É
a pergunta feita, quase em tom de comício, pelo funcionário público que tomou
"conta" do microfone da TSF no mercado da capital são-tomense. Nas
vésperas das eleições de onde sairá o novo governo, ele é a voz de um desalento
partilhado por muitos.
«Este
mercado, quando chove, é uma misericórdia». Não é o caso, não chove mas está
carregado, é cinzento o discurso de João Vila Seca, 59 anos, funcionário
judicial.
Vai
às compras com a mulher e o filho e queixa-se do preço do peixe-voador. E
interroga-se para onde terá voado o dinheiro que S.Tomé já recebeu adiantado da
Nigéria do petróleo que um dia, é garantido, há de jorrar no mar que rodeia o
país: «Fala-se num mundo de petróleo. O senhor está a ver a realidade? Os
filhos dos dirigentes andam de Mercedes e Land Cruiser, esses carros de boa
boca. E nós não conseguimos fazer uma alimentação. Fala-se em petróleo e já
caiu dinheiro. Onde é que ele está?».
João
está indignado com o estado do país. Não anda por ali pelo mercado nenhum
candidato a primeiro-ministro, mas, se apanhasse algum, garante que não deixava
de lhe fazer a pergunta «O que é que os políticos fizeram por S. Tomé? Só
andaram a roubar porque nunca trabalharam». E então, o povo não rema contra?
«Esse povo é comodista. O povo são-tomense não tem cultura definida, não é
unido».
João
Vila Seca olha para o lado e desafia um rapaz a dizer o que pensa. Mas o jovem
tem outro desígnio mais premente: « Eu estou a beber», diz ele de garrafa de
cerveja na mão, a mais recente de várias que já bebeu ao longo da manhã.
É
também de curto, curtíssimo prazo o caderno de preocupações de Odair. Avança
ligeiro e apita, «Piiiii!», nas curvas pelos corredores do mercado de S. Tomé.
Leva na mão uma bacia de plástico com que avia recados aos vendedores. O
dinheiro faz muita falta em casa : «A minha mãe está sem condições. Ontem
passamos fome e hoje ainda não sei».
Odair
diz que anda na escola. Está inscrito, mas a frequência será muito
intermitente. Aos catorze anos ainda só tem a quarta classe. Mas na sumário dos
sonhos cabe tudo: «Quero ser ministro ou presidente», mas também pode ser
«enfermeiro ou doutor». O miúdo não tem ilusões que só assim, com um curso,
poderá melhorar de vida.
Por
agora, o sonho do dia de Odair é ganhar algum dinheiro no mercado. Se correr
bem, os recados com a bacia azul vão render-lhe o equivalente a trinta,
quarenta cêntimos. É pouco para nós, mas muito para ele. E já dará direito a
uma grande "apitadela" de festejo.
Artur
Carvalho – TSF
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