USA deverá, pois, acontecer nos próximos episódios da novela iraquiana. Obama, nesta longa mensagem poderia ter poupado saliva se explicasse aos norte-americanos como é que o califado obteve as armas e o equipamento militar norte-americano, que apetrecha os seus bandos assassinos...

XII - Nação construída pela força de trabalho imigrante (o motor do seu desenvolvimento), os USA são, actualmente, exemplo de tudo o que não deve ser feito em politica de migração. As autoridades norte-americanas para a imigração e fronteiras têm um comportamento fascistoide, apenas comparável às suas corruptas congéneres da América Central, América do Sul e de África. Para além das incertezas criadas em torno de uma reforma legal que termine com o pesadelo das políticas racistas e xenófobas do Estado, a Casa Branca não mostrou até agora a vontade politica que estabelecesse uma política para a imigração. Dali apenas saem drones para patrulhar a fronteira, leis repressivas e discriminatórias, que alimentam os bandos de narcotráfico e de tráfico de pessoas.

Um porta-voz da Casa  Branca para os assuntos da imigração, Dan Pfeiffer, afirmou que o presidente Obama tomará uma decisão antes do final do Verão, sobre a problemática que enfrentam milhões de imigrantes indocumentados. Existe, no entanto, um conflito entre o Executivo e o Legislativo em torno desta problemática, agravado desde a detenção de mais de 52 mil menores de idade que tentavam passar a  fronteira, sem acompanhamento dos pais ou de adultos. Obama responsabiliza o Capitólio por não aprovar modificações no sistema, mas o que é um facto é que este e todos os assuntos de política social morrem nessa farsa do conflito institucional, em que Obama e os democratas fazem o papel de polícia bom e os republicanos de polícia mau. O anúncio de que  Obama, por fim, fará algo sobre os problemas que enfrentam milhões de imigrantes é encarado por estes com um misto de esperança e desconfiança.

Saltam á vista diversas áreas em que seria possível e necessária uma intervenção do Executivo -mesmo  sem contar com uma reforma legislativa -para humanizar as  condições dos imigrantes e um acompanhamento do fluxo migratório. Bastaria, por  exemplo, que Obama recorresse das suas competências  constitucionais para  atenuar o sofrimento dos imigrantes, alterando procedimentos do actual sistema, suficiente para aumentar o respeito pelos direitos  humanos, por parte dos funcionários das fronteiras (muitas vezes elementos de milícias da extrema-direita, que patrulham as fronteiras á caça de imigrantes nas horas vagas).Para chegar aos USA os centro-americanos  atravessam um inferno chamado México (é bom não esquecer que fogem ao inferno da miséria e da exclusão, que são os seus países de origem). As violações, roubos e  assassinatos fazem parte de um itinerário do qual só podem sair  ilesos com muita boa sorte. O inferno mexicano (e recordo que o México é um estado súbdito de Washington) é agora agravado pela decisão da oligarquia mexicana, que para agradar aos seus suseranos do Norte, decidiram expulsar os imigrantes indocumentados, em transito, atirando-os para os braços dos barões do crime, compadres da oligarquia e sócios na venda da Pátria mexicana aos "gringos".

Os imigrantes, que outrora foram a fonte primordial do sonho americano, sofrem na pele, agora, o pesadelo em que o capitalismo mergulhou a América. Os USA foram transformados em insónia. Nem Hollywood já produz sonhos. O sonho único, repetitivo e descolorido, o American Dream, oprime todos os sonhos e impede o Homem de sonhar. As  películas que hoje  Hollywood produz focam, maioritariamente o fim do mundo. Um asteróide destrói toda la vida, uma epidemia transforma-nos em Zombies  etc.. Será que ao invés do fim do mundo e da extinção da espécie, já não temos capacidade para sonhar com o fim do capitalismo? Ou será que Hollywood tem medo do seu próprio fim, uma vez que num mundo livre para sonhar, não são necessários vendedores de ilusões...nem mercenários ou vendedores de recursos e de terras alheias...

O mundo com que os Homens sonham não comportará apenas 1% de bem instalados. Até porque os sonhos que a Humanidade constrói implicam o bom viver para toda a espécie humana, são sonhos a 100%. Ou não fosse o Homem movido por sonhos…


Fontes
Tocqueville, A. De la Democratie en Amérique Gallimard, Paris, 1967
Mencken, H.L. Os Americanos Antigona, Lisboa, 2005
Fulbright, W. The arrogance of Power Random House, Washington, 1967
Tuchman, B. The Proud Tower Macmillan, New York, 1966
Chomsky, N. Democracy and Markets in the New World Order Duke University Press, Duke, 1994
Chomsky N. World Orders, Old and New Columbia University Press, 1994. 
Bairoch, P. Economics and World History Chicago University Press, 1993.
El barrio antiguo, 03/ 08/2014

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