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Há
mais de meio ano que o F8 revelou o que, agora e cada vez com maior
insistência, parece ser uma inevitabilidade. Um golpe de Estado no nosso país
para depor José Eduardo dos Santos ou, para tentar evitá-lo, uma purga. E,
segundo os serviços de informação dos EUA e de alguns países da Europa, tudo
se passa no seio do MPLA, partido que dirige o país desde 1975 e que é
comandado pela mesma pessoa desde 1979. A Oposição nada tem a ver com a situação
mas, é claro, acabará por ser um bode expiatório oportuno.
De
acordo com informações diplomáticas ocidentais, baseadas nas informações
oriundas do nosso país, é cada vez maior e mais crispado o ambiente nas altas
esferas do MPLA, do Governo e da Presidência da República, com diferentes
núcleos a contestar a liderança de José Eduardo dos Santos. O cenário
conhecido ainda não é tratado como de golpe mas como de “latente convulsão”.
No
âmago da contagem de espingardas estão os sectores da defesa e da segurança,
manifestamente desagradados com a falta de poder e com a constante e crescente
perda de credibilidade, considerada como resultado do enclausuramento do
Presidente da República e da sua atávica tendência autocrática. Embora esta
seja uma característica antiga, durante a guerra tal realidade foi diluída pelo
conflito. Com o advento da paz, a sociedade castrense também se apercebeu
que, afinal, se o poder corrompe, o poder vitalício corrompe por toda a vida.
José
Eduardo dos Santos terá concluído que, afinal, em vez de garantir a
inviolabilidade do regime, o Serviço de Inteligência e Segurança de Estado –
SINSE, está a cometer arbitrariedades atrás de arbitrariedades, de nada
valendo ter meios materiais sofisticados se os seus quadros são de um nível
muito baixo.
Na
altura em que o Folha 8 levantou esta questão, Fevereiro deste ano, altos
dignitários do MPLA, quase todos pertencendo ao escalão dos históricos,
aumentaram os seus contactos secretos para, a nível do partido, aquilatarem da
possibilidade de fazerem alguma coisa para alterar a autocracia do regime,
começando pelo próprio José Eduardo dos Santos.
Muitos
desse contestatários são velhos companheiros de Eduardo dos Santos, muitos
são da mesma geração do Presidente. Isso não os impede de, nesta altura, dizer
que o líder do partido desde 1979 só olha para o seu umbigo e para o da
família, comprando fidelidades políticas e militares a peso de ouro.
E
se as acusações, mais do que comprovadas, de que Eduardo dos Santos fez, faz e
fará tudo para que a sua família e o núcleo restrito de apoiantes continuem a
enriquecer, continuam em cima da mesa, outras há que até agora eram apenas
comentadas à boca pequena.
São
disso exemplos a crescente centralização em si de decisões políticas que, do
ponto de vista legal, lhe estão vedadas, bem como o esvaziamento das instituições
do Estado, Parlamento e Procuradoria-Geral – por exemplo, e ainda a
minimização ou ate mesmo achincalhamento da própria Constituição da
República.
Pouco
preocupado com as regras democráticas e com a institucionalização de um
verdadeiro Estado de Direito, Eduardo dos Santos quer ter todo o poder nas
suas mãos, com realce para a segurança, política externa e controlo
financeiro.
Mas
o Presidente entende que a verdadeira lei fundamental do país é a que ele
quiser, quando quiser, sempre que quiser. Nem a Assembleia Nacional, muito
menos o Governo, mandam no que quer que seja. Os deputados do MPLA, bem como os
ministros, limitam-se a assinar de cruz onde e quando José Eduardo dos Santos
mandar. Não importa que a lei diga o contrário. Não importa que a lei diga que
a questão da nacionalidade, por exemplo, não é uma prerrogativa do Presidente.
O que apenas importa é a vontade dele.
No
recente e emblemático caso do BESA, profusamente tratado pelo Folha 8,
nomeadamente quanto à garantia do Estado, sabe-se que a Assembleia Nacional deveria
ser chamada a dar, ou não, tal aprovação. É claro que daria, mas – mesmo assim
– Eduardo dos Santos entendeu que não era preciso cumprir essa formalidade.
Cansado
de ter colaboradores que, mesmo a medo, o queriam salvar através da
manifestação de ideias diferentes, José Eduardo dos Santos prefere ser
assassinado pelos bajuladores. Por isso são muitos os que o rodeiam. Mesmo
nestes o nível está pelas ruas da amargura. O núcleo de sipaios que rodeiam o
Presidente é constituído por rapaziada jovem sem experiência profissional ou
política, socialmente desconhecida. Mas, é claro, têm a qualidade “sine qua
non”. Todos dizem: “yes, President”.
Edeltrudes
Maurício Fernandes Gaspar da Costa é ministro de Estado e Chefe da Casa Civil
do Presidente. Pois. Esse é o cargo, mas quem é ele? Um “ilustre desconhecido”
que todavia, tem a vantagem de ser o mordomo, feitor se preferirem, do general
“Kopelipa”.
Em
teoria, nesta altura de grande BESA(na), o ministro das Finanças, Armando
Manuel, deveria ter um papel relevante. Mas não tem. É uma figura decorativa e
protocolar.
Manuel
António Rabelais, especialista flutuante, é agora, nada mais nada menos,
Secretário do Presidente da República para os Assuntos de Comunicação Institucional
e Imprensa. Do seu currículo consta a proximidade com os filhos do Presidente,
e as velhas negociatas com a entrega da TPA 2 e a criação do GRECIMA para
desempenhar o papel do Ministério da Comunicação Social.
Mas
se a maioria dos contestatários ainda permanecem mais ou menos calados,
alguns há que abertamente dizem o que pensam. O veterano e respeitado general
na reforma, Manuel Alexandre Duarte Rodrigues “Kito”, embaixador de Angola na
Namíbia, quando foi auscultado para se aposentar da diplomacia, não só recusou
como disse que o faria quando o Presidente José Eduardo dos Santos também se
retirasse.
Embora
de forma indirecta, registe-se a atitude do Presidente da Assembleia Nacional,
Fernando da Piedade Dias dos Santos, que no discurso de encerramento da última
sessão legislativa, quebrou o hábito de não fez nenhuma referência laudatória
a Eduardo dos Santos, e, inclusive, contrariou a vontade do Presidente ao
manifestar-se a favor da transmissão dos debates parlamentares.
Enquanto
isso, o Presidente da República tenta blindar todo o seu círculo interno,
humano e material, tapando todas as fugas que possam pôr em causa o seu poder,
que pretende vitalício. A isso junta o marketing externo e a tentativa de
aparecer nos areópagos internacionais como um estadista de gabarito mundial,
peça insubstituível no contexto da paz regional.
Essa
blindagem passa igualmente por ter, ou tentar ter, nas mãos as Forças Armadas,
atribuindo-lhes funções que escapam ao seu enquadramento institucional, como
seja o controlo, vigilância e combate a eventuais distúrbios internos.
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