Verdade
(mz) - Editorial
Esperamos
que os mais de dez milhões de eleitores moçambicanos tenham ido votar, como nós
fizemos nesta quarta-feira (15), apesar da pouca transparência de que todo este
processo enferma desde … sempre.
Gostaríamos
de estar enganados mas é muito provável que as fraudes habituais (roubo de
boletins de votos, trocas de cadernos eleitorais, observadores independentes
não acreditados, enchimento de urnas, falsificação de editais), e quiçá algumas
novas, aconteçam até a divulgação dos resultados afinal um dos candidatos
continua a controlar todo o processo eleitoral a seu bel prazer e nem mesmo as
melhorias na Lei Eleitoral deverão ser suficientes para a transparência que
deveria existir naquelas que muitos dizem ser as mais importantes eleições que
Moçambique teve!
Como
esquecermos a falta de transparência na eleição do presidente da Comissão
Nacional de Eleições e dos seus pares a provinciais e distritais. Não podemos
ignorar que após a actualização do recenseamento essa Comissão de Eleições
descobriu mais 177 mil eleitores, depois de a própria haver terminado o
apuramento. Não podemos ignorar a cumplicidade da Comissão de Eleições perante
o uso abusivo da televisão, rádio e jornais estatais para a campanha de um
mesmo candidato e partido.
Embora
nos recomendem que depois de votarmos não devemos ficar nas assembleias de
voto, o facto é que muitos votos têm sido roubados nos quinze longos dias que
nos pedem para esperar pelos resultados. Em eleições recentes vi cidadãos
vigiarem os seus votos, até os editais da primeira contagem estarem afixados, e
a verdade é que eles sentiram que os seus votos contaram para a mudança que
ansiavam.
Não
temos dúvidas de que as eleições não foram justas. Afinal, um dos candidatos,
como se não bastasse ter iniciado a campanha muito antes dos seus oponentes,
também fez uso de meios que não pertencem ao seu partido, mas sim ao Estado
moçambicano, para nos convencer que quase quatro décadas não foram suficientes
para que todos tenhamos pelo menos três refeições condignas e acesso a água potável
todos os dias.
E
como se não bastassem as vantagens que são concedidas a esse candidato, os
materiais que usamos para votar, das urnas aos boletins de voto, foram
produzidos por empresas cujos proprietários são membros seniores do partido
desse candidato.
Liberdade
também faltou nestas eleições. Muitos de nós ainda foram obrigados a votar para
manter o sustento ou mesmo o emprego, no Estado o salário que para muitos
atrasa foi miraculosamente pago antecipadamente e, outros há, que votaram em
troca de uma camiseta ou um boné.
A
guerra, que diziam não existir, parece ter acabado mas as armas que continuam
na posse dos quem andou aos tiros durante quase dois anos. Não sabemos quantos
guerrilheiros estão nas matas e que quantidade de armamento possuem. Contudo,
sabemos que o exército governamental, que agora também tem aviões e barcos,
continua em prontidão combativa. Será que os derrotados nas eleições terão o
desportivismo que se espera?
Apesar
destas eleições não serem livres, justas e nem mesmo transparentes, não podemos
abdicar deste direito cívico de escolher o Presidente de Moçambique e os
deputados que se vão sentar no Parlamento.
Como
cidadãos temos que participar activamente na democracia do nosso país, não só a
cada cinco anos, mas todos os dias exigindo e responsabilizando a quem quer que
seja eleito, que melhore a educação, a saúde, os serviços de saneamento e todas
as outras promessas para que tenhamos um Moçambique bem melhor do que este onde
todos os anos cerca de 86 mil crianças recém-nascidas morrem antes de
completarem o seu primeiro ano de vida e outras 38 mil morrem antes de
atingirem os cinco anos de idade.
Um
Moçambique onde as mulheres não sejam obrigadas a casar e ter filhos antes dos
18 anos de idade. Um Moçambique onde ir para o trabalho não signifique
enfrentar o martírio de ser transportado como um animal. Um Moçambique onde as
crianças aprendam a ler, escrever e fazer contas para que possam,
eventualmente, tornar-se jovens adultos que têm famílias saudáveis e levar uma
vida digna para si e para os seus próprios filhos.
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