domingo, 12 de outubro de 2014

Eleições em S. Tomé e Príncipe: “O que é que os políticos fizeram por este país?”




É a pergunta feita, quase em tom de comício, pelo funcionário público que tomou "conta" do microfone da TSF no mercado da capital são-tomense. Nas vésperas das eleições de onde sairá o novo governo, ele é a voz de um desalento partilhado por muitos.

«Este mercado, quando chove, é uma misericórdia». Não é o caso, não chove mas está carregado, é cinzento o discurso de João Vila Seca, 59 anos, funcionário judicial.

Vai às compras com a mulher e o filho e queixa-se do preço do peixe-voador. E interroga-se para onde terá voado o dinheiro que S.Tomé já recebeu adiantado da Nigéria do petróleo que um dia, é garantido, há de jorrar no mar que rodeia o país: «Fala-se num mundo de petróleo. O senhor está a ver a realidade? Os filhos dos dirigentes andam de Mercedes e Land Cruiser, esses carros de boa boca. E nós não conseguimos fazer uma alimentação. Fala-se em petróleo e já caiu dinheiro. Onde é que ele está?».

João está indignado com o estado do país. Não anda por ali pelo mercado nenhum candidato a primeiro-ministro, mas, se apanhasse algum, garante que não deixava de lhe fazer a pergunta «O que é que os políticos fizeram por S. Tomé? Só andaram a roubar porque nunca trabalharam». E então, o povo não rema contra? «Esse povo é comodista. O povo são-tomense não tem cultura definida, não é unido».

João Vila Seca olha para o lado e desafia um rapaz a dizer o que pensa. Mas o jovem tem outro desígnio mais premente: « Eu estou a beber», diz ele de garrafa de cerveja na mão, a mais recente de várias que já bebeu ao longo da manhã.

É também de curto, curtíssimo prazo o caderno de preocupações de Odair. Avança ligeiro e apita, «Piiiii!», nas curvas pelos corredores do mercado de S. Tomé. Leva na mão uma bacia de plástico com que avia recados aos vendedores. O dinheiro faz muita falta em casa : «A minha mãe está sem condições. Ontem passamos fome e hoje ainda não sei».

Odair diz que anda na escola. Está inscrito, mas a frequência será muito intermitente. Aos catorze anos ainda só tem a quarta classe. Mas na sumário dos sonhos cabe tudo: «Quero ser ministro ou presidente», mas também pode ser «enfermeiro ou doutor». O miúdo não tem ilusões que só assim, com um curso, poderá melhorar de vida.

Por agora, o sonho do dia de Odair é ganhar algum dinheiro no mercado. Se correr bem, os recados com a bacia azul vão render-lhe o equivalente a trinta, quarenta cêntimos. É pouco para nós, mas muito para ele. E já dará direito a uma grande "apitadela" de festejo.

Artur Carvalho – TSF


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