segunda-feira, 15 de setembro de 2014

Angola: CONTESTAÇÃO DO MPLA A DOS SANTOS PODE RESULTAR NUM GOLPE DE ESTADO


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Folha 8, 13 setembro 2014

Há mais de meio ano que o F8 revelou o que, agora e cada vez com maior insistência, parece ser uma inevita­bilidade. Um golpe de Estado no nosso país para depor José Eduardo dos Santos ou, para ten­tar evitá-lo, uma purga. E, segundo os serviços de informação dos EUA e de alguns países da Eu­ropa, tudo se passa no seio do MPLA, partido que dirige o país desde 1975 e que é comandado pela mesma pessoa des­de 1979. A Oposição nada tem a ver com a situação mas, é claro, acabará por ser um bode expiatório oportuno.

De acordo com infor­mações diplomáticas ocidentais, baseadas nas informações oriundas do nosso país, é cada vez maior e mais crispado o ambiente nas altas esfe­ras do MPLA, do Gover­no e da Presidência da República, com diferen­tes núcleos a contestar a liderança de José Eduar­do dos Santos. O cenário conhecido ainda não é tratado como de golpe mas como de “latente convulsão”.

No âmago da contagem de espingardas estão os sectores da defesa e da segurança, manifes­tamente desagradados com a falta de poder e com a constante e cres­cente perda de credibili­dade, considerada como resultado do enclausu­ramento do Presidente da República e da sua atávica tendência au­tocrática. Embora esta seja uma característica antiga, durante a guerra tal realidade foi diluída pelo conflito. Com o ad­vento da paz, a socieda­de castrense também se apercebeu que, afinal, se o poder corrompe, o po­der vitalício corrompe por toda a vida.

José Eduardo dos Santos terá concluído que, afi­nal, em vez de garantir a inviolabilidade do re­gime, o Serviço de Inte­ligência e Segurança de Estado – SINSE, está a cometer arbitrariedades atrás de arbitrarieda­des, de nada valendo ter meios materiais sofisti­cados se os seus quadros são de um nível muito baixo.

Na altura em que o Folha 8 levantou esta questão, Fevereiro deste ano, al­tos dignitários do MPLA, quase todos pertencen­do ao escalão dos his­tóricos, aumentaram os seus contactos secretos para, a nível do partido, aquilatarem da possibili­dade de fazerem alguma coisa para alterar a auto­cracia do regime, come­çando pelo próprio José Eduardo dos Santos.

Muitos desse contesta­tários são velhos com­panheiros de Eduardo dos Santos, muitos são da mesma geração do Presidente. Isso não os impede de, nesta altura, dizer que o líder do par­tido desde 1979 só olha para o seu umbigo e para o da família, comprando fidelidades políticas e militares a peso de ouro.

E se as acusações, mais do que comprovadas, de que Eduardo dos Santos fez, faz e fará tudo para que a sua família e o nú­cleo restrito de apoian­tes continuem a enri­quecer, continuam em cima da mesa, outras há que até agora eram ape­nas comentadas à boca pequena.

São disso exemplos a crescente centraliza­ção em si de decisões políticas que, do ponto de vista legal, lhe estão vedadas, bem como o esvaziamento das insti­tuições do Estado, Par­lamento e Procuradoria­-Geral – por exemplo, e ainda a minimização ou ate mesmo achincalha­mento da própria Cons­tituição da República.

Pouco preocupado com as regras democráticas e com a institucionaliza­ção de um verdadeiro Es­tado de Direito, Eduardo dos Santos quer ter todo o poder nas suas mãos, com realce para a segu­rança, política externa e controlo financeiro.

Mas o Presidente enten­de que a verdadeira lei fundamental do país é a que ele quiser, quando quiser, sempre que qui­ser. Nem a Assembleia Nacional, muito menos o Governo, mandam no que quer que seja. Os deputados do MPLA, bem como os ministros, limitam-se a assinar de cruz onde e quando José Eduardo dos Santos man­dar. Não importa que a lei diga o contrário. Não importa que a lei diga que a questão da nacionali­dade, por exemplo, não é uma prerrogativa do Presidente. O que apenas importa é a vontade dele.

No recente e emblemá­tico caso do BESA, pro­fusamente tratado pelo Folha 8, nomeadamen­te quanto à garantia do Estado, sabe-se que a Assembleia Nacional de­veria ser chamada a dar, ou não, tal aprovação. É claro que daria, mas – mesmo assim – Eduardo dos Santos entendeu que não era preciso cumprir essa formalidade.

Cansado de ter colabo­radores que, mesmo a medo, o queriam salvar através da manifestação de ideias diferentes, José Eduardo dos Santos pre­fere ser assassinado pe­los bajuladores. Por isso são muitos os que o ro­deiam. Mesmo nestes o nível está pelas ruas da amargura. O núcleo de sipaios que rodeiam o Presidente é constituído por rapaziada jovem sem experiência profissional ou política, socialmen­te desconhecida. Mas, é claro, têm a qualidade “sine qua non”. Todos dizem: “yes, President”.

Edeltrudes Maurício Fernandes Gaspar da Costa é ministro de Esta­do e Chefe da Casa Civil do Presidente. Pois. Esse é o cargo, mas quem é ele? Um “ilustre desco­nhecido” que todavia, tem a vantagem de ser o mordomo, feitor se pre­ferirem, do general “Ko­pelipa”.

Em teoria, nesta altura de grande BESA(na), o minis­tro das Finanças, Arman­do Manuel, deveria ter um papel relevante. Mas não tem. É uma figura decora­tiva e protocolar.

Manuel António Rabe­lais, especialista flutuan­te, é agora, nada mais nada menos, Secretário do Presidente da Repú­blica para os Assuntos de Comunicação Insti­tucional e Imprensa. Do seu currículo consta a proximidade com os fi­lhos do Presidente, e as velhas negociatas com a entrega da TPA 2 e a criação do GRECIMA para desempenhar o pa­pel do Ministério da Co­municação Social.

Mas se a maioria dos contestatários ainda per­manecem mais ou me­nos calados, alguns há que abertamente dizem o que pensam. O vete­rano e respeitado gene­ral na reforma, Manuel Alexandre Duarte Rodri­gues “Kito”, embaixador de Angola na Namíbia, quando foi auscultado para se aposentar da di­plomacia, não só recu­sou como disse que o fa­ria quando o Presidente José Eduardo dos Santos também se retirasse.

Embora de forma indirec­ta, registe-se a atitude do Presidente da Assembleia Nacional, Fernando da Piedade Dias dos Santos, que no discurso de encer­ramento da última sessão legislativa, quebrou o há­bito de não fez nenhuma referência laudatória a Eduardo dos Santos, e, inclusive, contrariou a vontade do Presidente ao manifestar-se a favor da transmissão dos debates parlamentares.

Enquanto isso, o Presi­dente da República tenta blindar todo o seu cír­culo interno, humano e material, tapando todas as fugas que possam pôr em causa o seu poder, que pretende vitalício. A isso junta o marketing externo e a tentativa de aparecer nos areópagos internacionais como um estadista de gabarito mundial, peça insubs­tituível no contexto da paz regional.

Essa blindagem passa igualmente por ter, ou tentar ter, nas mãos as Forças Armadas, atri­buindo-lhes funções que escapam ao seu enqua­dramento institucional, como seja o controlo, vigilância e combate a eventuais distúrbios in­ternos.

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